A cada momento, as eleições suscitam perguntas diferentes. Já foram várias: Dilma decolará? Serra será candidato? Marina vai empolgar? Quanto de sua popularidade Lula conseguirá transferir? A mais nova e interessante diz respeito a um cenário que muitos consideravam impensável há pouco tempo: será que Dilma vai ganhar no primeiro turno?
Algumas pessoas acham que apenas formular essa pergunta é tomar partido de Dilma, querer que ela vença ou torcer por ela. São os que supõem que a hipótese é tão absurda que só faria sentido na cabeça de um “dilmista”.
Na verdade, não. São cada vez mais numerosos os analistas que trabalham com essa possibilidade. Até quem sempre raciocinou unicamente com a situação inversa, de Serra vencer no primeiro turno, hoje admite que ela exista e que está se tornando a cada dia mais provável.
Já faz tempo, no entanto, que as pesquisas permitiam antevê-la. A rigor, desde o final do ano passado, quando Serra ainda estava com folgada dianteira. Bastava levar em conta o que diziam as pessoas que conseguiam estabelecer a ligação entre Dilma e Lula.
Entre os que sabiam que ela era a candidata do presidente, a liderança do ex-governador desaparecia e os dois ficavam com a mesma intenção de voto. Mas, ao considerar o perfil socioeconômico dos que não sabiam, via-se que ela tinha grande potencial de crescimento, bastando, para isso, que a informação aumentasse e alcançasse os segmentos mais propensos a votar em seu nome.
De dezembro em diante, as pesquisas foram mostrando que, a cada ponto que subia o conhecimento de que ela era a candidata de Lula, aumentavam suas intenções de voto. Ou seja, embora Serra continuasse liderando, sua vantagem era frágil, pois se sustentava em algo que a campanha eleitoral se encarregaria de alterar. Era a desinformação que lhe dava vantagem, e essa tenderia a desaparecer à medida que a eleição se avizinhasse.
Lula fez o que estava ao seu alcance para que cada vez mais pessoas identificassem Dilma como sua candidata. Levou-a a todos os palanques, convidou-a para inaugurações e solenidades, viajou com ela Brasil afora. Mas foi a imprensa quem mais contribuiu para que seu objetivo – universalizar a informação de que ele a apoiava – fosse sendo progressivamente atingido.
Em 2010, fora seus discursos para as platéias reunidas nesses eventos, Lula só se dirigiu diretamente ao conjunto dos eleitores para falar em Dilma uma vez: quando estrelou os comerciais e o programa partidário do PT em maio. Apenas nessa oportunidade usou uma mídia de massa para falar olhando nos olhos do eleitor e pedir seu voto.
Hoje, cerca de 80% dos eleitores são capazes de associar Dilma a Lula, mas menos de 25% dizem conhecê-la bem. Faltam 20% que sequer a conhecem e há uma larga fatia que somente sabe seu nome.
Engana-se quem olha seus atuais 40% de intenções de voto como teto. Ela chegou a esse patamar através de um processo de difusão da informação que alcançou o eleitor popular fundamentalmente através do chamado “boca a boca”. Nele, a bem dizer, a televisão foi apenas coadjuvante.
Quando, a partir da semana que vem, a propaganda eleitoral começar e Lula passar a aparecer diariamente no programa e nos comerciais na TV e no rádio, Dilma deverá entrar em uma nova etapa de crescimento. Até onde irá, é difícil dizer.
Como as perspectivas de crescimento de Serra são reduzidas, a esperança de quem quer dois turnos se deslocou para Marina e os pequenos candidatos. Mas a mídia que terão é tão exígua (Marina, por exemplo, disporá de um único comercial em horário nobre por semana) que é pouco provável que sejam sequer percebidos pela maioria do eleitorado.
É por essas (e outras) que quem entende de eleição cada vez mais considera possível a vitória, em primeiro turno, da candidata de Lula.
* Marcos Coimbra
quarta-feira, 18 de agosto de 2010
O campo de Dilma e de Lula
Na pesquisa Vox Populi, divulgada em 25 de julho, a vantagem de Dilma sobre Serra no meio urbano é de 4 pontos percentuais (43 X 39); no rural a vantagem é de 25 pontos (55 X 30). Na pesquisa Sensus, do período 31 de julho a 2 de agosto, divulgada pela Confederação Nacional dos Transportes, a história se repete. A vantagem de Dilma no urbano é de 7,6 pontos (39,9 X 32,3) e no rural é de 24 pontos (51,2 X 27,2).
“a história é um carro alegre, cheio de um povo contente,
que atropela indiferente todo aquele que a negue...”.
(Chico Buarque e Pablo Milanês)
Mais: nesta mesma pesquisa o Governo Lula tem 79,3% de aprovação no meio urbano e 87% no rural. O índice de desaprovação ao governo no urbano é de 15,1%, enquanto no rural é de 10%.
Ou seja, estamos muito bem no meio rural, aquele mesmo que historicamente sempre nos pareceu refratário às propostas da esquerda e que sempre foi visto, com razão, como território eleitoral dos partidos conservadores. Quem vive e trabalha no campo aprova o Governo Federal e quer continuidade. Ficou difícil continuar afirmando que não fizemos nada ou muito pouco. Aos mais céticos talvez valha a pena tentar entender porque tem tanta gente satisfeita com nossos programas. A menos que prefiram a máxima de que “o povo não sabe votar e não entende de política”. A seguir algumas pistas para tentar compreender este povo que – aposto! – é sábio:
1) Reconhecemos a diversidade do meio rural e de caminhos para o seu desenvolvimento. Ouvimos a voz e defendemos direitos a outras populações que estavam condenadas a invisibilidade: sem terra, agricultores familiares, extrativistas, pescadores, ribeirinhos, quebradeiras de coco, varzeteiros, indígenas e quilombolas;
2) Contribuímos para democratizar o acesso a terra. Em sete anos o Governo assentou 574,6 mil famílias. Isto significa 59% do total das famílias assentadas em toda a história do país. Foram 46 milhões de hectares de terra destinados para a Reforma Agrária (53% do total de terras destinadas para a Reforma agrária em toda a história do país e uma área maior que o estado de São Paulo e Paraná). E, ainda, 74 mil famílias conseguiram acessar a terra via o crédito fundiário.
3) Garantimos o direito à terra com a regularização de 134 mil posses (Ceará, Piauí, Minas Gerais etc), dos territórios de 82 comunidades quilombolas, beneficiando 4.217 famílias com a emissão de 60 títulos numa área total de 174,4 mil hectares.
4) Fortalecemos a agricultura familiar: Mais de um milhão de famílias foram incorporadas ao sistema de crédito agrícola ( PRONAF), especialmente no norte e nordeste do país. O volume de crédito passou de minguados R$ 2,4 bilhões em 2003 para R$ 16 bilhões em 2010. Com o Seguro Agrícola de clima e de preços, que já beneficiam mais de 2,5 milhões de famílias, não há mais o risco do endividamento.
5) Garantimos mais mercado e mais renda para a agricultura familiar. O Programa Mais Alimentos permitiu a aquisição, nos últimos dois anos, de 30 mil novos tratores (de 1996 a 2006, em 10 anos somente 7,2 mil estabelecimentos tinham conseguido comprar um trator). O Programa de Aquisição de Alimentos – PAA já beneficiou 764 mil famílias, com investimentos de R$ 2,7 bilhões, adquirindo a preço justo quase 2 milhões de toneladas de alimentos. O PAA Leite organizou a cadeia produtiva do leite no nordeste, aumentado e regularizando a oferta e melhorando o preço pago aos agricultores.
6) Agora podemos ter uma alimentação escolar com produtos de qualidade da própria região. Este ano começou a vigorar a Lei da Alimentação Escolar que determina que pelo menos 30% dos recursos da alimentação escolar deverão ser gastos na compra direta de alimentos da agricultura familiar. Isto representa uma reserva de mercado de mais de R$ 1 bilhão, incentivo para o desenvolvimento local e mais saúde para as crianças.
7) O Programa Nacional de Biodiesel já incorporou na cadeia produtiva 54 mil famílias, nas regiões mais empobrecidas do país, com uma receita média em 2009 de R$ 9 mil por família. Em 2010, as compras de matéria prima da agricultura familiar chegarão a R$ 1,1 bilhão. A Petrobrás Biocombustíveis, além de ofertar assistência técnica, correção de solos e sementes, estabelece contratos de compra da produção de oleaginosas por um prazo de cinco anos a preços justos.
8) Apostamos na autonomia econômica para garantir a igualdade das mulheres rurais. Mais de 550 mil mulheres foram beneficiadas com a emissão de documentos - CPF, RG, Carteira de Trabalho, Registro de Nascimento; com a titulação conjunta obrigatória da terra na reforma agrária as mulheres titulares de lote já são 56%. O Pronaf Mulher já beneficiou 37 mil projetos exclusivos e de 2003 a 2008 foram 1,9 milhões de operações de crédito tendo as mulheres como titulares.
9) Apostamos no desenvolvimento das regiões. De forma inédita as políticas agrícolas, de educação, saúde, cultura e seguridade social começam a chegar ao mesmo tempo. O Programa Territórios da Cidadania coordena e integra políticas públicas de 22 ministérios e estados em 120 territórios (1.852 municípios) com a alocação de mais de R$ 27 bilhões em 2010.
Os resultados estão aí. De 2003 a 2008 a renda da Agricultura Familiar cresceu 30% acima da inflação, enquanto a média do país foi de 11%. Neste mesmo período, 4,8 milhões de pessoas saíram das condições de pobreza no meio rural. Nos últimos anos surgiram novas 412 mil propriedades da agricultura familiar no país. Ou seja, estamos invertendo a tendência de êxodo rural. Com crédito, assistência técnica, seguro e política de preços, a agricultura familiar e os assentados da reforma agrária passaram a produzir 70% de tudo aquilo que os brasileiros consomem no dia-a-dia.
Na contramão desta transformação democrática, o candidato José Serra recentemente defendeu o fim do Ministério do Desenvolvimento Agrário e a unificação da Política Rural em único órgão. Vale dizer, o fim de políticas próprias e distintas para a agricultura familiar e para a reforma agrária, motor destas mudanças.
O que fica claro é que estas eleições apresentam opções muito diferentes e com enormes conseqüências para o meio rural. O aprofundamento do caminho atual com Dilma ou um radical retrocesso com Serra.
A julgar pelas pesquisas o meio rural brasileiro já percebeu isto e já fez sua opção. Como sempre acontece, é o povo que escreve o melhor da história. E mais uma vez o nosso povo – mulheres e homens camponeses, agricultores familiares, assentados, populações tradicionais, trabalhadores rurais – mostra-nos que sabe comemorar conquistas e continuar lutando.
Uma lição de lucidez e persistência.
* Guilherme Cassel
“a história é um carro alegre, cheio de um povo contente,
que atropela indiferente todo aquele que a negue...”.
(Chico Buarque e Pablo Milanês)
Mais: nesta mesma pesquisa o Governo Lula tem 79,3% de aprovação no meio urbano e 87% no rural. O índice de desaprovação ao governo no urbano é de 15,1%, enquanto no rural é de 10%.
Ou seja, estamos muito bem no meio rural, aquele mesmo que historicamente sempre nos pareceu refratário às propostas da esquerda e que sempre foi visto, com razão, como território eleitoral dos partidos conservadores. Quem vive e trabalha no campo aprova o Governo Federal e quer continuidade. Ficou difícil continuar afirmando que não fizemos nada ou muito pouco. Aos mais céticos talvez valha a pena tentar entender porque tem tanta gente satisfeita com nossos programas. A menos que prefiram a máxima de que “o povo não sabe votar e não entende de política”. A seguir algumas pistas para tentar compreender este povo que – aposto! – é sábio:
1) Reconhecemos a diversidade do meio rural e de caminhos para o seu desenvolvimento. Ouvimos a voz e defendemos direitos a outras populações que estavam condenadas a invisibilidade: sem terra, agricultores familiares, extrativistas, pescadores, ribeirinhos, quebradeiras de coco, varzeteiros, indígenas e quilombolas;
2) Contribuímos para democratizar o acesso a terra. Em sete anos o Governo assentou 574,6 mil famílias. Isto significa 59% do total das famílias assentadas em toda a história do país. Foram 46 milhões de hectares de terra destinados para a Reforma Agrária (53% do total de terras destinadas para a Reforma agrária em toda a história do país e uma área maior que o estado de São Paulo e Paraná). E, ainda, 74 mil famílias conseguiram acessar a terra via o crédito fundiário.
3) Garantimos o direito à terra com a regularização de 134 mil posses (Ceará, Piauí, Minas Gerais etc), dos territórios de 82 comunidades quilombolas, beneficiando 4.217 famílias com a emissão de 60 títulos numa área total de 174,4 mil hectares.
4) Fortalecemos a agricultura familiar: Mais de um milhão de famílias foram incorporadas ao sistema de crédito agrícola ( PRONAF), especialmente no norte e nordeste do país. O volume de crédito passou de minguados R$ 2,4 bilhões em 2003 para R$ 16 bilhões em 2010. Com o Seguro Agrícola de clima e de preços, que já beneficiam mais de 2,5 milhões de famílias, não há mais o risco do endividamento.
5) Garantimos mais mercado e mais renda para a agricultura familiar. O Programa Mais Alimentos permitiu a aquisição, nos últimos dois anos, de 30 mil novos tratores (de 1996 a 2006, em 10 anos somente 7,2 mil estabelecimentos tinham conseguido comprar um trator). O Programa de Aquisição de Alimentos – PAA já beneficiou 764 mil famílias, com investimentos de R$ 2,7 bilhões, adquirindo a preço justo quase 2 milhões de toneladas de alimentos. O PAA Leite organizou a cadeia produtiva do leite no nordeste, aumentado e regularizando a oferta e melhorando o preço pago aos agricultores.
6) Agora podemos ter uma alimentação escolar com produtos de qualidade da própria região. Este ano começou a vigorar a Lei da Alimentação Escolar que determina que pelo menos 30% dos recursos da alimentação escolar deverão ser gastos na compra direta de alimentos da agricultura familiar. Isto representa uma reserva de mercado de mais de R$ 1 bilhão, incentivo para o desenvolvimento local e mais saúde para as crianças.
7) O Programa Nacional de Biodiesel já incorporou na cadeia produtiva 54 mil famílias, nas regiões mais empobrecidas do país, com uma receita média em 2009 de R$ 9 mil por família. Em 2010, as compras de matéria prima da agricultura familiar chegarão a R$ 1,1 bilhão. A Petrobrás Biocombustíveis, além de ofertar assistência técnica, correção de solos e sementes, estabelece contratos de compra da produção de oleaginosas por um prazo de cinco anos a preços justos.
8) Apostamos na autonomia econômica para garantir a igualdade das mulheres rurais. Mais de 550 mil mulheres foram beneficiadas com a emissão de documentos - CPF, RG, Carteira de Trabalho, Registro de Nascimento; com a titulação conjunta obrigatória da terra na reforma agrária as mulheres titulares de lote já são 56%. O Pronaf Mulher já beneficiou 37 mil projetos exclusivos e de 2003 a 2008 foram 1,9 milhões de operações de crédito tendo as mulheres como titulares.
9) Apostamos no desenvolvimento das regiões. De forma inédita as políticas agrícolas, de educação, saúde, cultura e seguridade social começam a chegar ao mesmo tempo. O Programa Territórios da Cidadania coordena e integra políticas públicas de 22 ministérios e estados em 120 territórios (1.852 municípios) com a alocação de mais de R$ 27 bilhões em 2010.
Os resultados estão aí. De 2003 a 2008 a renda da Agricultura Familiar cresceu 30% acima da inflação, enquanto a média do país foi de 11%. Neste mesmo período, 4,8 milhões de pessoas saíram das condições de pobreza no meio rural. Nos últimos anos surgiram novas 412 mil propriedades da agricultura familiar no país. Ou seja, estamos invertendo a tendência de êxodo rural. Com crédito, assistência técnica, seguro e política de preços, a agricultura familiar e os assentados da reforma agrária passaram a produzir 70% de tudo aquilo que os brasileiros consomem no dia-a-dia.
Na contramão desta transformação democrática, o candidato José Serra recentemente defendeu o fim do Ministério do Desenvolvimento Agrário e a unificação da Política Rural em único órgão. Vale dizer, o fim de políticas próprias e distintas para a agricultura familiar e para a reforma agrária, motor destas mudanças.
O que fica claro é que estas eleições apresentam opções muito diferentes e com enormes conseqüências para o meio rural. O aprofundamento do caminho atual com Dilma ou um radical retrocesso com Serra.
A julgar pelas pesquisas o meio rural brasileiro já percebeu isto e já fez sua opção. Como sempre acontece, é o povo que escreve o melhor da história. E mais uma vez o nosso povo – mulheres e homens camponeses, agricultores familiares, assentados, populações tradicionais, trabalhadores rurais – mostra-nos que sabe comemorar conquistas e continuar lutando.
Uma lição de lucidez e persistência.
* Guilherme Cassel
O efeito "silenciador" da grande mídia
Desde a convocação da Confecom, em abril de 2009, os grandes grupos de mídia e seus aliados decidiram intensificar a estratégia de oposição ao governo e aos partidos que lhe dão sustentação. Nessa estratégia – assumida pela presidente da ANJ e superintendente do grupo Folha – um dos pontos consiste em alardear publicamente que o país vive sob ameaça constante de volta à censura e de que a liberdade de expressão [e, sem mais, a liberdade da imprensa] corre sério risco.
Além da satanização da própria Confecom (1ª Conferência Nacional de Comunicação), são exemplos recentes dessa estratégia, a violenta resistência ao PNDH3 e o carnaval feito em torno da primeira proposta de programa de governo entregue ao TSE pela candidata Dilma Roussef (vide, por exemplo, a capa, o editorial e a matéria interna da revista Veja, edição n. 2173).
A liberdade – o eterno tema de combate do liberalismo clássico – está na centro da “batalha das idéias” que se trava no dia-a-dia, através da grande mídia, e se transformou em poderoso instrumento de campanha eleitoral. Às vezes, parece até mesmo que voltamos, no Brasil, aos superados tempos da “guerra fria”.
O efeito silenciador
Neste contexto, é oportuna e apropriada a releitura de A Ironia da Liberdade de Expressão (Editora Renovar, 2005), pequeno e magistral livro escrito pelo professor de Yale, Owen Fiss, um dos mais importantes e reconhecidos especialistas em “Primeira Emenda” dos Estados Unidos.
Fiss introduz o conceito de “efeito silenciador” quando discute que, ao contrário do que apregoam os liberais clássicos, o Estado não é um inimigo natural da liberdade. O Estado pode ser uma fonte de liberdade, por exemplo, quando promove “a robustez do debate público em circunstâncias nas quais poderes fora do Estado estão inibindo o discurso. Ele pode ter que alocar recursos públicos – distribuir megafones – para aqueles cujas vozes não seriam escutadas na praça pública de outra maneira. Ele pode até mesmo ter que silenciar as vozes de alguns para ouvir as vozes dos outros. Algumas vezes não há outra forma” (p. 30).
Fiss usa como exemplo os discursos de incitação ao ódio, a pornografia e os gastos ilimitados nas campanhas eleitorais. As vítimas do ódio têm sua auto-estima destroçada; as mulheres se transformam em objetos sexuais e os “menos prósperos” ficam em desvantagem na arena política.
Em todos esses casos, “o efeito silenciador vem do próprio discurso”, isto é, “a agência que ameaça o discurso não é Estado”. Cabe, portanto, ao Estado promover e garantir o debate aberto e integral e assegurar “que o público ouça a todos que deveria”, ou ainda, garanta a democracia exigindo “que o discurso dos poderosos não soterre ou comprometa o discurso dos menos poderosos”.
Especificamente no caso da liberdade de expressão, existem situações em que o “remédio” liberal clássico de mais discurso, ao invés da regulação do Estado, simplesmente não funciona. Aqueles que supostamente poderiam responder ao discurso dominante não têm acesso às formas de fazê-lo (pp. 47-48).
Creio que o exemplo emblemático dessa última situação é o acesso ao debate público nas sociedades onde ele (ainda) é controlado pelos grandes grupos de mídia.
Censura disfarçada
A liberdade de expressão individual tem como fim assegurar um debate público democrático onde, como diz Fiss, todas as vozes sejam ouvidas.
Ao usar como estratégia de oposição política o bordão da ameaça constante de volta à censura e de que a liberdade de expressão corre risco, os grandes grupos de mídia transformam a liberdade de expressão num fim em si mesmo. Ademais, escamoteiam a realidade de que, no Brasil, o debate público não só [ainda] é pautado pela grande mídia como uma imensa maioria da população a ele não tem acesso e é dele historicamente excluída.
Nossa imprensa tardia se desenvolveu nos marcos do de um “liberalismo antidemocrático” no qual as normas e procedimentos relativos a outorgas e renovações de concessões de radiodifusão são responsáveis pela concentração da propriedade nas mãos de tradicionais oligarquias políticas regionais e locais (nunca tivemos qualquer restrição efetiva à propriedade cruzada), e impedem a efetiva pluralidade e diversidade nos meios de comunicação.
A interdição do debate verdadeiramente público de questões relativas à democratização das comunicações pelos grupos dominantes de mídia, na prática, funciona como uma censura disfarçada.
Este é o “efeito silenciador” que o discurso da grande mídia provoca exatamente em relação à liberdade de expressão que ela simula defender.
Venício A. de Lima
Além da satanização da própria Confecom (1ª Conferência Nacional de Comunicação), são exemplos recentes dessa estratégia, a violenta resistência ao PNDH3 e o carnaval feito em torno da primeira proposta de programa de governo entregue ao TSE pela candidata Dilma Roussef (vide, por exemplo, a capa, o editorial e a matéria interna da revista Veja, edição n. 2173).
A liberdade – o eterno tema de combate do liberalismo clássico – está na centro da “batalha das idéias” que se trava no dia-a-dia, através da grande mídia, e se transformou em poderoso instrumento de campanha eleitoral. Às vezes, parece até mesmo que voltamos, no Brasil, aos superados tempos da “guerra fria”.
O efeito silenciador
Neste contexto, é oportuna e apropriada a releitura de A Ironia da Liberdade de Expressão (Editora Renovar, 2005), pequeno e magistral livro escrito pelo professor de Yale, Owen Fiss, um dos mais importantes e reconhecidos especialistas em “Primeira Emenda” dos Estados Unidos.
Fiss introduz o conceito de “efeito silenciador” quando discute que, ao contrário do que apregoam os liberais clássicos, o Estado não é um inimigo natural da liberdade. O Estado pode ser uma fonte de liberdade, por exemplo, quando promove “a robustez do debate público em circunstâncias nas quais poderes fora do Estado estão inibindo o discurso. Ele pode ter que alocar recursos públicos – distribuir megafones – para aqueles cujas vozes não seriam escutadas na praça pública de outra maneira. Ele pode até mesmo ter que silenciar as vozes de alguns para ouvir as vozes dos outros. Algumas vezes não há outra forma” (p. 30).
Fiss usa como exemplo os discursos de incitação ao ódio, a pornografia e os gastos ilimitados nas campanhas eleitorais. As vítimas do ódio têm sua auto-estima destroçada; as mulheres se transformam em objetos sexuais e os “menos prósperos” ficam em desvantagem na arena política.
Em todos esses casos, “o efeito silenciador vem do próprio discurso”, isto é, “a agência que ameaça o discurso não é Estado”. Cabe, portanto, ao Estado promover e garantir o debate aberto e integral e assegurar “que o público ouça a todos que deveria”, ou ainda, garanta a democracia exigindo “que o discurso dos poderosos não soterre ou comprometa o discurso dos menos poderosos”.
Especificamente no caso da liberdade de expressão, existem situações em que o “remédio” liberal clássico de mais discurso, ao invés da regulação do Estado, simplesmente não funciona. Aqueles que supostamente poderiam responder ao discurso dominante não têm acesso às formas de fazê-lo (pp. 47-48).
Creio que o exemplo emblemático dessa última situação é o acesso ao debate público nas sociedades onde ele (ainda) é controlado pelos grandes grupos de mídia.
Censura disfarçada
A liberdade de expressão individual tem como fim assegurar um debate público democrático onde, como diz Fiss, todas as vozes sejam ouvidas.
Ao usar como estratégia de oposição política o bordão da ameaça constante de volta à censura e de que a liberdade de expressão corre risco, os grandes grupos de mídia transformam a liberdade de expressão num fim em si mesmo. Ademais, escamoteiam a realidade de que, no Brasil, o debate público não só [ainda] é pautado pela grande mídia como uma imensa maioria da população a ele não tem acesso e é dele historicamente excluída.
Nossa imprensa tardia se desenvolveu nos marcos do de um “liberalismo antidemocrático” no qual as normas e procedimentos relativos a outorgas e renovações de concessões de radiodifusão são responsáveis pela concentração da propriedade nas mãos de tradicionais oligarquias políticas regionais e locais (nunca tivemos qualquer restrição efetiva à propriedade cruzada), e impedem a efetiva pluralidade e diversidade nos meios de comunicação.
A interdição do debate verdadeiramente público de questões relativas à democratização das comunicações pelos grupos dominantes de mídia, na prática, funciona como uma censura disfarçada.
Este é o “efeito silenciador” que o discurso da grande mídia provoca exatamente em relação à liberdade de expressão que ela simula defender.
Venício A. de Lima
Os rumos inéditos da América Latina
Pela primeira vez em cinco séculos, esta região está “crescendo sin desigualar”, disse a secretária geral da Cepal na Cúpula de San Juan na semana que passou, além de elogiar, no conjunto, a Argentina, por sua política ativa de emprego. Sabe-se que isso não será jamais manchete de jornal ou telejornal, porque essas surgem de outro tipo de informação, e não necessariamente de informações recentes.
É uma lógica interna dos meios que faz com que a controvérsia seja uma machete possível, enquanto que a boa notícia, não.
Contudo, tratando-se de uma afirmação decorrente da comparação de dados, parece interessante resgatá-la, porque indica um rumo, e a consciência desse rumo provavelmente seja vital para aprofundá-lo. Esse dado supõe também uma lógica: os respectivos eleitorados elegem esse rumo e, em consequência, a mesquinhez especulativa dos grandes meios, voltandos em cheio para a política, insistirá em manter as conquistas opacas. Mas nada impede resgatar esse dado bruto aqui: afinal, o que a funcionária da Cepal disse se baseava em dados reais, não em seus gostos pessoais. São nada menos que suas altezas, os números, que indicam que, neste ano de desgraça européia, consequência direta da crise não resolvida no umbigo do mundo, o crescimento da América Latina se sustenta com uma característica inédita: pela primeira vez na história moderna da região, junto com o aumento do crescimento, as taxas de desemprego e de pobreza baixaram, e com elas, a desigualdade.
É óbvio que se trata apenas do princípio de uma mudança, os primeiros resultados de um modelo. Desse modelo regional não estamos todos no mesmo patamar, paradoxalmente, já que a informação sobre a região é ainda mais enviesada que a nacional. As coberturas sobre o conflito entre Colômbia e Venezuela são um exemplo de como contar a série começando pelo décimo capítulo. Enquanto isso, as respectivas oposições não trabalham nem aspiram a sínteses superadoras, mas apenas travam embate na rememoração do horrível, e inexplicavelmente voltam a propô-lo. Aqui e acolá dirigentes políticos e empresários, que já não se distinguem entre si, falam com encantamento dos anos 90, numa performance louca que propõe um esquecimento suicida e coletivo, para voltar à “ordem” de que têm saudade: o direito a expropriar o mundo do trabalho dos seus direitos, para entregar o poder ao mundo do capital. Os anos 90 foram, sinteticamente, isso.
Os anos 90 foram uma foto como a que tiraram esta semana de vários personagens da política e do mundo empresarial com Héctor Magnetto (1). Na falta de uma explicitação do modelo que a oposição propõe, presume-se seu alinhamento com as demandas de seus principais representados: os que têm a faca e o queijo na mão. Com os demais se pode abusar, como com os 82% de usuários da telefonia móvel, mesmo depois de ter votado contra a reestatização dos fundos de pensão. Nisso se encontram com a esquerda, que lhes leva às ruas para apoiar suas demandas.
Voltando aos dados reais da Cepal, e ao caminho democrático eleito virtuosamente pela região, que ainda não reconhece o governo de Honduras precisamente por sua gênese golpista, esse dado é em si mesmo um sinal de rumo, só isso. Não implica que não haja desigualdade, não implica que as coisas não possar ser melhor e mais rápidas ou feitas de maneira mais ágil ou justa. Assinala um rumo, apenas. Uma direção.
Nos países envolvidos por essa nova tendência, a do crescimento que não “desiguala”, há governos tão diferentes como há idiossincrasias e tradições. Mas o que transcende essas enormes diferenças em matéria de ritmo e consistências políticas é algo que podemos ver: o crescimento sem desigualar, sustentado em dois eixos: políticas ativas de emprego e políticas sociais.
Ambas essas coisas são os grandes demônios do neoliberalismo. O social deve ser varrido do mapa, como o faz o macrismo de Buenos Aires. Te dou um guarda-sol amarelo e ponho bancos de designers nas praças do norte [zona rica de Buenos Aires], mas fico com os recursos dos hospitais e não executo o orçamento da educação. E o emprego: se pudessem, cortariam sistematicamente as cabeças, de novo, a cada conquista e dariam baixa nos subsídios [trabalhistas]. O modelo que têm mente não tem qualquer resposta para o mundo do trabalho, já que é em si mesmo a resposta do mundo do capital para o Estado de Bem-Estar. Não é preciso se chegar ao extremo do “socialismo estatizante”, frase pronunciada por Biolcati (2), mas também por todo o poder econômico e midiático em 1977, quando celebrou o primeiro aniversário da ditadura. Qualquer Estado que arbitre entre fortes e débeis será para eles um “estatismo socializante”: dá-lhes nojo tanta negociação entre setores. Para que tanto, se são eles os donos.
Encontrar regionalmente uma direção política e econômica permite endereçar-nos a um continente gestado como pátio dos fundos. Claro que não é a revolução, mas o que é a revolução? É necessariamente algo súbito, ou é um caminho cheio de enganos e enganadores? É algo a que as vanguardas conduzem ou é um imenso coletivo político que se adere ao que o faz girar para a frente, e expulsa o que pretende atrasar? São perguntas que não têm respostas, porque pertencem a debates silenciosos.
NOTAS:
(1) Executivo do maior grupo midiático da Argentina, o Grupo Clarín. N.deT.
(2) Hugo Biolcati, atual presidente da Sociedade Rural Argentina, entidade representativa do latifúndio vinculado à agropecuária extensiva, fundada ainda no século XIX. N.deT.
* Sandra Russo
É uma lógica interna dos meios que faz com que a controvérsia seja uma machete possível, enquanto que a boa notícia, não.
Contudo, tratando-se de uma afirmação decorrente da comparação de dados, parece interessante resgatá-la, porque indica um rumo, e a consciência desse rumo provavelmente seja vital para aprofundá-lo. Esse dado supõe também uma lógica: os respectivos eleitorados elegem esse rumo e, em consequência, a mesquinhez especulativa dos grandes meios, voltandos em cheio para a política, insistirá em manter as conquistas opacas. Mas nada impede resgatar esse dado bruto aqui: afinal, o que a funcionária da Cepal disse se baseava em dados reais, não em seus gostos pessoais. São nada menos que suas altezas, os números, que indicam que, neste ano de desgraça européia, consequência direta da crise não resolvida no umbigo do mundo, o crescimento da América Latina se sustenta com uma característica inédita: pela primeira vez na história moderna da região, junto com o aumento do crescimento, as taxas de desemprego e de pobreza baixaram, e com elas, a desigualdade.
É óbvio que se trata apenas do princípio de uma mudança, os primeiros resultados de um modelo. Desse modelo regional não estamos todos no mesmo patamar, paradoxalmente, já que a informação sobre a região é ainda mais enviesada que a nacional. As coberturas sobre o conflito entre Colômbia e Venezuela são um exemplo de como contar a série começando pelo décimo capítulo. Enquanto isso, as respectivas oposições não trabalham nem aspiram a sínteses superadoras, mas apenas travam embate na rememoração do horrível, e inexplicavelmente voltam a propô-lo. Aqui e acolá dirigentes políticos e empresários, que já não se distinguem entre si, falam com encantamento dos anos 90, numa performance louca que propõe um esquecimento suicida e coletivo, para voltar à “ordem” de que têm saudade: o direito a expropriar o mundo do trabalho dos seus direitos, para entregar o poder ao mundo do capital. Os anos 90 foram, sinteticamente, isso.
Os anos 90 foram uma foto como a que tiraram esta semana de vários personagens da política e do mundo empresarial com Héctor Magnetto (1). Na falta de uma explicitação do modelo que a oposição propõe, presume-se seu alinhamento com as demandas de seus principais representados: os que têm a faca e o queijo na mão. Com os demais se pode abusar, como com os 82% de usuários da telefonia móvel, mesmo depois de ter votado contra a reestatização dos fundos de pensão. Nisso se encontram com a esquerda, que lhes leva às ruas para apoiar suas demandas.
Voltando aos dados reais da Cepal, e ao caminho democrático eleito virtuosamente pela região, que ainda não reconhece o governo de Honduras precisamente por sua gênese golpista, esse dado é em si mesmo um sinal de rumo, só isso. Não implica que não haja desigualdade, não implica que as coisas não possar ser melhor e mais rápidas ou feitas de maneira mais ágil ou justa. Assinala um rumo, apenas. Uma direção.
Nos países envolvidos por essa nova tendência, a do crescimento que não “desiguala”, há governos tão diferentes como há idiossincrasias e tradições. Mas o que transcende essas enormes diferenças em matéria de ritmo e consistências políticas é algo que podemos ver: o crescimento sem desigualar, sustentado em dois eixos: políticas ativas de emprego e políticas sociais.
Ambas essas coisas são os grandes demônios do neoliberalismo. O social deve ser varrido do mapa, como o faz o macrismo de Buenos Aires. Te dou um guarda-sol amarelo e ponho bancos de designers nas praças do norte [zona rica de Buenos Aires], mas fico com os recursos dos hospitais e não executo o orçamento da educação. E o emprego: se pudessem, cortariam sistematicamente as cabeças, de novo, a cada conquista e dariam baixa nos subsídios [trabalhistas]. O modelo que têm mente não tem qualquer resposta para o mundo do trabalho, já que é em si mesmo a resposta do mundo do capital para o Estado de Bem-Estar. Não é preciso se chegar ao extremo do “socialismo estatizante”, frase pronunciada por Biolcati (2), mas também por todo o poder econômico e midiático em 1977, quando celebrou o primeiro aniversário da ditadura. Qualquer Estado que arbitre entre fortes e débeis será para eles um “estatismo socializante”: dá-lhes nojo tanta negociação entre setores. Para que tanto, se são eles os donos.
Encontrar regionalmente uma direção política e econômica permite endereçar-nos a um continente gestado como pátio dos fundos. Claro que não é a revolução, mas o que é a revolução? É necessariamente algo súbito, ou é um caminho cheio de enganos e enganadores? É algo a que as vanguardas conduzem ou é um imenso coletivo político que se adere ao que o faz girar para a frente, e expulsa o que pretende atrasar? São perguntas que não têm respostas, porque pertencem a debates silenciosos.
NOTAS:
(1) Executivo do maior grupo midiático da Argentina, o Grupo Clarín. N.deT.
(2) Hugo Biolcati, atual presidente da Sociedade Rural Argentina, entidade representativa do latifúndio vinculado à agropecuária extensiva, fundada ainda no século XIX. N.deT.
* Sandra Russo
Violência contra as mulheres e machismo em tempo de eleições
A violência contra as mulheres é um assunto que, infelizmente, volta e meia, está colocado em discussão, seja pelos casos midiáticos, pelos ataques à Lei Maria da Penha, ou pela constante desqualificação, direta e indireta, à que as mulheres são sujeitas em nossa sociedade.
No último período fomos bombardeados com várias noticias sobre este assunto. Veiculado nacional e incessantemente por todas as mídias, tivemos o brutal assassinato de Elisa Samudio, ex-amante e mãe de um dos filhos do goleiro Bruno, do Flamengo. Foram várias as tentativas de amenizar a gravidade do assassinato, procurando responsabilizar a vítima por seu próprio assassinato.
No Estado de São Paulo, o caso de destaque pela mídia foi o da advogada Mercia Nakashima, morta e atirada no interior de um carro à represa, supostamente devido a seu ex- namorado não aceitar o fim do relacionamento.
Mas nem sempre a mídia divulga os casos de violência sexista, ela é seletiva com estas notícias. Faz na medida em que consegue extrair o máximo de audiência e que não interfira em seus interesses, e não porque de fato se preocupa com o combate à violência contra as mulheres. Se assim fosse, teriam dado visibilidade semelhante ao caso ocorrido em Florianópolis, do estupro de uma adolescente de 13 anos por outros três adolescentes, um deles, filho do diretor da Rede Brasil Sul de Comunicação, afiliada da Rede Globo em Santa Catarina e Rio Grande do Sul.
Nessa avalanche de ataques às mulheres, tivemos também a charge publicada no Blog de Josias de Souza, através da página da internet de um dos maiores jornais brasileiros, a Folha de SP, que se referia à candidata à presidencia da república, Dilma Rousseff com a frase “Candidata de programa” (com a caricatura de Dilma em uma esquina a noite rodando uma bolsa).
Todos estes casos, embora pareçam distintos, tem em sua motivação a violência sexista, que é aquela que ocorre todas as vezes que há a tentativa de reduzir as mulheres a objetos, de não lhes permitir sua autonomia, desvalorizá-las, subordiná-las à vontade dos homens.
Chamamos de feminicídio o assassinato de mulheres por motivo de gênero em meio a formas de dominação, exercício de poder e controle sobre as mesmas. Resulta de ações caracterizadas pela violação contínua e sistemática dos direitos das mulheres e dos direitos humanos. No Brasil, a taxa de feminicídio é bem superior à média de outros países. Segundo o Mapa da Violência no Brasil no período de 1997 a 2007 dez mulheres foram assassinadas por dia, na maioria por seus companheiros atuais ou antigos maridos ou namorados.
Assim como a violência sexista, o feminicídio tem em sua raiz o machismo, estruturante de nossa sociedade e que, portanto, está presente também nas instituições e nos órgãos públicos de nosso país.
O balanço de registros de candidaturas de 2008 divulgado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) mostra que a participação das mulheres é bem inferior à dos homens nos cargos eletivos. Dos 513 deputados federais, 46 são mulheres e 467 são homens, ou seja, 91% são homens; dos 81 senadores, temos somente 10 mulheres (12%) e 71 homens (88%).
No Legislativo e no Judiciário o machismo muitas vezes também se revela no “incomodo” de autoridades do poder público ao direito das mulheres a uma vida sem violência. A Lei Maria da Penha, por exemplo, vem sendo alvo constante de ameaça. De acordo com estudo do CFêmea, desde que foi aprovada, em 2006, vinte projetos de lei foram apresentados para alterá-la e seguem tramitando no Congresso Nacional. Além disto, muitos crimes ocorrem porque os agentes públicos que atendem as mulheres subestimam aquilo que as mulheres falam, desqualificam a vítima.
Enquanto o machismo for visto como “algo que não existe mais”, que “acontece de vez em quando”, ou algo somente no abstrato, sem termos a compreensão das suas manifestações e conseqüências no dia a dia das mulheres, continuaremos todas nós expostas a ele.
Para que todas as mulheres possam ter direito a uma vida sem violência, são indispensáveis políticas que visem combater as desigualdades de gênero e outras formas de discriminação. Neste momento eleitoral, em que a CUT tem a convicção de que a única candidatura capaz de assumir a Plataforma da Classe Trabalhadora da CUT é a da companheira Dilma Rousseff, precisamos reafirmar que um programa de governo que tenha como prioridade o combate as desigualdades e as injustiças sociais, precisa ter também a convicção de que mulheres e homens devem ter igualdade de oportunidades e de tratamento.
Uma vida sem violência para as mulheres deve significar a possibilidade de termos direito a viver livre da agressão doméstica, com autonomia sobre nossas vidas e nossos corpos e com liberdade para seguirmos em frente com nossos sonhos, sejam eles de ter ou não filhos, de ter um trabalho decente ou até mesmo, de ser a presidente do país.
* Rosane Silva
No último período fomos bombardeados com várias noticias sobre este assunto. Veiculado nacional e incessantemente por todas as mídias, tivemos o brutal assassinato de Elisa Samudio, ex-amante e mãe de um dos filhos do goleiro Bruno, do Flamengo. Foram várias as tentativas de amenizar a gravidade do assassinato, procurando responsabilizar a vítima por seu próprio assassinato.
No Estado de São Paulo, o caso de destaque pela mídia foi o da advogada Mercia Nakashima, morta e atirada no interior de um carro à represa, supostamente devido a seu ex- namorado não aceitar o fim do relacionamento.
Mas nem sempre a mídia divulga os casos de violência sexista, ela é seletiva com estas notícias. Faz na medida em que consegue extrair o máximo de audiência e que não interfira em seus interesses, e não porque de fato se preocupa com o combate à violência contra as mulheres. Se assim fosse, teriam dado visibilidade semelhante ao caso ocorrido em Florianópolis, do estupro de uma adolescente de 13 anos por outros três adolescentes, um deles, filho do diretor da Rede Brasil Sul de Comunicação, afiliada da Rede Globo em Santa Catarina e Rio Grande do Sul.
Nessa avalanche de ataques às mulheres, tivemos também a charge publicada no Blog de Josias de Souza, através da página da internet de um dos maiores jornais brasileiros, a Folha de SP, que se referia à candidata à presidencia da república, Dilma Rousseff com a frase “Candidata de programa” (com a caricatura de Dilma em uma esquina a noite rodando uma bolsa).
Todos estes casos, embora pareçam distintos, tem em sua motivação a violência sexista, que é aquela que ocorre todas as vezes que há a tentativa de reduzir as mulheres a objetos, de não lhes permitir sua autonomia, desvalorizá-las, subordiná-las à vontade dos homens.
Chamamos de feminicídio o assassinato de mulheres por motivo de gênero em meio a formas de dominação, exercício de poder e controle sobre as mesmas. Resulta de ações caracterizadas pela violação contínua e sistemática dos direitos das mulheres e dos direitos humanos. No Brasil, a taxa de feminicídio é bem superior à média de outros países. Segundo o Mapa da Violência no Brasil no período de 1997 a 2007 dez mulheres foram assassinadas por dia, na maioria por seus companheiros atuais ou antigos maridos ou namorados.
Assim como a violência sexista, o feminicídio tem em sua raiz o machismo, estruturante de nossa sociedade e que, portanto, está presente também nas instituições e nos órgãos públicos de nosso país.
O balanço de registros de candidaturas de 2008 divulgado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) mostra que a participação das mulheres é bem inferior à dos homens nos cargos eletivos. Dos 513 deputados federais, 46 são mulheres e 467 são homens, ou seja, 91% são homens; dos 81 senadores, temos somente 10 mulheres (12%) e 71 homens (88%).
No Legislativo e no Judiciário o machismo muitas vezes também se revela no “incomodo” de autoridades do poder público ao direito das mulheres a uma vida sem violência. A Lei Maria da Penha, por exemplo, vem sendo alvo constante de ameaça. De acordo com estudo do CFêmea, desde que foi aprovada, em 2006, vinte projetos de lei foram apresentados para alterá-la e seguem tramitando no Congresso Nacional. Além disto, muitos crimes ocorrem porque os agentes públicos que atendem as mulheres subestimam aquilo que as mulheres falam, desqualificam a vítima.
Enquanto o machismo for visto como “algo que não existe mais”, que “acontece de vez em quando”, ou algo somente no abstrato, sem termos a compreensão das suas manifestações e conseqüências no dia a dia das mulheres, continuaremos todas nós expostas a ele.
Para que todas as mulheres possam ter direito a uma vida sem violência, são indispensáveis políticas que visem combater as desigualdades de gênero e outras formas de discriminação. Neste momento eleitoral, em que a CUT tem a convicção de que a única candidatura capaz de assumir a Plataforma da Classe Trabalhadora da CUT é a da companheira Dilma Rousseff, precisamos reafirmar que um programa de governo que tenha como prioridade o combate as desigualdades e as injustiças sociais, precisa ter também a convicção de que mulheres e homens devem ter igualdade de oportunidades e de tratamento.
Uma vida sem violência para as mulheres deve significar a possibilidade de termos direito a viver livre da agressão doméstica, com autonomia sobre nossas vidas e nossos corpos e com liberdade para seguirmos em frente com nossos sonhos, sejam eles de ter ou não filhos, de ter um trabalho decente ou até mesmo, de ser a presidente do país.
* Rosane Silva
Dez falsos motivos para não votar na Dilma
O cineasta Jorge Furtado, da Casa de Cinema de Porto Alegre, expôs em seu blog quais os dez motivos falsos que se espalham por aí para evitar o voto em Dilma Rousseff. Ele desconstroi um a um e socializa qual o seu motivo para votar em Dilma.
"Tenho alguns amigos que não pretendem votar na Dilma, um ou outro até diz que vai votar no Serra. Espero que sigam sendo meus amigos. Política, como ensina André Comte-Sponville, supõe conflitos: A política nos reúne nos opondo: ela nos opõe sobre a melhor maneira de nos reunir.
Leio diariamente o noticiário político e ainda não encontrei bons argumentos para votar no Serra, uma candidatura que cada vez mais assume seu caráter conservador. Serra representa o grupo político que governou o Brasil antes do Lula, com desempenho, sob qualquer critério, muito inferior ao do governo petista, a comparação chega a ser enfadonha, vai lá para o pé da página, quem quiser que leia. (1)
Ouvi alguns argumentos razoáveis para votar em Marina, como incluir a sustentabilidade na agenda do desenvolvimento. Marina foi ministra do Lula por sete anos e parece ser uma boa pessoa, uma batalhadora das causas ambientalistas. Tem, no entanto (na minha opinião) o inconveniente de fazer parte de uma igreja bastante rígida, o que me faz temer sobre a capacidade que teria um eventual governo comandado por ela de avançar em questões fundamentais como os direitos dos homossexuais, a descriminalização do aborto ou as pesquisas envolvendo as células tronco.
Ouço e leio alguns argumentos para não votar em Dilma, argumentos que me parecem inconsistentes, distorcidos, precários ou simplesmente falsos. Passo a analisar os dez mais freqüentes.
1. Alternância no poder é bom.
Falso. O sentido da democracia não é a alternância no poder e sim a escolha, pela maioria, da melhor proposta de governo, levando-se em conta o conhecimento que o eleitor tem dos candidatos e seus grupo políticos, o que dizem pretender fazer e, principalmente, o que fizeram quando exerceram o poder. Ninguém pode defender seriamente a idéia de que seria boa a alternância entre a recessão e o desenvolvimento, entre o desemprego e a geração de empregos, entre o arrocho salarial e o aumento do poder aquisitivo da população, entre a distribuição e a concentração da riqueza. Se a alternância no poder fosse um valor em si não precisaria haver eleição e muito menos deveria haver a possibilidade de reeleição.
2. Não há mais diferença entre direita e esquerda.
Falso. Esquerda e direita são posições relativas, não absolutas. A esquerda é, desde a sua origem, a posição política que tem por objetivo a diminuição das desigualdades sociais, a distribuição da riqueza, a inserção social dos desfavorecidos. As conquistas necessárias para se atingir estes objetivos mudam com o tempo. Hoje, ser de esquerda significa defender o fortalecimento do estado como garantidor do bem-estar social, regulador do mercado, promotor do desenvolvimento e da distribuição de riqueza, tudo isso numa sociedade democrática com plena liberdade de expressão e ampla defesa das minorias. O complexo (e confuso) sistema político brasileiro exige que os vários partidos se reúnam em coligações que lhes garantam maioria parlamentar, sem a qual o país se torna ingovernável. A candidatura de Dilma tem o apoio de políticos que jamais poderiam ser chamados de esquerdistas, como Sarney, Collor ou Renan Calheiros, lideranças regionais que se abrigam principalmente no PMDB, partido de espectro ideológico muito amplo. José Serra tem o apoio majoritário da direita e da extrema-direita reunida no DEM (2), da direita do PMDB, além do PTB, PPS e outros pequenos partidos de direita: Roberto Jefferson, Jorge Borhausen, ACM Netto, Orestes Quércia, Heráclito Fortes, Roberto Freire, Demóstenes Torres, Álvaro Dias, Arthur Virgílio, Agripino Maia, Joaquim Roriz, Marconi Pirilo, Ronaldo Caiado, Katia Abreu, André Pucinelli, são todos de direita e todos serristas, isso para não falar no folclórico Índio da Costa, vice de Serra. Comparado com Agripino Maia ou Jorge Borhausen, José Sarney é Che Guevara.
3. Dilma não é simpática.
Argumento precário e totalmente subjetivo. Precário porque a simpatia não é, ou não deveria ser, um atributo fundamental para o bom governante. Subjetivo, porque o quesito simpatia depende totalmente do gosto do freguês. Na minha opinião, por exemplo, é difícil encontrar alguém na vida pública que seja mais antipático que José Serra, embora ele talvez tenha sido um bom governante de seu estado. Sua arrogância com quem lhe faz críticas, seu destempero e prepotência com jornalistas, especialmente com as mulheres, chega a ser revoltante.
4. Dilma não tem experiência.
Argumento inconsistente. Dilma foi secretária de estado, foi ministra de Minas e Energia e da Casa Civil, fez parte do conselho da Petrobras, gerenciou com eficiência os gigantescos investimentos do PAC, dos programas de habitação popular e eletrificação rural. Dilma tem muito mais experiência administrativa, por exemplo, do que tinha o Lula, que só tinha sido parlamentar, nunca tinha administrado um orçamento, e está fazendo um bom governo.
5. Dilma foi terrorista.
Argumento em parte falso, em parte distorcido. Falso, porque não há qualquer prova de que Dilma tenha tomado parte de ações terroristas. Distorcido, porque é fato que Dilma fez parte de grupos de resistência à ditadura militar, do que deve se orgulhar, e que este grupo praticou ações armadas, o que pode (ou não) ser condenável. José Serra também fez parte de um grupo de resistência à ditadura, a AP (Ação Popular), que também praticou ações armadas, das quais Serra não tomou parte. Muitos jovens que participaram de grupos de resistência à ditadura hoje participam da vida democrática como candidatos. Alguns, como Fernando Gabeira, participaram ativamente de seqüestros, assaltos a banco e ações armadas. A luta daqueles jovens, mesmo que por meios discutíveis, ajudou a restabelecer a democracia no país e deveria ser motivo de orgulho, não de vergonha.
6. As coisas boas do governo petista começaram no governo tucano.
Falso. Todo governo herda políticas e programas do governo anterior, políticas que pode manter, transformar, ampliar, reduzir ou encerrar. O governo FHC herdou do governo Itamar o real, o programa dos genéricos, o FAT, o programa de combate a AIDS. Teve o mérito de manter e aperfeiçoá-los, desenvolvê-los, ampliá-los. O governo Lula herdou do governo FHC, por exemplo, vários programas de assistência social. Teve o mérito de unificá-los e ampliá-los, criando o Bolsa Família. De qualquer maneira, os resultados do governo Lula são tão superiores aos do governo FHC que o debate quem começou o quê torna-se irrelevante.
7. Serra vai moralizar a política.
Argumento inconsistente. Nos oito anos de governo tucano-pefelista - no qual José Serra ocupou papel de destaque, sendo escolhido para suceder FHC - foram inúmeros os casos de corrupção, um deles no próprio Ministério da Saúde, comandado por Serra, o superfaturamento de ambulâncias investigado pela Operação Sanguessuga. Se considerarmos o volume de dinheiro público desviado para destinos nebulosos e paraísos fiscais nas privatizações e o auxílio luxuoso aos banqueiros falidos, o governo tucano talvez tenha sido o mais corrupto da história do país. Ao contrário do que aconteceu no governo Lula, a corrupção no governo FHC não foi investigada por nenhuma CPI, todas sepultadas pela maioria parlamentar da coligação PSDB-PFL. O procurador da república ficou conhecido com engavetador da república, tal a quantidade de investigações criminais que morreram em suas mãos. O esquema de financiamento eleitoral batizado de mensalão foi criado pelo presidente nacional do PSDB, senador Eduardo Azeredo, hoje réu em processo criminal. O governador José Roberto Arruda, do DEM, era o principal candidato ao posto de vice-presidente na chapa de Serra, até ser preso por corrupção no mensalão do DEM. Roberto Jefferson, réu confesso do mensalão petista, hoje apóia José Serra. Todos estes fatos, incontestáveis, não indicam que um eventual governo Serra poderia ser mais eficiente no combate à corrupção do que seria um governo Dilma, ao contrário.
8. O PT apóia as FARC.
Argumento falso. É fato que, no passado, as FARC ensaiaram uma tentativa de institucionalização e buscaram aproximação com o PT, então na oposição, e também com o governo brasileiro, através de contatos com o líder do governo tucano, Arthur Virgílio. Estes contatos foram rompidos com a radicalização da guerrilha na Colômbia e nunca foram retomados, a não ser nos delírios da imprensa de extrema-direita. A relação entre o governo brasileiro e os governos estabelecidos de vários países deve estar acima de divergências ideológicas, num princípio básico da diplomacia, o da auto-determinação dos povos. Não há notícias, por exemplo, de capitalistas brasileiros que defendam o rompimento das relações com a China, um dos nossos maiores parceiros comerciais, por se tratar de uma ditadura. Ou alguém acha que a China é um país democrático?
9. O PT censura a imprensa.
Argumento falso. Em seus oito anos de governo o presidente Lula enfrentou a oposição feroz e constante dos principais veículos da antiga imprensa. Esta oposição foi explicitada pela presidente da Associação Nacional de Jornais (ANJ) que declarou que seus filiados assumiram a posição oposicionista (sic) deste país. Não há registro de um único caso de censura à imprensa por parte do governo Lula. O que há, frequentemente, é a queixa dos órgãos de imprensa sobre tentativas da sociedade e do governo, a exemplo do que acontece em todos os países democráticos do mundo, de regulamentar a atividade da mídia.
10. Os jornais, a televisão e as revistas falam muito mal da Dilma e muito bem do Serra.
Isso é verdade. E mais um bom motivo para votar nela e não nele.
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(1) Alguns dados comparativos dos governos FHC e Lula.
Geração de empregos:
FHC/Serra = 780 mil x Lula/Dilma = 12 milhões
Salário mínimo:
FHC/Serra = 64 dólares x Lula/Dilma = 290 dólares
Mobilidade social (brasileiros que deixaram a linha da pobreza):
FHC/Serra = 2 milhões x Lula/Dilma = 27 milhões
Risco Brasil:
FHC/Serra = 2.700 pontos x Lula/Dilma = 200 pontos
Dólar:
FHC/Serra = R$ 3,00 x Lula/Dilma = R$ 1,78
Reservas cambiais:
FHC/Serra = menos 185 bilhões de dólares x Lula/Dilma = mais 239 bilhões de dólares
Relação crédito/PIB:
FHC/Serra = 14% x Lula/Dilma = 34%
Inflação:
FHC/Serra =12,5% (2002) x Lula/Dilma = 4,7% (2009)
Produção de automóveis:
FHC/Serra = queda de 20% x Lula/Dilma = aumento de 30%
Taxa de juros:
FHC/Serra = 27% x Lula/Dilma = 10,75%
(2) Elio Gaspari, na Folha de S.Paulo de 25.07.10:
José Serra começou sua campanha dizendo: "Não aceito o raciocínio do nós contra eles", e em apenas dois meses viu-se lançado pelo seu colega de chapa numa discussão em torno das ligações do PT com as Farc e o narcotráfico. Caso típico de rabo que abanou o cachorro. O destempero de Indio da Costa tem método. Se Tupã ajudar Serra a vencer a eleição, o DEM volta ao poder. Se prejudicar, ajudando Dilma Rousseff, o PSDB sairá da campanha com a identidade estilhaçada. Já o DEM, que entrou na disputa com o cocar do seu mensalão, sairá brandindo o tacape do conservadorismo feroz que renasceu em diversos países, sobretudo nos Estados Unidos.
"Tenho alguns amigos que não pretendem votar na Dilma, um ou outro até diz que vai votar no Serra. Espero que sigam sendo meus amigos. Política, como ensina André Comte-Sponville, supõe conflitos: A política nos reúne nos opondo: ela nos opõe sobre a melhor maneira de nos reunir.
Leio diariamente o noticiário político e ainda não encontrei bons argumentos para votar no Serra, uma candidatura que cada vez mais assume seu caráter conservador. Serra representa o grupo político que governou o Brasil antes do Lula, com desempenho, sob qualquer critério, muito inferior ao do governo petista, a comparação chega a ser enfadonha, vai lá para o pé da página, quem quiser que leia. (1)
Ouvi alguns argumentos razoáveis para votar em Marina, como incluir a sustentabilidade na agenda do desenvolvimento. Marina foi ministra do Lula por sete anos e parece ser uma boa pessoa, uma batalhadora das causas ambientalistas. Tem, no entanto (na minha opinião) o inconveniente de fazer parte de uma igreja bastante rígida, o que me faz temer sobre a capacidade que teria um eventual governo comandado por ela de avançar em questões fundamentais como os direitos dos homossexuais, a descriminalização do aborto ou as pesquisas envolvendo as células tronco.
Ouço e leio alguns argumentos para não votar em Dilma, argumentos que me parecem inconsistentes, distorcidos, precários ou simplesmente falsos. Passo a analisar os dez mais freqüentes.
1. Alternância no poder é bom.
Falso. O sentido da democracia não é a alternância no poder e sim a escolha, pela maioria, da melhor proposta de governo, levando-se em conta o conhecimento que o eleitor tem dos candidatos e seus grupo políticos, o que dizem pretender fazer e, principalmente, o que fizeram quando exerceram o poder. Ninguém pode defender seriamente a idéia de que seria boa a alternância entre a recessão e o desenvolvimento, entre o desemprego e a geração de empregos, entre o arrocho salarial e o aumento do poder aquisitivo da população, entre a distribuição e a concentração da riqueza. Se a alternância no poder fosse um valor em si não precisaria haver eleição e muito menos deveria haver a possibilidade de reeleição.
2. Não há mais diferença entre direita e esquerda.
Falso. Esquerda e direita são posições relativas, não absolutas. A esquerda é, desde a sua origem, a posição política que tem por objetivo a diminuição das desigualdades sociais, a distribuição da riqueza, a inserção social dos desfavorecidos. As conquistas necessárias para se atingir estes objetivos mudam com o tempo. Hoje, ser de esquerda significa defender o fortalecimento do estado como garantidor do bem-estar social, regulador do mercado, promotor do desenvolvimento e da distribuição de riqueza, tudo isso numa sociedade democrática com plena liberdade de expressão e ampla defesa das minorias. O complexo (e confuso) sistema político brasileiro exige que os vários partidos se reúnam em coligações que lhes garantam maioria parlamentar, sem a qual o país se torna ingovernável. A candidatura de Dilma tem o apoio de políticos que jamais poderiam ser chamados de esquerdistas, como Sarney, Collor ou Renan Calheiros, lideranças regionais que se abrigam principalmente no PMDB, partido de espectro ideológico muito amplo. José Serra tem o apoio majoritário da direita e da extrema-direita reunida no DEM (2), da direita do PMDB, além do PTB, PPS e outros pequenos partidos de direita: Roberto Jefferson, Jorge Borhausen, ACM Netto, Orestes Quércia, Heráclito Fortes, Roberto Freire, Demóstenes Torres, Álvaro Dias, Arthur Virgílio, Agripino Maia, Joaquim Roriz, Marconi Pirilo, Ronaldo Caiado, Katia Abreu, André Pucinelli, são todos de direita e todos serristas, isso para não falar no folclórico Índio da Costa, vice de Serra. Comparado com Agripino Maia ou Jorge Borhausen, José Sarney é Che Guevara.
3. Dilma não é simpática.
Argumento precário e totalmente subjetivo. Precário porque a simpatia não é, ou não deveria ser, um atributo fundamental para o bom governante. Subjetivo, porque o quesito simpatia depende totalmente do gosto do freguês. Na minha opinião, por exemplo, é difícil encontrar alguém na vida pública que seja mais antipático que José Serra, embora ele talvez tenha sido um bom governante de seu estado. Sua arrogância com quem lhe faz críticas, seu destempero e prepotência com jornalistas, especialmente com as mulheres, chega a ser revoltante.
4. Dilma não tem experiência.
Argumento inconsistente. Dilma foi secretária de estado, foi ministra de Minas e Energia e da Casa Civil, fez parte do conselho da Petrobras, gerenciou com eficiência os gigantescos investimentos do PAC, dos programas de habitação popular e eletrificação rural. Dilma tem muito mais experiência administrativa, por exemplo, do que tinha o Lula, que só tinha sido parlamentar, nunca tinha administrado um orçamento, e está fazendo um bom governo.
5. Dilma foi terrorista.
Argumento em parte falso, em parte distorcido. Falso, porque não há qualquer prova de que Dilma tenha tomado parte de ações terroristas. Distorcido, porque é fato que Dilma fez parte de grupos de resistência à ditadura militar, do que deve se orgulhar, e que este grupo praticou ações armadas, o que pode (ou não) ser condenável. José Serra também fez parte de um grupo de resistência à ditadura, a AP (Ação Popular), que também praticou ações armadas, das quais Serra não tomou parte. Muitos jovens que participaram de grupos de resistência à ditadura hoje participam da vida democrática como candidatos. Alguns, como Fernando Gabeira, participaram ativamente de seqüestros, assaltos a banco e ações armadas. A luta daqueles jovens, mesmo que por meios discutíveis, ajudou a restabelecer a democracia no país e deveria ser motivo de orgulho, não de vergonha.
6. As coisas boas do governo petista começaram no governo tucano.
Falso. Todo governo herda políticas e programas do governo anterior, políticas que pode manter, transformar, ampliar, reduzir ou encerrar. O governo FHC herdou do governo Itamar o real, o programa dos genéricos, o FAT, o programa de combate a AIDS. Teve o mérito de manter e aperfeiçoá-los, desenvolvê-los, ampliá-los. O governo Lula herdou do governo FHC, por exemplo, vários programas de assistência social. Teve o mérito de unificá-los e ampliá-los, criando o Bolsa Família. De qualquer maneira, os resultados do governo Lula são tão superiores aos do governo FHC que o debate quem começou o quê torna-se irrelevante.
7. Serra vai moralizar a política.
Argumento inconsistente. Nos oito anos de governo tucano-pefelista - no qual José Serra ocupou papel de destaque, sendo escolhido para suceder FHC - foram inúmeros os casos de corrupção, um deles no próprio Ministério da Saúde, comandado por Serra, o superfaturamento de ambulâncias investigado pela Operação Sanguessuga. Se considerarmos o volume de dinheiro público desviado para destinos nebulosos e paraísos fiscais nas privatizações e o auxílio luxuoso aos banqueiros falidos, o governo tucano talvez tenha sido o mais corrupto da história do país. Ao contrário do que aconteceu no governo Lula, a corrupção no governo FHC não foi investigada por nenhuma CPI, todas sepultadas pela maioria parlamentar da coligação PSDB-PFL. O procurador da república ficou conhecido com engavetador da república, tal a quantidade de investigações criminais que morreram em suas mãos. O esquema de financiamento eleitoral batizado de mensalão foi criado pelo presidente nacional do PSDB, senador Eduardo Azeredo, hoje réu em processo criminal. O governador José Roberto Arruda, do DEM, era o principal candidato ao posto de vice-presidente na chapa de Serra, até ser preso por corrupção no mensalão do DEM. Roberto Jefferson, réu confesso do mensalão petista, hoje apóia José Serra. Todos estes fatos, incontestáveis, não indicam que um eventual governo Serra poderia ser mais eficiente no combate à corrupção do que seria um governo Dilma, ao contrário.
8. O PT apóia as FARC.
Argumento falso. É fato que, no passado, as FARC ensaiaram uma tentativa de institucionalização e buscaram aproximação com o PT, então na oposição, e também com o governo brasileiro, através de contatos com o líder do governo tucano, Arthur Virgílio. Estes contatos foram rompidos com a radicalização da guerrilha na Colômbia e nunca foram retomados, a não ser nos delírios da imprensa de extrema-direita. A relação entre o governo brasileiro e os governos estabelecidos de vários países deve estar acima de divergências ideológicas, num princípio básico da diplomacia, o da auto-determinação dos povos. Não há notícias, por exemplo, de capitalistas brasileiros que defendam o rompimento das relações com a China, um dos nossos maiores parceiros comerciais, por se tratar de uma ditadura. Ou alguém acha que a China é um país democrático?
9. O PT censura a imprensa.
Argumento falso. Em seus oito anos de governo o presidente Lula enfrentou a oposição feroz e constante dos principais veículos da antiga imprensa. Esta oposição foi explicitada pela presidente da Associação Nacional de Jornais (ANJ) que declarou que seus filiados assumiram a posição oposicionista (sic) deste país. Não há registro de um único caso de censura à imprensa por parte do governo Lula. O que há, frequentemente, é a queixa dos órgãos de imprensa sobre tentativas da sociedade e do governo, a exemplo do que acontece em todos os países democráticos do mundo, de regulamentar a atividade da mídia.
10. Os jornais, a televisão e as revistas falam muito mal da Dilma e muito bem do Serra.
Isso é verdade. E mais um bom motivo para votar nela e não nele.
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(1) Alguns dados comparativos dos governos FHC e Lula.
Geração de empregos:
FHC/Serra = 780 mil x Lula/Dilma = 12 milhões
Salário mínimo:
FHC/Serra = 64 dólares x Lula/Dilma = 290 dólares
Mobilidade social (brasileiros que deixaram a linha da pobreza):
FHC/Serra = 2 milhões x Lula/Dilma = 27 milhões
Risco Brasil:
FHC/Serra = 2.700 pontos x Lula/Dilma = 200 pontos
Dólar:
FHC/Serra = R$ 3,00 x Lula/Dilma = R$ 1,78
Reservas cambiais:
FHC/Serra = menos 185 bilhões de dólares x Lula/Dilma = mais 239 bilhões de dólares
Relação crédito/PIB:
FHC/Serra = 14% x Lula/Dilma = 34%
Inflação:
FHC/Serra =12,5% (2002) x Lula/Dilma = 4,7% (2009)
Produção de automóveis:
FHC/Serra = queda de 20% x Lula/Dilma = aumento de 30%
Taxa de juros:
FHC/Serra = 27% x Lula/Dilma = 10,75%
(2) Elio Gaspari, na Folha de S.Paulo de 25.07.10:
José Serra começou sua campanha dizendo: "Não aceito o raciocínio do nós contra eles", e em apenas dois meses viu-se lançado pelo seu colega de chapa numa discussão em torno das ligações do PT com as Farc e o narcotráfico. Caso típico de rabo que abanou o cachorro. O destempero de Indio da Costa tem método. Se Tupã ajudar Serra a vencer a eleição, o DEM volta ao poder. Se prejudicar, ajudando Dilma Rousseff, o PSDB sairá da campanha com a identidade estilhaçada. Já o DEM, que entrou na disputa com o cocar do seu mensalão, sairá brandindo o tacape do conservadorismo feroz que renasceu em diversos países, sobretudo nos Estados Unidos.
As eleições 2010 e a revolução democrática
A CSD (corrente CUT Socialista e Democrática) do Rio de Janeiro promove o debate "As eleições 2010 e a revolução democrática". Os debatedores serão Miguel Rossetto, Emir Sader e Robson Leite. O evento acontece nesta terça-feira, 3, às 18h30min no auditório do Sindicato dos Bancários do Rio.
A CSD (corrente CUT Socialista e Democrática) do Rio de Janeiro promoverá, nesta terça-feira, o debate "As eleições 2010 e a Revolução Democrática". Os debatedores serão o sociólogo Emir Sader, um dos organizadores do livro Brasil, entre o passado e o futuro, e candidato a suplente na chapa ao Senado encabeçada por Lindberg Farias; Miguel Rossetto, ex-ministro do desenvolvimento agrário e presidente da Petrobras Biocombustível; e Robson Leite, professor, petroleiro e candidato a deputado estadual.
Na opinião dos organizadores, o debate é um espaço fundamental de reflexão sobre os rumos do país e do RJ. Segundo Neuza Pinto, vice-presidenta da CUT-RJ, a atividade tem o objetivo de ressaltar que as eleições de 2010 são um momento crucial para a manutenção do rico processo de transformações que o Brasil vive. "O compromisso da CSD é com a democracia e a melhoria das condições de vida dos trabalhadores", afirmou. "A campanha não pode ser só uma corrida por votos. É preciso debater idéias, reafirmar nosso compromisso com a ampliação de direitos e a defesa do bem comum", considerou Robson Leite.
O debate acontece a partir de 18h30min nesta terça-feira, 3 de agosto, no auditório do Sindicato dos Bancários do Rio, que fica na Av. Presidente Vargas, 502, 21° andar, centro da cidade.
A CSD (corrente CUT Socialista e Democrática) do Rio de Janeiro promoverá, nesta terça-feira, o debate "As eleições 2010 e a Revolução Democrática". Os debatedores serão o sociólogo Emir Sader, um dos organizadores do livro Brasil, entre o passado e o futuro, e candidato a suplente na chapa ao Senado encabeçada por Lindberg Farias; Miguel Rossetto, ex-ministro do desenvolvimento agrário e presidente da Petrobras Biocombustível; e Robson Leite, professor, petroleiro e candidato a deputado estadual.
Na opinião dos organizadores, o debate é um espaço fundamental de reflexão sobre os rumos do país e do RJ. Segundo Neuza Pinto, vice-presidenta da CUT-RJ, a atividade tem o objetivo de ressaltar que as eleições de 2010 são um momento crucial para a manutenção do rico processo de transformações que o Brasil vive. "O compromisso da CSD é com a democracia e a melhoria das condições de vida dos trabalhadores", afirmou. "A campanha não pode ser só uma corrida por votos. É preciso debater idéias, reafirmar nosso compromisso com a ampliação de direitos e a defesa do bem comum", considerou Robson Leite.
O debate acontece a partir de 18h30min nesta terça-feira, 3 de agosto, no auditório do Sindicato dos Bancários do Rio, que fica na Av. Presidente Vargas, 502, 21° andar, centro da cidade.
"Brasil precisa discutir se quer rural com ou sem gente
Em entrevista à Carta Maior, o ministro do Desenvolvimento Agrário, Guilherme Cassel, faz um balanço de quase oito anos das políticas de Reforma Agrária do governo Lula. Cassel assinala que 59% de todas as famílias assentadas na história do país, o foram durante o governo Lula, que já destinou 45 milhões de hectares de terra para Reforma Agrária.
O ministro reconhece, por outro lado, que ainda há muito que fazer para construir uma estrutura fundiária mais equilibrada no país. E destaca o crescimento da agricultura familiar no país e a importância da diversidade de populações rurais no Brasil. A agenda da Reforma Agrária, conclui, está muito mais diversificada, não se restringe mais a uma questão meramente fundiária e está diretamente ligada aos temas da segurança alimentar, da matriz energética e das mudanças climáticas no planeta. Todas elas, enfatiza, passam pelo tipo de modelo desenvolvimento rural que queremos.
Após quase oito anos, há mudanças significativas no meio rural brasileiro. Segundo dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), entre 2003 e 2008, cerca de 24 milhões de brasileiros superaram a condição de pobreza. Destes, 4,8 milhões são moradores do campo, o que corresponde a aproximadamente 17% da população rural. A taxa de pobreza nas áreas rurais caiu de 55% para 39%. No mesmo período, a renda média da Agricultura Familiar cresceu 30% em termos reais, enquanto a renda média brasileira cresceu 11%.
Esses números são apresentados pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário como resultado da construção de um colchão de renda no país, com o fortalecimento das economias das pequenas cidades e do campo, através de políticas de crédito, assistência técnica, seguro agrícola, política de preços e compras governamentais.
Leia a entrevista abaixo.
CARTA MAIOR: De um modo geral, há dois tipos de críticas dirigidas à agenda da Reforma Agrária no governo Lula. Um que vem da direita, dos setores mais conservadores, que são contra a existência de um ministério para este fim, que dizem que se trata de um desperdício de recursos público e que o MDA é um braço do MST. E o outro tipo de crítica vem de setores à esquerda, do próprio MST, que sustentam que a Reforma Agrária é uma das coisas que não avançou no governo Lula. Qual a sua opinião sobre essas críticas?
GUILHERME CASSEL: Em primeiro lugar, acho que devemos ter um balanço sensato e equilibrado sobre a Reforma Agrária. Não dá para fazer uma conversa maniqueísta sobre Reforma Agrária, se andou ou não andou. Um bom ponto de partida é olhar o atual ambiente brasileiro no que diz respeito a esse tema. O estoque de Reforma Agrária no Brasil até hoje é de quase um milhão de famílias assentadas. Isso é tudo que foi feito de Reforma Agrária até hoje na história do Brasil. Deste total, 590 mil foram assentados nos últimos oito anos. Ou seja, 59% das famílias assentadas na história do país, o foram durante o governo Lula, que já destinou 45 milhões de hectares de terra para Reforma Agrária.
Isso é suficiente para mudar a estrutura fundiária brasileira? Não, isso não é suficiente. Precisamos continuar fazendo Reforma Agrária para termos uma estrutura fundiária mais equilibrada no país. O Brasil é um país que ainda tem muita concentração fundiária. Agora, também é verdade que o Brasil mudou nestes últimos 8 anos e o tema fundiário não deve mais ficar restrito à Reforma Agrária clássica. Durante muito tempo, nos acostumamos a pensar o Brasil rural como se fosse dividido entre “com terra” e “sem terra”. O país tem, de fato, com terra e sem terra, mas tem muito mais do que isso. A situação é muito mais complexa. O Brasil tem extrativistas, ribeirinhos, varzeteiros (pessoas que moram em regiões de várzea e quando as águas sobem precisam recuar), indígenas, pescadores, quilombolas. Ou seja, há uma diversidade de populações rurais no Brasil com problema de terra que não se resume só à questão da Reforma Agrária. A Reforma Agrária é evidentemente um tema no Sul no país. No Norte, o tema é regularização fundiária, é garantir título de terra para quem - há 30, 40 anos - ocupa uma terra pública e produz. Para as populações indígenas, o tema é demarcar reservas. Para as populações quilombolas é reconhecer seu direito à sua terra. Em resumo, temos uma diversidade hoje que não aparecia no Brasil e que também deve ser tratada.
É lógico que existe uma questão da Reforma Agrária no Brasil: como é que se constrói uma estrutura fundiária mais equilibrada. Nós temos três instrumentos para tratar dessa questão. O primeiro deles é o da Reforma Agrária clássica: desapropriar latifúndio improdutivo para produzir alimentos para o país. O segundo, tão importante quanto o primeiro, é regularização fundiária, um problema especialmente no Norte do país, mas também no Nordeste, onde a grande maioria dos agricultores não têm título da terra. O terceiro é crédito fundiário para as populações que não são sem terra. No sul do país, por exemplo, filho de agricultor que quer continuar na terra produzindo precisa ter acesso ao sistema de crédito para comprar terra.
A questão agrária brasileira mudou nos últimos anos. Em primeiro lugar, porque assentamos muita gente. Em segundo, porque não temos mais hoje a tensão que havia antes. Como há muito emprego nas cidades, não há um contingente muito grande de pessoas sem esperança querendo voltar para o campo. Essa demanda diminuiu muito. Nosso desafio hoje, considerando esse cenário, é construir outra estrutura agrária reconhecendo populações que eram invisíveis até então.
CARTA MAIOR: Quando falamos deste Brasil Rural, de que universo estamos falando quantativamente? Qual o tamanho do Rural brasileiro?
GUILHERME CASSEL: O Censo do IBGE, considerando apenas a população rural, fala em algo entre 15 e 20 milhões de habitantes. Hoje, o conceito que vem sendo mais utilizado, inclusive na academia (é o conceito com que José Luis da Veiga trabalha), parte da idéia de que os municípios com menos de 50 mil habitantes têm uma característica econômica e cultural marcadamente rural. Esses municípios têm uma intersecção com o rural muito grande. Por esse critério, cerca de 32% da população brasileira têm a ver com meio rural, é impactada por esse meio. Isso significa um universo de cerca de 55 milhões de pessoas. Acho que esse é um bom critério.
Trata-se de um contingente muito grande de pessoas que abre uma outra discussão. No Brasil, a partir dos anos 60, a nossa geração foi impactada por uma experiência de industrialização e urbanização muito forte. Essa experiência marcou em nosso imaginário a idéia simplificada de que a cidade é algo bom e o rural é o atrasado. O agricultor bem sucedido é aquele que conseguia mandar os filhos estudar na cidade, que dava uma oportunidade a eles de sair do campo. Creio que esse tipo de percepção começa a mudar agora. Em primeiro lugar, porque estamos vivendo um processo de esgotamento das cidades. Muitos dos problemas de má qualidade de vida hoje nas cidades só terão uma solução adequada com um rural com gente. Precisamos de mais equilíbrio entre o urbano e o rural, seja do ponto de vista numérico, seja do ponto de vista de qualidade de vida. Hoje, garantir qualidade de vida no meio rural significa, entre outras coisas, resolver problemas das grandes cidades.
Outro tema que precisa ser levado em conta é o surgimento de uma grande novidade neste início de século XXI. Há três agendas que estavam subsumidas e que se deslocaram para o centro das preocupações de todos os países e organismos internacionais: segurança alimentar, mudança climática e construção de outra matriz energética que supere a atual baseada em combustíveis fósseis. A maior ou menor capacidade de um país resolver estas três agendas estará muito vinculada à sua capacidade de se desenvolver e de ocupar um lugar central no mundo no decorrer do século XXI.
Essas três agendas têm um ponto em comum: as três têm a ver com desenvolvimento rural, com agricultura familiar e com a idéia de um rural com gente. Tudo isso junto está revalorizando o rural. Estamos entrando em um século onde o rural deve ganhar de novo um certo relevo. O mundo hoje se preocupa com segurança alimentar, se preocupa com a qualidade dos alimentos, com o meio ambiente. E tudo isso tem a ver com o meio rural.
CARTA MAIOR: Normalmente as críticas se dirigem à Reforma Agrária. Se tomamos o nome do ministério ele não é da Reforma Agrária, mas sim do Desenvolvimento Agrário. E considerando essas três agendas que se cruzam e que apontam para um novo debate envolvendo o campo, parece que, de fato, o principal trabalho do MDA não se esgota mais no tema restrito da Reforma Agrária...
GUILHERME CASSEL: Eu sou favorável a transformar o ministério em um Ministério do Desenvolvimento Rural. Acho que seria mais correto. Estamos vivendo um momento impressionante. O Brasil não é o que era há oito anos. Quando assumimos o ministério com Miguel Rossetto, tínhamos 300 mil pessoas acampadas em beira de estrada. Eram pessoas que tinham perdido terra por falta de política agrícola e que não tinham expectativa de emprego nas cidades. O Brasil cresceu e se desenvolveu nos últimos anos e não tem um problema grave de desemprego. Como houve a implementação de políticas como seguro agrícola e crédito, as pessoas não perderam suas terras. Você pode viajar hoje pelo país e encontrará pouqíssimos acampamentos de Reforma Agrária. Esses acampamentos estão praticamente vazios hoje. Essa demanda se esvaziou muito.
Ao mesmo tempo, à medida que o governo passou a entrar no rural essas novas populações apareceram e, com elas, apareceram também problemas novos. Hoje no Norte do país, todos os movimentos sociais e todos os governos estaduais concordam que o tema agrário central na região não é Reforma Agrária. Não faz nenhum sentido o governo federal desapropriar uma área no Norte do país, pagando por ela, quando 80% das terras são terras federais. O que é preciso fazer é desalojar quem está ocupando as terras ilegalmente, madereiros ilegais, quem está fazendo trabalho escravo, quem está desmatando, e colocar populações que trabalhem na terra. Essas populações só se tornaram visíveis agora. O Brasil não falava de extrativistas, de varzeteiros, de ribeirinhos, pescadores ou quilombolas. Tirar esse contingente da invisibilidade e colocá-los como atores sociais contemporâneos muda o enfoque da Reforma Agrária.
CARTA MAIOR: Considerando as três agendas citadas (segurança alimentar, mudança climática e matriz energética) e o atual padrão de concentração de terras no país em que estágio o Brasil estaria tomando como meta um modelo de desenvolvimento não destruidor do meio ambiente?
GUILHERME CASSEL: Acho que ainda estamos muito distantes dessa meta. O Brasil ainda é um dos países com a maior concentração fundiária do mundo e começa a pagar um preço por isso. O último estudo do IPEA sobre esse tema é muito interessante, especialmente se comparamos o Centro-Oeste do país com o Sul. Há dois modelos agrários vigorando hoje. Temos, no Centro-Oeste, uma agricultura altamente modernizada, com alta tecnologia, monocultura e grandes extensões de terra. E temos no Sul do país uma estrutura agrária mais diversificada, com presença forte de minifúndios e agricultura familiar. O estudo do IPEA mostra que, no Centro-Oeste, o PIB per capita foi o que mais cresceu no Brasil. Por outro lado, o Centro-Oeste é a região onde os índices de pobreza absoluta menos diminuíram (caíram só 12,7%). Já na região Sul, por outro lado, o PIB per capita aumentou bem menos, mas os índices de diminuição da pobreza aumentaram muito mais (47,1%).
Então, o que está acontecendo no Centro-Oeste é um crescimento com concentração. Cresce e não distribui. Alguns continuam enriquecendo, mas a pobreza permanece praticamente igual. Já na região Sul, o crescimento se dá com menos velocidade, mas com maior distribuição. E isso ocorre porque, na base de sua economia, a estrutura fundiária é mais diversificada. Essa é uma escolha que teremos que fazer: queremos crescer aceleradamente de modo concentrado ou crescer mais devagar distribuindo a riqueza para o conjunto da população? Penso que esse modelo da região Sul é muito mais adequado aos interesses da imensa maioria da população brasileira.
CARTA MAIOR: Esse padrão de maior concentração de terra está localizado mais na região Centro-Oeste hoje?
GUILHERME CASSEL: Sim, mais no Centro-Oeste. Nas décadas de 70-80 ocorreu uma corrida para esta região. Há uma área do Centro-Oeste brasileiro que tem hoje a maior produtividade agrícola do país. Ela é baseada em latifúndio, alta modernização, sementes transgênicas e monocultura de soja voltada para exportação. Isso deu resultado? Sim, deu resultado, tem muita rentabilidade. Mas é esse tipo de resultado que a gente quer? O que a gente quer é simplesmente mais e mais receita, ou uma agricultura que gere renda, mas que também garanta segurança alimentar, alimentos de qualidade, diversidade produtiva e distribuição de renda na base da sociedade. Não adianta nada alguns enriquecerem muito com uma pobreza enorme em volta. E nem estou falando no custo ambiental desse modelo, que é altíssimo.
CARTA MAIOR: Na sua gestão houve um debate mais aprofundado entre o MDA e o Ministério da Agricultura em torno dessa idéia de um novo modelo de desenvolvimento rural para o Brasil? Essas duas áreas dialogam ou não?
GUILHERME CASSEL: O Ministério da Agricultura e o Ministério do Desenvolvimento Agrário representam bases sociais diferenciadas. Isso causa uma tensão que nos coloca o desafio de trabalhar junto na medida do possível. Procuramos não transformar essa tensão em algo irracional ou antagônico. Neste sentido, acho que caminhamos bem nestes últimos oito anos. Não é uma caminhada fácil, considerando o ambiente político em que vivemos. A gente costuma dizer que há dois modelos de agricultura convivendo no Brasil. Na verdade, eu acho que são três. Há a agricultura de base familiar, onde tem gente que produz muito com pouca terra, e, do outro lado, tem dois tipos de agricultura, ambos vinculados ao latifúndio. Há uma agricultura vinculada ao latifúndio que é moderna, produtiva, tecnificada e contribui muito do ponto de vista do equilíbrio econômico do país, da estabilidade das contas públicas. Mas há um outro setor vinculado ao latifúndio, especialmente no Norte e no Nordeste do país, que é atrasado, que produz mal, com baixo padrão de produtividade, que pratica trabalho escravo, que faz desmatamento e extração ilegal de madeira, que empobrece o solo e envenena rios.
Há um setor da CNA (Confederação Nacional da Agricultura) hoje que está ingressando com ações judiciais contra o Ministério Público porque este está exigindo que a população tenha direito a consumir carne com selo verde (que não seja fruto de práticas como desmatamento e de trabalho escravo). Isso é um atraso monumental. Como esse setor tem força política, ele acaba emperrando essa discussão sobre um novo padrão de desenvolvimento rural, que deveria ocorrer em um ambiente mais equilibrado.
CARTA MAIOR: E com os movimentos sociais do campo, esse debate vem ocorrendo?
GUILHERME CASSEL: Acho que esse debate avançou. Um bom critério para avaliar esse ponto é olhar a pauta dos movimentos sociais. Se olhamos para a pauta do MST, da Contag ou da Fetraf, em 2003,2004, e para a pauta dessas entidades hoje, veremos que ela está muito mais aberta e diversificada. A pauta de 2003, por exemplo, dizia: precisamos de seguro agrícola. Nós já temos seguro agrícola de clima e de preço funcionando e incorporados como uma coisa natural. A pauta de 2003 pedia mais recursos de crédito para a agricultura familiar. Estamos agora com 16 bilhões de crédito e, nos últimos anos, sempre tem sobrado recursos deste crédito. Temos também política de garantia de preço mínimo para a agricultura familiar. Então muita coisa mudou e os agricultores foram impactados positivamente por essa mudança. Aquele discurso sectário de alguns anos atrás, que dizia que nada estava avançando, que o governo só estava beneficiando os grandes, não tem mais lugar hoje, porque a vida das pessoas mudou.
De 2003 para 2008, a taxa de pobreza nas áreas rurais caiu de 55% para 39%. Mais de 4,8 milhões de pessoas saíram da condição de pobreza na área rural. A renda média no país aumentou 11% neste período. Na agricultura familiar aumentou 30%. Vou citar outro dado importante. Se pegarmos o período entre 1996 e 2006, a agricultura brasileira tinha incorporado em suas propriedades 7.200 tratores. Com o nosso programa Mais Alimentos, em um ano e meio, só a agricultura familiar incorporou 30 mil tratores em suas propriedades. Ou seja, há um sentido novo no rural brasileiro que é expresso por esses números. Depois que o Censo Agropecuário de 2006 mostrou que a agricultura familiar é 89% mais produtiva por hectare que a agricultura patronal, fica claro para todo mundo que, quanto mais agricultura familiar tivermos, melhor será para o Brasil.
CARTA MAIOR: As feiras nacionais de agricultura familiar promovidas pelo MDA em Brasília, Rio de Janeiro e Porto Alegre foram muito bem recebidas pelas populações destas cidades. Nas suas andanças pelo país, o senhor percebe uma mudança de percepção junto à população urbana sobre a importância deste tipo de agricultura?
GUILHERME CASSEL: Espero não estar sendo muito pretensioso, mas acho que introduzimos o tema Agricultura Familiar no vocabulário nacional. As pessoas não sabiam o que era a agricultura familiar e tinham até um preconceito em relação a ela. O que estava construído n0 imaginário brasileiro era um Rural dividido em duas partes: os grandes, com muita terra e equipamentos, modernos e produtivos; e os demais (agricultores familiares, assentados) que faziam parte de um espaço de pobreza, atraso e não-produção. Os próprios governos olhavam dessa maneira, tanto é que Reforma Agrária e Agricultura Familiar eram tratadas como políticas sociais. Uma das grandes novidades do governo Lula é olhar para esse setor e decidir que ele precisava de política econômica e não de política social, que precisava de crédito para produzir e não de cesta básica. Quando passamos a garantir crédito, assistência técnica, seguro agrícola e preço, ele respondeu com muita rapidez.
Hoje a população sabe que 70% daquilo que ela consome no dia-a-dia é produzido pela agricultura familiar. O que vimos nas feiras realizadas em Brasília, no Rio e em Porto Alegre é que o encontro da população urbana com a agricultura familiar é marcado por um encantamento muito grande de parte a parte.
CARTA MAIOR: Voltando a um outro tema ligado à questão fundiária: a compra de terras por estrangeiros no Brasil é um problema?
GUILHERME CASSEL: Sim. É um problema sério. A nossa legislação está parada nos anos 90, quando houve uma certa histeria neoliberal no país, que significou, entre outras coisas, a retirada de muitos mecanismos de controle. Nós procuramos enfrentar esse problema junto com o Poder Judiciário. O Conselho Nacional de Justiça tem baixado portarias orientando os cartórios a pelo menos não fazer registros de novas compras de propriedades antes de informar o Incra. Precisamos avançar no sentido de limitar esse tipo de compra. Trata-se de um assunto ligado à soberania e à segurança nacional. Não há nenhuma xenofobia aí. Não há nenhum problema em existir investimentos internacionais em determinados setores. Agora, ser dono da terra é outra coisa. O território brasileiro é um território finito e ele tem que ser, preferencialmente, para os brasileiros.
CARTA MAIOR: E sobre o futuro, quais devem ser as prioridades do MDA para os próximos anos?
GUILHERME CASSSEL: O Brasil precisa discutir de forma mais clara – o que não tem ocorrido nos últimos anos – qual é o papel do rural no seu projeto de desenvolvimento. A gente costuma pensar o desenvolvimento principalmente a partir da indústria e dos serviços. Mas qual é o papel do rural? E que rural nós queremos? Um rural com gente ou sem gente? Eu acho que precisa ser um rural com gente e o primeiro passo para isso é mudar a estrutura fundiária do país. Precisamos ajustar índices de produtividade, precisamos criar mecanismos mais ágeis de desapropriação, discutir seriamente a questão do limite das propriedades...
CARTA MAIOR: Há espaço político para temas como o da revisão de índices de produtividade avançar? Até hoje, essa questão é totalmente barrada no Congresso pela bancada ruralista e seus aliados.
GUILHERME CASSEL: Acho que o Brasil está mudando e a correlação de forças no próximo período deve mudar também. Espero que as mudanças que ocorreram no meio rural acabem se refletindo também no plano político. Eu sou otimista sobre esse tema e acho que estamos caminhando para construir uma correlação de forças mais equilibrada e retomar um ambiente de discussão menos maniqueísta. Qualquer país desenvolvido na história contemporânea discutiu a reforma agrária, a questão do limite das propriedades, da função social da terra. Esses temas ainda são muito contaminados no Brasil. Eles precisam ser descontaminados e debatidos com mais equilíbrio. É uma condição necessária para o país crescer de modo mais harmônico e equilibrado.
No terreno da política agrícola, acho que somos exemplares do ponto de vista de crédito, de seguro e de assistência técnica, mas ainda precisamos avançar bastante em garantia de renda e de preço para os agricultores e também na questão do cooperativismo de produção.
O ministro reconhece, por outro lado, que ainda há muito que fazer para construir uma estrutura fundiária mais equilibrada no país. E destaca o crescimento da agricultura familiar no país e a importância da diversidade de populações rurais no Brasil. A agenda da Reforma Agrária, conclui, está muito mais diversificada, não se restringe mais a uma questão meramente fundiária e está diretamente ligada aos temas da segurança alimentar, da matriz energética e das mudanças climáticas no planeta. Todas elas, enfatiza, passam pelo tipo de modelo desenvolvimento rural que queremos.
Após quase oito anos, há mudanças significativas no meio rural brasileiro. Segundo dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), entre 2003 e 2008, cerca de 24 milhões de brasileiros superaram a condição de pobreza. Destes, 4,8 milhões são moradores do campo, o que corresponde a aproximadamente 17% da população rural. A taxa de pobreza nas áreas rurais caiu de 55% para 39%. No mesmo período, a renda média da Agricultura Familiar cresceu 30% em termos reais, enquanto a renda média brasileira cresceu 11%.
Esses números são apresentados pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário como resultado da construção de um colchão de renda no país, com o fortalecimento das economias das pequenas cidades e do campo, através de políticas de crédito, assistência técnica, seguro agrícola, política de preços e compras governamentais.
Leia a entrevista abaixo.
CARTA MAIOR: De um modo geral, há dois tipos de críticas dirigidas à agenda da Reforma Agrária no governo Lula. Um que vem da direita, dos setores mais conservadores, que são contra a existência de um ministério para este fim, que dizem que se trata de um desperdício de recursos público e que o MDA é um braço do MST. E o outro tipo de crítica vem de setores à esquerda, do próprio MST, que sustentam que a Reforma Agrária é uma das coisas que não avançou no governo Lula. Qual a sua opinião sobre essas críticas?
GUILHERME CASSEL: Em primeiro lugar, acho que devemos ter um balanço sensato e equilibrado sobre a Reforma Agrária. Não dá para fazer uma conversa maniqueísta sobre Reforma Agrária, se andou ou não andou. Um bom ponto de partida é olhar o atual ambiente brasileiro no que diz respeito a esse tema. O estoque de Reforma Agrária no Brasil até hoje é de quase um milhão de famílias assentadas. Isso é tudo que foi feito de Reforma Agrária até hoje na história do Brasil. Deste total, 590 mil foram assentados nos últimos oito anos. Ou seja, 59% das famílias assentadas na história do país, o foram durante o governo Lula, que já destinou 45 milhões de hectares de terra para Reforma Agrária.
Isso é suficiente para mudar a estrutura fundiária brasileira? Não, isso não é suficiente. Precisamos continuar fazendo Reforma Agrária para termos uma estrutura fundiária mais equilibrada no país. O Brasil é um país que ainda tem muita concentração fundiária. Agora, também é verdade que o Brasil mudou nestes últimos 8 anos e o tema fundiário não deve mais ficar restrito à Reforma Agrária clássica. Durante muito tempo, nos acostumamos a pensar o Brasil rural como se fosse dividido entre “com terra” e “sem terra”. O país tem, de fato, com terra e sem terra, mas tem muito mais do que isso. A situação é muito mais complexa. O Brasil tem extrativistas, ribeirinhos, varzeteiros (pessoas que moram em regiões de várzea e quando as águas sobem precisam recuar), indígenas, pescadores, quilombolas. Ou seja, há uma diversidade de populações rurais no Brasil com problema de terra que não se resume só à questão da Reforma Agrária. A Reforma Agrária é evidentemente um tema no Sul no país. No Norte, o tema é regularização fundiária, é garantir título de terra para quem - há 30, 40 anos - ocupa uma terra pública e produz. Para as populações indígenas, o tema é demarcar reservas. Para as populações quilombolas é reconhecer seu direito à sua terra. Em resumo, temos uma diversidade hoje que não aparecia no Brasil e que também deve ser tratada.
É lógico que existe uma questão da Reforma Agrária no Brasil: como é que se constrói uma estrutura fundiária mais equilibrada. Nós temos três instrumentos para tratar dessa questão. O primeiro deles é o da Reforma Agrária clássica: desapropriar latifúndio improdutivo para produzir alimentos para o país. O segundo, tão importante quanto o primeiro, é regularização fundiária, um problema especialmente no Norte do país, mas também no Nordeste, onde a grande maioria dos agricultores não têm título da terra. O terceiro é crédito fundiário para as populações que não são sem terra. No sul do país, por exemplo, filho de agricultor que quer continuar na terra produzindo precisa ter acesso ao sistema de crédito para comprar terra.
A questão agrária brasileira mudou nos últimos anos. Em primeiro lugar, porque assentamos muita gente. Em segundo, porque não temos mais hoje a tensão que havia antes. Como há muito emprego nas cidades, não há um contingente muito grande de pessoas sem esperança querendo voltar para o campo. Essa demanda diminuiu muito. Nosso desafio hoje, considerando esse cenário, é construir outra estrutura agrária reconhecendo populações que eram invisíveis até então.
CARTA MAIOR: Quando falamos deste Brasil Rural, de que universo estamos falando quantativamente? Qual o tamanho do Rural brasileiro?
GUILHERME CASSEL: O Censo do IBGE, considerando apenas a população rural, fala em algo entre 15 e 20 milhões de habitantes. Hoje, o conceito que vem sendo mais utilizado, inclusive na academia (é o conceito com que José Luis da Veiga trabalha), parte da idéia de que os municípios com menos de 50 mil habitantes têm uma característica econômica e cultural marcadamente rural. Esses municípios têm uma intersecção com o rural muito grande. Por esse critério, cerca de 32% da população brasileira têm a ver com meio rural, é impactada por esse meio. Isso significa um universo de cerca de 55 milhões de pessoas. Acho que esse é um bom critério.
Trata-se de um contingente muito grande de pessoas que abre uma outra discussão. No Brasil, a partir dos anos 60, a nossa geração foi impactada por uma experiência de industrialização e urbanização muito forte. Essa experiência marcou em nosso imaginário a idéia simplificada de que a cidade é algo bom e o rural é o atrasado. O agricultor bem sucedido é aquele que conseguia mandar os filhos estudar na cidade, que dava uma oportunidade a eles de sair do campo. Creio que esse tipo de percepção começa a mudar agora. Em primeiro lugar, porque estamos vivendo um processo de esgotamento das cidades. Muitos dos problemas de má qualidade de vida hoje nas cidades só terão uma solução adequada com um rural com gente. Precisamos de mais equilíbrio entre o urbano e o rural, seja do ponto de vista numérico, seja do ponto de vista de qualidade de vida. Hoje, garantir qualidade de vida no meio rural significa, entre outras coisas, resolver problemas das grandes cidades.
Outro tema que precisa ser levado em conta é o surgimento de uma grande novidade neste início de século XXI. Há três agendas que estavam subsumidas e que se deslocaram para o centro das preocupações de todos os países e organismos internacionais: segurança alimentar, mudança climática e construção de outra matriz energética que supere a atual baseada em combustíveis fósseis. A maior ou menor capacidade de um país resolver estas três agendas estará muito vinculada à sua capacidade de se desenvolver e de ocupar um lugar central no mundo no decorrer do século XXI.
Essas três agendas têm um ponto em comum: as três têm a ver com desenvolvimento rural, com agricultura familiar e com a idéia de um rural com gente. Tudo isso junto está revalorizando o rural. Estamos entrando em um século onde o rural deve ganhar de novo um certo relevo. O mundo hoje se preocupa com segurança alimentar, se preocupa com a qualidade dos alimentos, com o meio ambiente. E tudo isso tem a ver com o meio rural.
CARTA MAIOR: Normalmente as críticas se dirigem à Reforma Agrária. Se tomamos o nome do ministério ele não é da Reforma Agrária, mas sim do Desenvolvimento Agrário. E considerando essas três agendas que se cruzam e que apontam para um novo debate envolvendo o campo, parece que, de fato, o principal trabalho do MDA não se esgota mais no tema restrito da Reforma Agrária...
GUILHERME CASSEL: Eu sou favorável a transformar o ministério em um Ministério do Desenvolvimento Rural. Acho que seria mais correto. Estamos vivendo um momento impressionante. O Brasil não é o que era há oito anos. Quando assumimos o ministério com Miguel Rossetto, tínhamos 300 mil pessoas acampadas em beira de estrada. Eram pessoas que tinham perdido terra por falta de política agrícola e que não tinham expectativa de emprego nas cidades. O Brasil cresceu e se desenvolveu nos últimos anos e não tem um problema grave de desemprego. Como houve a implementação de políticas como seguro agrícola e crédito, as pessoas não perderam suas terras. Você pode viajar hoje pelo país e encontrará pouqíssimos acampamentos de Reforma Agrária. Esses acampamentos estão praticamente vazios hoje. Essa demanda se esvaziou muito.
Ao mesmo tempo, à medida que o governo passou a entrar no rural essas novas populações apareceram e, com elas, apareceram também problemas novos. Hoje no Norte do país, todos os movimentos sociais e todos os governos estaduais concordam que o tema agrário central na região não é Reforma Agrária. Não faz nenhum sentido o governo federal desapropriar uma área no Norte do país, pagando por ela, quando 80% das terras são terras federais. O que é preciso fazer é desalojar quem está ocupando as terras ilegalmente, madereiros ilegais, quem está fazendo trabalho escravo, quem está desmatando, e colocar populações que trabalhem na terra. Essas populações só se tornaram visíveis agora. O Brasil não falava de extrativistas, de varzeteiros, de ribeirinhos, pescadores ou quilombolas. Tirar esse contingente da invisibilidade e colocá-los como atores sociais contemporâneos muda o enfoque da Reforma Agrária.
CARTA MAIOR: Considerando as três agendas citadas (segurança alimentar, mudança climática e matriz energética) e o atual padrão de concentração de terras no país em que estágio o Brasil estaria tomando como meta um modelo de desenvolvimento não destruidor do meio ambiente?
GUILHERME CASSEL: Acho que ainda estamos muito distantes dessa meta. O Brasil ainda é um dos países com a maior concentração fundiária do mundo e começa a pagar um preço por isso. O último estudo do IPEA sobre esse tema é muito interessante, especialmente se comparamos o Centro-Oeste do país com o Sul. Há dois modelos agrários vigorando hoje. Temos, no Centro-Oeste, uma agricultura altamente modernizada, com alta tecnologia, monocultura e grandes extensões de terra. E temos no Sul do país uma estrutura agrária mais diversificada, com presença forte de minifúndios e agricultura familiar. O estudo do IPEA mostra que, no Centro-Oeste, o PIB per capita foi o que mais cresceu no Brasil. Por outro lado, o Centro-Oeste é a região onde os índices de pobreza absoluta menos diminuíram (caíram só 12,7%). Já na região Sul, por outro lado, o PIB per capita aumentou bem menos, mas os índices de diminuição da pobreza aumentaram muito mais (47,1%).
Então, o que está acontecendo no Centro-Oeste é um crescimento com concentração. Cresce e não distribui. Alguns continuam enriquecendo, mas a pobreza permanece praticamente igual. Já na região Sul, o crescimento se dá com menos velocidade, mas com maior distribuição. E isso ocorre porque, na base de sua economia, a estrutura fundiária é mais diversificada. Essa é uma escolha que teremos que fazer: queremos crescer aceleradamente de modo concentrado ou crescer mais devagar distribuindo a riqueza para o conjunto da população? Penso que esse modelo da região Sul é muito mais adequado aos interesses da imensa maioria da população brasileira.
CARTA MAIOR: Esse padrão de maior concentração de terra está localizado mais na região Centro-Oeste hoje?
GUILHERME CASSEL: Sim, mais no Centro-Oeste. Nas décadas de 70-80 ocorreu uma corrida para esta região. Há uma área do Centro-Oeste brasileiro que tem hoje a maior produtividade agrícola do país. Ela é baseada em latifúndio, alta modernização, sementes transgênicas e monocultura de soja voltada para exportação. Isso deu resultado? Sim, deu resultado, tem muita rentabilidade. Mas é esse tipo de resultado que a gente quer? O que a gente quer é simplesmente mais e mais receita, ou uma agricultura que gere renda, mas que também garanta segurança alimentar, alimentos de qualidade, diversidade produtiva e distribuição de renda na base da sociedade. Não adianta nada alguns enriquecerem muito com uma pobreza enorme em volta. E nem estou falando no custo ambiental desse modelo, que é altíssimo.
CARTA MAIOR: Na sua gestão houve um debate mais aprofundado entre o MDA e o Ministério da Agricultura em torno dessa idéia de um novo modelo de desenvolvimento rural para o Brasil? Essas duas áreas dialogam ou não?
GUILHERME CASSEL: O Ministério da Agricultura e o Ministério do Desenvolvimento Agrário representam bases sociais diferenciadas. Isso causa uma tensão que nos coloca o desafio de trabalhar junto na medida do possível. Procuramos não transformar essa tensão em algo irracional ou antagônico. Neste sentido, acho que caminhamos bem nestes últimos oito anos. Não é uma caminhada fácil, considerando o ambiente político em que vivemos. A gente costuma dizer que há dois modelos de agricultura convivendo no Brasil. Na verdade, eu acho que são três. Há a agricultura de base familiar, onde tem gente que produz muito com pouca terra, e, do outro lado, tem dois tipos de agricultura, ambos vinculados ao latifúndio. Há uma agricultura vinculada ao latifúndio que é moderna, produtiva, tecnificada e contribui muito do ponto de vista do equilíbrio econômico do país, da estabilidade das contas públicas. Mas há um outro setor vinculado ao latifúndio, especialmente no Norte e no Nordeste do país, que é atrasado, que produz mal, com baixo padrão de produtividade, que pratica trabalho escravo, que faz desmatamento e extração ilegal de madeira, que empobrece o solo e envenena rios.
Há um setor da CNA (Confederação Nacional da Agricultura) hoje que está ingressando com ações judiciais contra o Ministério Público porque este está exigindo que a população tenha direito a consumir carne com selo verde (que não seja fruto de práticas como desmatamento e de trabalho escravo). Isso é um atraso monumental. Como esse setor tem força política, ele acaba emperrando essa discussão sobre um novo padrão de desenvolvimento rural, que deveria ocorrer em um ambiente mais equilibrado.
CARTA MAIOR: E com os movimentos sociais do campo, esse debate vem ocorrendo?
GUILHERME CASSEL: Acho que esse debate avançou. Um bom critério para avaliar esse ponto é olhar a pauta dos movimentos sociais. Se olhamos para a pauta do MST, da Contag ou da Fetraf, em 2003,2004, e para a pauta dessas entidades hoje, veremos que ela está muito mais aberta e diversificada. A pauta de 2003, por exemplo, dizia: precisamos de seguro agrícola. Nós já temos seguro agrícola de clima e de preço funcionando e incorporados como uma coisa natural. A pauta de 2003 pedia mais recursos de crédito para a agricultura familiar. Estamos agora com 16 bilhões de crédito e, nos últimos anos, sempre tem sobrado recursos deste crédito. Temos também política de garantia de preço mínimo para a agricultura familiar. Então muita coisa mudou e os agricultores foram impactados positivamente por essa mudança. Aquele discurso sectário de alguns anos atrás, que dizia que nada estava avançando, que o governo só estava beneficiando os grandes, não tem mais lugar hoje, porque a vida das pessoas mudou.
De 2003 para 2008, a taxa de pobreza nas áreas rurais caiu de 55% para 39%. Mais de 4,8 milhões de pessoas saíram da condição de pobreza na área rural. A renda média no país aumentou 11% neste período. Na agricultura familiar aumentou 30%. Vou citar outro dado importante. Se pegarmos o período entre 1996 e 2006, a agricultura brasileira tinha incorporado em suas propriedades 7.200 tratores. Com o nosso programa Mais Alimentos, em um ano e meio, só a agricultura familiar incorporou 30 mil tratores em suas propriedades. Ou seja, há um sentido novo no rural brasileiro que é expresso por esses números. Depois que o Censo Agropecuário de 2006 mostrou que a agricultura familiar é 89% mais produtiva por hectare que a agricultura patronal, fica claro para todo mundo que, quanto mais agricultura familiar tivermos, melhor será para o Brasil.
CARTA MAIOR: As feiras nacionais de agricultura familiar promovidas pelo MDA em Brasília, Rio de Janeiro e Porto Alegre foram muito bem recebidas pelas populações destas cidades. Nas suas andanças pelo país, o senhor percebe uma mudança de percepção junto à população urbana sobre a importância deste tipo de agricultura?
GUILHERME CASSEL: Espero não estar sendo muito pretensioso, mas acho que introduzimos o tema Agricultura Familiar no vocabulário nacional. As pessoas não sabiam o que era a agricultura familiar e tinham até um preconceito em relação a ela. O que estava construído n0 imaginário brasileiro era um Rural dividido em duas partes: os grandes, com muita terra e equipamentos, modernos e produtivos; e os demais (agricultores familiares, assentados) que faziam parte de um espaço de pobreza, atraso e não-produção. Os próprios governos olhavam dessa maneira, tanto é que Reforma Agrária e Agricultura Familiar eram tratadas como políticas sociais. Uma das grandes novidades do governo Lula é olhar para esse setor e decidir que ele precisava de política econômica e não de política social, que precisava de crédito para produzir e não de cesta básica. Quando passamos a garantir crédito, assistência técnica, seguro agrícola e preço, ele respondeu com muita rapidez.
Hoje a população sabe que 70% daquilo que ela consome no dia-a-dia é produzido pela agricultura familiar. O que vimos nas feiras realizadas em Brasília, no Rio e em Porto Alegre é que o encontro da população urbana com a agricultura familiar é marcado por um encantamento muito grande de parte a parte.
CARTA MAIOR: Voltando a um outro tema ligado à questão fundiária: a compra de terras por estrangeiros no Brasil é um problema?
GUILHERME CASSEL: Sim. É um problema sério. A nossa legislação está parada nos anos 90, quando houve uma certa histeria neoliberal no país, que significou, entre outras coisas, a retirada de muitos mecanismos de controle. Nós procuramos enfrentar esse problema junto com o Poder Judiciário. O Conselho Nacional de Justiça tem baixado portarias orientando os cartórios a pelo menos não fazer registros de novas compras de propriedades antes de informar o Incra. Precisamos avançar no sentido de limitar esse tipo de compra. Trata-se de um assunto ligado à soberania e à segurança nacional. Não há nenhuma xenofobia aí. Não há nenhum problema em existir investimentos internacionais em determinados setores. Agora, ser dono da terra é outra coisa. O território brasileiro é um território finito e ele tem que ser, preferencialmente, para os brasileiros.
CARTA MAIOR: E sobre o futuro, quais devem ser as prioridades do MDA para os próximos anos?
GUILHERME CASSSEL: O Brasil precisa discutir de forma mais clara – o que não tem ocorrido nos últimos anos – qual é o papel do rural no seu projeto de desenvolvimento. A gente costuma pensar o desenvolvimento principalmente a partir da indústria e dos serviços. Mas qual é o papel do rural? E que rural nós queremos? Um rural com gente ou sem gente? Eu acho que precisa ser um rural com gente e o primeiro passo para isso é mudar a estrutura fundiária do país. Precisamos ajustar índices de produtividade, precisamos criar mecanismos mais ágeis de desapropriação, discutir seriamente a questão do limite das propriedades...
CARTA MAIOR: Há espaço político para temas como o da revisão de índices de produtividade avançar? Até hoje, essa questão é totalmente barrada no Congresso pela bancada ruralista e seus aliados.
GUILHERME CASSEL: Acho que o Brasil está mudando e a correlação de forças no próximo período deve mudar também. Espero que as mudanças que ocorreram no meio rural acabem se refletindo também no plano político. Eu sou otimista sobre esse tema e acho que estamos caminhando para construir uma correlação de forças mais equilibrada e retomar um ambiente de discussão menos maniqueísta. Qualquer país desenvolvido na história contemporânea discutiu a reforma agrária, a questão do limite das propriedades, da função social da terra. Esses temas ainda são muito contaminados no Brasil. Eles precisam ser descontaminados e debatidos com mais equilíbrio. É uma condição necessária para o país crescer de modo mais harmônico e equilibrado.
No terreno da política agrícola, acho que somos exemplares do ponto de vista de crédito, de seguro e de assistência técnica, mas ainda precisamos avançar bastante em garantia de renda e de preço para os agricultores e também na questão do cooperativismo de produção.
Uma velha história
Nos anos 80, a luta contra a violência contribuiu para fortalecer e consolidar o feminismo no Brasil. As mortes de Ângela Diniz (1979) e de Eliane de Gramond (1981) por seus ex-maridos chocaram o Brasil. Eram mulheres que puseram fim a seus casamentos, e, além da brutalidade dos assassinatos, os dois casos envolviam pessoas conhecidas da opinião pública, o que lhes conferiu ainda mais “notoriedade”.
"Quem ama não mata" era a resposta dada pelas feministas àqueles que sugeriam que os homens matavam “por amor”.
Mas não tardou a tentativa de transformar as vítimas em rés, “compreendendo” o criminoso, que teria “perdido a cabeça” por ação delas. Organizadas, as mulheres repudiaram o machismo que levou Ângela e Eliane à morte, e que, depois, buscou incessantemente justificar essas mortes com base na conduta das vítimas. A tal defesa da honra era reivindicada. O movimento de mulheres não se calou e colocou em questão as insígnias do "em briga de marido e mulher, ninguém mete a colher" ou a ideia de que "um tapinha não doi".
O tempo passou e, em 2000, a própria mídia foi pano de fundo para um crime análogo. A jornalista Sandra Gomide foi morta pelo ex-namorado, Pimenta Neves, então diretor de redação de O Estado de São Paulo. O assassinato aconteceu precisamente porque o namoro acabou. Por conta disso, ela sofreu agressões físicas e verbais, perdeu seu emprego, foi perseguida. Neves chegou a ameaçar de retaliações qualquer pessoa que oferecesse trabalho a Sandra. Pela mídia, a moça chegou a ser tratada como "aquela que namorou com o chefe para subir na vida".
Em 2008, outro episódio de violência contra mulher gerou comoção nacional. Eloá Pimentel, com seus 15 anos, praticamente foi assassinada ao vivo e em rede nacional pelo ex-namorado, que a sequestrou e a manteve em cativeiro por cinco dias. A agonia da menina foi acompanhada em tempo real, e ao se tornar a personagem central de uma história dramática, ela, como as já citadas, teve sua vida exposta e sua conduta julgada, apresentada como principal fundamento do comportamento agressivo de seu assassino.
Há poucos meses, a vítima foi Maria Islaine, cabelereira, morta pelo ex-marido diante de câmeras que ela mesma mandou instalar no salão onde trabalhava, julgando que essa atitude a protegeria da violência anunciada. Dias atrás, tivemos a infelicidade de testemunhar o advogado do assassino defendendo seu cliente com o bom e velho “ela provocou”.
Eliza e Mércia
Agora, a mídia tem apresentado as histórias de Eliza Samudio e de Mércia Nakashima como se fossem romances policiais. Convida-nos a acompanhar cada momento, provoca comoção, sugere respostas, vasculha a vida das mulheres mortas e as expõe a julgamento público, sem direito de defesa. A tragédia é exaustivamente explorada, e no final, a lição que fica é: elas procuraram.
Mércia morreu, aparentemente, porque rejeitou seu ex-namorado. Cometeu o desaconselhável equívoco de querer sua vida para si mesma, de não aceitar perseguições, sanções ou intimidações. Entretanto, tem-se falado em traição e ciúmes. E lá vem, de novo, a conversa fiada da defesa da honra. Mas é Mércia quem não está mais aqui para defender a sua.
De Eliza, disse-se de tudo: maria-chuteira, garota de programa, abusada, oportunista. Acontece que não importa. Não importa se ela foi garota de programa, se era advogada, modelo, atriz, estudante ou deputada. Ela está morta. E morreu, aparentemente, porque o pai de seu filho não queria arcar com as obrigações legais e éticas de tê-la engravidado.
Ela nunca vai poder se defender das acusações póstumas. Não vai ao “Superpop” defender sua versão ou sua história. Não vai estampar a capa de “Contigo”, acompanhada de frases de impacto entre aspas. Ela está morta, e o que ela fez ou deixou de fazer, pouco importa agora. E seria prudente, inclusive, evitar julgá-la pelo crime que a matou.
Mais uma vez, a história se repete. Mulheres são mortas por homens com quem se envolveram. Assassinos frios, esses homens tiraram a vida de mulheres confiando na impunidade, porque há quem os “compreenda”. A morte de Eliza e de Mércia parece ter sido calculada e premeditada. E mesmo assim, segue ecoando a ideia de que a culpa é delas, que elas procuraram, que elas provocaram.
O espetáculo da morte
Infelizmente, histórias como as de Eliza, Mércia, Eloá, Maria, Sandra, Ângela e Eliane são muito mais comuns do que se imagina. E antes de culminar em assassinato, outras formas de violência foram praticadas contra cada uma delas, como acontece com muitas – as que morrem e as que se salvam.
A espetacularização promovida pela mídia, no entanto, faz parecer que são histórias ímpares e distantes do cotidiano da vida real. Como se o perigo não morasse ao lado, como se muitas não dormissem com o inimigo. Na sua família, na sua vizinhança, no seu local de trabalho, no seu círculo de amigos, certamente há casos de violência contra mulheres, e certamente você ouviu falar de pelo menos um deles. Em recente levantamento, a ONG Centro pelo Direito à Moradia contra Despejos apontou que uma mulher é agredida a cada 15 segundos no Brasil, e uma em cada quatro afirma já ter sofrido violência. Há que se considerar também que existem as que não afirmam – por medo ou vergonha.
Essas mulheres não são co-autoras de seu assassinato. É recorrente a trama montada para torná-las rés, para justificar suas mortes nas ações delas mesmas, para tolerar a violência. “Que sirvam de exemplo”, parece que dizem.
Num mundo em que a desigualdade entre mulheres e homens se expressa visivelmente desde na divisão das tarefas domésticas até no controle dos corpos delas pela Igreja ou pelo Estado, passando pela realidade de violência e pela discriminação no mercado de trabalho ou por serem tratadas como objetos descartáveis na rua e na TV; ninguém pode dizer que não sabia; nem fazer piadinhas que celebram os casos. São mulheres de carne e osso, não são personagens de novela.
São cúmplices dessa violência todos os que a toleram ou que buscam subterfúgios no comportamento da vítima para declará-la culpada por sua própria morte. São cúmplices silenciosos, igualmente, aqueles que fingem que machismo, discriminação e opressão são peças de ficção.
* Alessandra Terribili,
"Quem ama não mata" era a resposta dada pelas feministas àqueles que sugeriam que os homens matavam “por amor”.
Mas não tardou a tentativa de transformar as vítimas em rés, “compreendendo” o criminoso, que teria “perdido a cabeça” por ação delas. Organizadas, as mulheres repudiaram o machismo que levou Ângela e Eliane à morte, e que, depois, buscou incessantemente justificar essas mortes com base na conduta das vítimas. A tal defesa da honra era reivindicada. O movimento de mulheres não se calou e colocou em questão as insígnias do "em briga de marido e mulher, ninguém mete a colher" ou a ideia de que "um tapinha não doi".
O tempo passou e, em 2000, a própria mídia foi pano de fundo para um crime análogo. A jornalista Sandra Gomide foi morta pelo ex-namorado, Pimenta Neves, então diretor de redação de O Estado de São Paulo. O assassinato aconteceu precisamente porque o namoro acabou. Por conta disso, ela sofreu agressões físicas e verbais, perdeu seu emprego, foi perseguida. Neves chegou a ameaçar de retaliações qualquer pessoa que oferecesse trabalho a Sandra. Pela mídia, a moça chegou a ser tratada como "aquela que namorou com o chefe para subir na vida".
Em 2008, outro episódio de violência contra mulher gerou comoção nacional. Eloá Pimentel, com seus 15 anos, praticamente foi assassinada ao vivo e em rede nacional pelo ex-namorado, que a sequestrou e a manteve em cativeiro por cinco dias. A agonia da menina foi acompanhada em tempo real, e ao se tornar a personagem central de uma história dramática, ela, como as já citadas, teve sua vida exposta e sua conduta julgada, apresentada como principal fundamento do comportamento agressivo de seu assassino.
Há poucos meses, a vítima foi Maria Islaine, cabelereira, morta pelo ex-marido diante de câmeras que ela mesma mandou instalar no salão onde trabalhava, julgando que essa atitude a protegeria da violência anunciada. Dias atrás, tivemos a infelicidade de testemunhar o advogado do assassino defendendo seu cliente com o bom e velho “ela provocou”.
Eliza e Mércia
Agora, a mídia tem apresentado as histórias de Eliza Samudio e de Mércia Nakashima como se fossem romances policiais. Convida-nos a acompanhar cada momento, provoca comoção, sugere respostas, vasculha a vida das mulheres mortas e as expõe a julgamento público, sem direito de defesa. A tragédia é exaustivamente explorada, e no final, a lição que fica é: elas procuraram.
Mércia morreu, aparentemente, porque rejeitou seu ex-namorado. Cometeu o desaconselhável equívoco de querer sua vida para si mesma, de não aceitar perseguições, sanções ou intimidações. Entretanto, tem-se falado em traição e ciúmes. E lá vem, de novo, a conversa fiada da defesa da honra. Mas é Mércia quem não está mais aqui para defender a sua.
De Eliza, disse-se de tudo: maria-chuteira, garota de programa, abusada, oportunista. Acontece que não importa. Não importa se ela foi garota de programa, se era advogada, modelo, atriz, estudante ou deputada. Ela está morta. E morreu, aparentemente, porque o pai de seu filho não queria arcar com as obrigações legais e éticas de tê-la engravidado.
Ela nunca vai poder se defender das acusações póstumas. Não vai ao “Superpop” defender sua versão ou sua história. Não vai estampar a capa de “Contigo”, acompanhada de frases de impacto entre aspas. Ela está morta, e o que ela fez ou deixou de fazer, pouco importa agora. E seria prudente, inclusive, evitar julgá-la pelo crime que a matou.
Mais uma vez, a história se repete. Mulheres são mortas por homens com quem se envolveram. Assassinos frios, esses homens tiraram a vida de mulheres confiando na impunidade, porque há quem os “compreenda”. A morte de Eliza e de Mércia parece ter sido calculada e premeditada. E mesmo assim, segue ecoando a ideia de que a culpa é delas, que elas procuraram, que elas provocaram.
O espetáculo da morte
Infelizmente, histórias como as de Eliza, Mércia, Eloá, Maria, Sandra, Ângela e Eliane são muito mais comuns do que se imagina. E antes de culminar em assassinato, outras formas de violência foram praticadas contra cada uma delas, como acontece com muitas – as que morrem e as que se salvam.
A espetacularização promovida pela mídia, no entanto, faz parecer que são histórias ímpares e distantes do cotidiano da vida real. Como se o perigo não morasse ao lado, como se muitas não dormissem com o inimigo. Na sua família, na sua vizinhança, no seu local de trabalho, no seu círculo de amigos, certamente há casos de violência contra mulheres, e certamente você ouviu falar de pelo menos um deles. Em recente levantamento, a ONG Centro pelo Direito à Moradia contra Despejos apontou que uma mulher é agredida a cada 15 segundos no Brasil, e uma em cada quatro afirma já ter sofrido violência. Há que se considerar também que existem as que não afirmam – por medo ou vergonha.
Essas mulheres não são co-autoras de seu assassinato. É recorrente a trama montada para torná-las rés, para justificar suas mortes nas ações delas mesmas, para tolerar a violência. “Que sirvam de exemplo”, parece que dizem.
Num mundo em que a desigualdade entre mulheres e homens se expressa visivelmente desde na divisão das tarefas domésticas até no controle dos corpos delas pela Igreja ou pelo Estado, passando pela realidade de violência e pela discriminação no mercado de trabalho ou por serem tratadas como objetos descartáveis na rua e na TV; ninguém pode dizer que não sabia; nem fazer piadinhas que celebram os casos. São mulheres de carne e osso, não são personagens de novela.
São cúmplices dessa violência todos os que a toleram ou que buscam subterfúgios no comportamento da vítima para declará-la culpada por sua própria morte. São cúmplices silenciosos, igualmente, aqueles que fingem que machismo, discriminação e opressão são peças de ficção.
* Alessandra Terribili,
Despencando nas pesquisas, Serra parte para baixaria
O candidato à presidência pelo PSDB, José Serra, reafirmou nesta quinta-feira (22), durante entrevista à Rádio Guaíba, que o PT é ligado às Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) e qualificou o grupo guerrilheiro como "sequestradores, terroristas, que cortam cabeça de gente e que fazem o narcotráfico". Quando perguntado sobre a suposta relação PT-Farc, o tucano declarou: "eles fazem piquenique". Conforme matéria publicada no Portal terra
Depois, em entrevista a TV Brasil, José Serra, disse que não é candidato oposicionista ao governo Lula;"Não sou candidato da oposição. Sou do 'pode mais' e 'dá pra fazer'", declarou.Ao ser questionado sobre o apoio dado a ele pelo candidato do PSC ao governo do Distrito Federal, Joaquim Roriz, alvo de pedidos de impugnação por pendências judiciais e sob o risco de ser impedido de disputar por corrupção e pode ser incluído nas restrições da lei da Ficha Limpa, Serra disse que a candidata Dilma Rousseff, tem mais "más companhias que ele"
Depois de declaração tão inteligente do Serra, o marqueteiro da campanha tucana vai ter um enfarto. O candidato José Serra está com uma missão inusitada... fazer a campanha de um oposicionista, que não é oposicionista e que assume andar em más companhias, mas que seriam em menor número que as da opositora, que não é opositora no caso, já que ele não diz que não é oposicionista do governo
O palanque do Serra foi montado com gente que 'prima pelo cuidado com a coisa pública, verdadeiros baluartes da defesa da ética': Roriz, Maluf, Quércia, Roberto Jefferson, Arthur 'réu confesso' Virgílio, Yeda Crusius, Arruda (o ex-vice preferido do Serra), Paulo Octávio, Leonardo Prudente, Efraim Moraes, Cássio Taniguchi, Rodrigo 'mensalão do DF' Maia, Leonel Pavan e outras 'Boas companhias' estão com Serra . Pois é, em matéria de 'arautos da moralidade', o palanque do Serra é imbatível!
Pânico na oposição
Ainda é cedo para começar a se definir o vencedor do pleito presidencial deste ano, mas os resultados das últimas pesquisas já colocaram os tucanos e seus aliados em estado de alerta. Mais do que isso: em pânico. Eles não imaginavam uma mudança tão rápida no cenário eleitoral,Dilma a frente de Serra. Os tucanos estão desesperados, ora chama Dilma para o debate, ora ataca Dilma. Serra não tem proposta, tão tem vice e não tem programa de governo. Prefere seguir a lei Regina Duarte, a do medo. Mas, esquece que diferente de outras épocas eleitoral em que os cidadãos contava apenas com notícias da imprensa tucana, neste ano, o povo pode contar com a internet e os blogs para desmacarar suas mentiras
Depois, em entrevista a TV Brasil, José Serra, disse que não é candidato oposicionista ao governo Lula;"Não sou candidato da oposição. Sou do 'pode mais' e 'dá pra fazer'", declarou.Ao ser questionado sobre o apoio dado a ele pelo candidato do PSC ao governo do Distrito Federal, Joaquim Roriz, alvo de pedidos de impugnação por pendências judiciais e sob o risco de ser impedido de disputar por corrupção e pode ser incluído nas restrições da lei da Ficha Limpa, Serra disse que a candidata Dilma Rousseff, tem mais "más companhias que ele"
Depois de declaração tão inteligente do Serra, o marqueteiro da campanha tucana vai ter um enfarto. O candidato José Serra está com uma missão inusitada... fazer a campanha de um oposicionista, que não é oposicionista e que assume andar em más companhias, mas que seriam em menor número que as da opositora, que não é opositora no caso, já que ele não diz que não é oposicionista do governo
O palanque do Serra foi montado com gente que 'prima pelo cuidado com a coisa pública, verdadeiros baluartes da defesa da ética': Roriz, Maluf, Quércia, Roberto Jefferson, Arthur 'réu confesso' Virgílio, Yeda Crusius, Arruda (o ex-vice preferido do Serra), Paulo Octávio, Leonardo Prudente, Efraim Moraes, Cássio Taniguchi, Rodrigo 'mensalão do DF' Maia, Leonel Pavan e outras 'Boas companhias' estão com Serra . Pois é, em matéria de 'arautos da moralidade', o palanque do Serra é imbatível!
Pânico na oposição
Ainda é cedo para começar a se definir o vencedor do pleito presidencial deste ano, mas os resultados das últimas pesquisas já colocaram os tucanos e seus aliados em estado de alerta. Mais do que isso: em pânico. Eles não imaginavam uma mudança tão rápida no cenário eleitoral,Dilma a frente de Serra. Os tucanos estão desesperados, ora chama Dilma para o debate, ora ataca Dilma. Serra não tem proposta, tão tem vice e não tem programa de governo. Prefere seguir a lei Regina Duarte, a do medo. Mas, esquece que diferente de outras épocas eleitoral em que os cidadãos contava apenas com notícias da imprensa tucana, neste ano, o povo pode contar com a internet e os blogs para desmacarar suas mentiras
O OURO DE WASHINGTON
Sob total silêncio dos meios de comunicação conservadores brasileiros, foi divulgada a informação oficial segundo a qual veículos de imprensa e jornalistas venezuelanos receberam mais de quatro milhões de dólares nos últimos dois anos. Objetivo: desestabilizar o governo da República Bolivariana da Venezuela. A Lei de Acesso à Informação permitiu a divulgação de documentos do Departamento de Estado norte-americano. A grana foi distribuída através de três entidades públicas estadunidenses, a Fundação Panamericana para o Desenvolvimento, a Freedom House e a Agência de Desenvolvimento Internacional dos Estados Unidos (Usaid).
Mas a documentação não foi totalmente liberada, pois o Departamento de Estado censurou a maioria dos nomes das organizações e jornalistas contemplados com o ouro de Washington. É isso aí, não tem mais ouro de Moscou, de Pequim ou de qualquer outra capital de país socialista, como "informavam" os jornalões na época da Guerra Fria. Mas o ouro de Washington continua a ser distribuído em vários quadrantes do planeta com o objetivo de desestabilizar governos que contestem a dominação da potência hegemônica.
Nesta etapa, a distribuição das benesses ficou a critério de organizações venezuelanas Espaço Público e Instituto de Imprensa, segundo ainda os documentos do Departamento de Estado norte-americano. Ou seja, não há dúvidas de que as campanhas antichavistas renderam bons frutos($) para grupos que há anos tentam de todas as formas impedir o aprofundamento da revolução bolivariana.
Tendo em vista tais fatos, não será surpresa alguma se amanhã novos documentos do Departamento de Estado mostrarem que em outros países, inclusive nas plagas abençoadas por Deus e bonitas por natureza, o ouro de Washington segue rolando com toda a intensidade. Quem acompanha os noticiários de televisão e os colunistas de sempre desconfia que o ouro de Washington recheie os bolsos dos referidos. Mas qualquer problema, a Sociedade Interamericana de Imprensa está aí para isso mesmo, ou seja, defender incondicionalmente as organizações midiáticas e jornalistas que venham eventualmente a ser denunciados por recebimento de polpudas verbas.
Já que estamos falando em meios de comunicação conservadores, mais uma vez O Globo se superou. Com o maior destaque, o jornal da família Marinho dizia, na primeira página do caderno de economia, em referência ao desastre provocado pela British Petróleo (BP) no Golfo do México, que o Brasil remava contra a maré mundial ao continuar prospectando petróleo em alto mar. O Globo quer porque quer que as reservas do pré-sal continuem intactas, pois em outras partes do mundo, inclusive nos Estados Unidos, as prospecções foram suspensas.
O jornal que historicamente sempre defendeu poderosos interesses internacionais, seja da área petrolífera ou financeira, preferiu ignorar as denúncias segundo as quais o desastre ecológico no Golfo do México se deveu basicamente ao fato de a BP ter tentado economizar na procura do petróleo em alto mar. Por aqui, quer queira ou não O Globo, a questão é outra, a tecnologia desenvolvida no setor é de alta qualidade. Não se poupa nas pesquisas, que no caso do pré-sal começaram há anos.
A propósito de manipulação de informação, não é de hoje que o MST vem sendo criminalizado por publicações conservadoras vinculadas ao agronegócio. Há oito meses, por exemplo, foi feito o maior escarcéu (por pressão da bancada ruralista), sobre supostas irregularidades relacionadas com verbas públicas e o MST. Pois bem, uma CPMI (Comissão Parlamentar de Inquérito da Câmara e Senado) conclui seu relatório com a informação segundo a qual não há nenhuma irregularidade na conta do movimento que luta pela reforma agrária. Essa foi a terceira CPI do gênero sobre o MST.
Mas se os leitores imaginam que a manipulação midiática terminou, não devem se iludir. Daqui mais algumas semanas, a mesma bancada ruralista vai pressionar no sentido de que seja criada mais uma CPI, pois a de agora "terminou em pizza". E os setores conservadores, aglutinados em torno do candidato de FHC, José Serra, vão aproveitar a campanha presidencial para atacar.
Em suma: verbas do Departamento de Estado norte-americano, criminalização do MST e muitos outros fatos fazem parte do mesmo jogo que tem como pano de fundo a necessidade de manter o Brasil e a América Latina como um mero quintal ou pátio traseiro dos Estados Unidos. Veja, O Globo, TV Globo, Folha de S. Paulo, O Estado de S.Paulo estão aí para isso mesmo.
De Mario Augusto Jakobskind
Mas a documentação não foi totalmente liberada, pois o Departamento de Estado censurou a maioria dos nomes das organizações e jornalistas contemplados com o ouro de Washington. É isso aí, não tem mais ouro de Moscou, de Pequim ou de qualquer outra capital de país socialista, como "informavam" os jornalões na época da Guerra Fria. Mas o ouro de Washington continua a ser distribuído em vários quadrantes do planeta com o objetivo de desestabilizar governos que contestem a dominação da potência hegemônica.
Nesta etapa, a distribuição das benesses ficou a critério de organizações venezuelanas Espaço Público e Instituto de Imprensa, segundo ainda os documentos do Departamento de Estado norte-americano. Ou seja, não há dúvidas de que as campanhas antichavistas renderam bons frutos($) para grupos que há anos tentam de todas as formas impedir o aprofundamento da revolução bolivariana.
Tendo em vista tais fatos, não será surpresa alguma se amanhã novos documentos do Departamento de Estado mostrarem que em outros países, inclusive nas plagas abençoadas por Deus e bonitas por natureza, o ouro de Washington segue rolando com toda a intensidade. Quem acompanha os noticiários de televisão e os colunistas de sempre desconfia que o ouro de Washington recheie os bolsos dos referidos. Mas qualquer problema, a Sociedade Interamericana de Imprensa está aí para isso mesmo, ou seja, defender incondicionalmente as organizações midiáticas e jornalistas que venham eventualmente a ser denunciados por recebimento de polpudas verbas.
Já que estamos falando em meios de comunicação conservadores, mais uma vez O Globo se superou. Com o maior destaque, o jornal da família Marinho dizia, na primeira página do caderno de economia, em referência ao desastre provocado pela British Petróleo (BP) no Golfo do México, que o Brasil remava contra a maré mundial ao continuar prospectando petróleo em alto mar. O Globo quer porque quer que as reservas do pré-sal continuem intactas, pois em outras partes do mundo, inclusive nos Estados Unidos, as prospecções foram suspensas.
O jornal que historicamente sempre defendeu poderosos interesses internacionais, seja da área petrolífera ou financeira, preferiu ignorar as denúncias segundo as quais o desastre ecológico no Golfo do México se deveu basicamente ao fato de a BP ter tentado economizar na procura do petróleo em alto mar. Por aqui, quer queira ou não O Globo, a questão é outra, a tecnologia desenvolvida no setor é de alta qualidade. Não se poupa nas pesquisas, que no caso do pré-sal começaram há anos.
A propósito de manipulação de informação, não é de hoje que o MST vem sendo criminalizado por publicações conservadoras vinculadas ao agronegócio. Há oito meses, por exemplo, foi feito o maior escarcéu (por pressão da bancada ruralista), sobre supostas irregularidades relacionadas com verbas públicas e o MST. Pois bem, uma CPMI (Comissão Parlamentar de Inquérito da Câmara e Senado) conclui seu relatório com a informação segundo a qual não há nenhuma irregularidade na conta do movimento que luta pela reforma agrária. Essa foi a terceira CPI do gênero sobre o MST.
Mas se os leitores imaginam que a manipulação midiática terminou, não devem se iludir. Daqui mais algumas semanas, a mesma bancada ruralista vai pressionar no sentido de que seja criada mais uma CPI, pois a de agora "terminou em pizza". E os setores conservadores, aglutinados em torno do candidato de FHC, José Serra, vão aproveitar a campanha presidencial para atacar.
Em suma: verbas do Departamento de Estado norte-americano, criminalização do MST e muitos outros fatos fazem parte do mesmo jogo que tem como pano de fundo a necessidade de manter o Brasil e a América Latina como um mero quintal ou pátio traseiro dos Estados Unidos. Veja, O Globo, TV Globo, Folha de S. Paulo, O Estado de S.Paulo estão aí para isso mesmo.
De Mario Augusto Jakobskind
Como agem os canalhas e como agem pessoas de bem-2
O presidente do PSDB, senador Sérgio Guerra (PE), disse à Folha que as Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia) são um “sócio incômodo” do PT. “O Indio disse o que a gente sabe: as Farc se sustentam com dinheiro do narcotráfico, e o PT é ligado às Farc. É um sócio incômodo que o PT tem”, afirmou o presidente tucano.
Se eu seguir o raciocínio desqualificado do senador Guerra, poderia afirmar o seguinte: “todo mundo sabe que o ex-governador José Roberto Arruda se locupletava com o dinheiro da corrupção, e José Serra era ligadíssimo a Arruda. É um sócio incômodo que o José Serra tem”.
Repito o que fiz no post anterior. Se a lógica acusatória do PSDB serve para atacar seus adversários, deve servir também para si mesmo, não é?
Então, estaríamos livres para dizer que Serra tem envolvimento com o “panetone” arrudista?
É esse o nível a que desceu o tucanato. A lama está se tornando universal. Logo vamos ver gente desembarcando desta canoa.
Como agem os canalhas e como agem pessoas de bem
segunda-feira, 19 julho, 2010 às 22:38
O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso defende publicamente a legalização da maconha como forma de superar o problema da criminalidade ligada ao narcotráfico. Concorde-se ou discorde-se dele, isso não dá a ninguém, exceto a quem seja um crápula, o direito de dizer que o ex-presidente é ligado ao uso de drogas. Seria uma infâmia, uma calúnia, um ato odioso.
Se o PT e outras forças políticas defenderam ou defendem a negociação com o movimento guerrilheiro das FARC como forma de superar os impasses políticos que, há décadas, consomem vastas áreas da Colômbia, isso igualmente não dá a ninguém o direito de dizer que, por isso, são ligados ao terrorismo. É uma mentira infamante, um ato de oportunismo tão grande quanto o que se apontou no parágrafo anterior.
Basta essa comparação para que se julgue o ato do Sr. José Serra. Ele, como fez antes o seu vice Da Costa, fugiram do que foi afirmado com todas as letras no que está gravado em vídeo – dizer que o PT é “ligado ao narcotráfico” – e ficar na afirmação de que é ligado às FARC. Uma “emenda” covarde e vaga o suficiente para servir de argumento para buscar escapar de uma condenação criminal por calúnia.
Afinal, ser “ligado às Farc” quer dizer o que? Defender uma solução negociada para a crise da guerrilha colombiana e a pacificação do país?
Se for assim, José Serra poderia afirmar também que o seu antigo chefe é ligado às drogas, por defender a legalização parcial de seu comércio, para obter uma redução no crime ligado ao tráfico ilegal.
Em um caso como o outro, o comportamento moral, se o fizesse, seria vergonhoso como é o que tem hoje.
Se eu seguir o raciocínio desqualificado do senador Guerra, poderia afirmar o seguinte: “todo mundo sabe que o ex-governador José Roberto Arruda se locupletava com o dinheiro da corrupção, e José Serra era ligadíssimo a Arruda. É um sócio incômodo que o José Serra tem”.
Repito o que fiz no post anterior. Se a lógica acusatória do PSDB serve para atacar seus adversários, deve servir também para si mesmo, não é?
Então, estaríamos livres para dizer que Serra tem envolvimento com o “panetone” arrudista?
É esse o nível a que desceu o tucanato. A lama está se tornando universal. Logo vamos ver gente desembarcando desta canoa.
Como agem os canalhas e como agem pessoas de bem
segunda-feira, 19 julho, 2010 às 22:38
O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso defende publicamente a legalização da maconha como forma de superar o problema da criminalidade ligada ao narcotráfico. Concorde-se ou discorde-se dele, isso não dá a ninguém, exceto a quem seja um crápula, o direito de dizer que o ex-presidente é ligado ao uso de drogas. Seria uma infâmia, uma calúnia, um ato odioso.
Se o PT e outras forças políticas defenderam ou defendem a negociação com o movimento guerrilheiro das FARC como forma de superar os impasses políticos que, há décadas, consomem vastas áreas da Colômbia, isso igualmente não dá a ninguém o direito de dizer que, por isso, são ligados ao terrorismo. É uma mentira infamante, um ato de oportunismo tão grande quanto o que se apontou no parágrafo anterior.
Basta essa comparação para que se julgue o ato do Sr. José Serra. Ele, como fez antes o seu vice Da Costa, fugiram do que foi afirmado com todas as letras no que está gravado em vídeo – dizer que o PT é “ligado ao narcotráfico” – e ficar na afirmação de que é ligado às FARC. Uma “emenda” covarde e vaga o suficiente para servir de argumento para buscar escapar de uma condenação criminal por calúnia.
Afinal, ser “ligado às Farc” quer dizer o que? Defender uma solução negociada para a crise da guerrilha colombiana e a pacificação do país?
Se for assim, José Serra poderia afirmar também que o seu antigo chefe é ligado às drogas, por defender a legalização parcial de seu comércio, para obter uma redução no crime ligado ao tráfico ilegal.
Em um caso como o outro, o comportamento moral, se o fizesse, seria vergonhoso como é o que tem hoje.
Como agem os canalhas e como agem pessoas de bem
O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso defende publicamente a legalização da maconha como forma de superar o problema da criminalidade ligada ao narcotráfico. Concorde-se ou discorde-se dele, isso não dá a ninguém, exceto a quem seja um crápula, o direito de dizer que o ex-presidente é ligado ao uso de drogas. Seria uma infâmia, uma calúnia, um ato odioso.
Se o PT e outras forças políticas defenderam ou defendem a negociação com o movimento guerrilheiro das FARC como forma de superar os impasses políticos que, há décadas, consomem vastas áreas da Colômbia, isso igualmente não dá a ninguém o direito de dizer que, por isso, são ligados ao terrorismo. É uma mentira infamante, um ato de oportunismo tão grande quanto o que se apontou no parágrafo anterior.
Basta essa comparação para que se julgue o ato do Sr. José Serra. Ele, como fez antes o seu vice Da Costa, fugiram do que foi afirmado com todas as letras no que está gravado em vídeo – dizer que o PT é “ligado ao narcotráfico” – e ficar na afirmação de que é ligado às FARC. Uma “emenda” covarde e vaga o suficiente para servir de argumento para buscar escapar de uma condenação criminal por calúnia.
Afinal, ser “ligado às Farc” quer dizer o que? Defender uma solução negociada para a crise da guerrilha colombiana e a pacificação do país?
Se for assim, José Serra poderia afirmar também que o seu antigo chefe é ligado às drogas, por defender a legalização parcial de seu comércio, para obter uma redução no crime ligado ao tráfico ilegal.
Em um caso como o outro, o comportamento moral, se o fizesse, seria vergonhoso como é o que tem hoje.
Se o PT e outras forças políticas defenderam ou defendem a negociação com o movimento guerrilheiro das FARC como forma de superar os impasses políticos que, há décadas, consomem vastas áreas da Colômbia, isso igualmente não dá a ninguém o direito de dizer que, por isso, são ligados ao terrorismo. É uma mentira infamante, um ato de oportunismo tão grande quanto o que se apontou no parágrafo anterior.
Basta essa comparação para que se julgue o ato do Sr. José Serra. Ele, como fez antes o seu vice Da Costa, fugiram do que foi afirmado com todas as letras no que está gravado em vídeo – dizer que o PT é “ligado ao narcotráfico” – e ficar na afirmação de que é ligado às FARC. Uma “emenda” covarde e vaga o suficiente para servir de argumento para buscar escapar de uma condenação criminal por calúnia.
Afinal, ser “ligado às Farc” quer dizer o que? Defender uma solução negociada para a crise da guerrilha colombiana e a pacificação do país?
Se for assim, José Serra poderia afirmar também que o seu antigo chefe é ligado às drogas, por defender a legalização parcial de seu comércio, para obter uma redução no crime ligado ao tráfico ilegal.
Em um caso como o outro, o comportamento moral, se o fizesse, seria vergonhoso como é o que tem hoje.
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