segunda-feira, 9 de maio de 2011

Sem veneno e sem patrão

O Assentamento 17 de abril completa 15 anos de existência, sendo umas das mais emblemáticas conquistas do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Os sobreviventes do massacre que ocorreu na curva do S, em Eldorado dos Carajás, no dia 17 de abril de 1996, marcharam e resistiram no local em que hoje está o assentamento.

Se a conquista da terra custou vidas e sequelas graves, o modo como o assentamento desenvolveu-se tornou-se modelo. Em um município dominado pelas grandes fazendas-empresa, caracterizadas pelo desmatamento em prol da agropecuária, o assentamento representa hoje um certo equilíbrio para o abastecimento de alimentação para a cidade.

O povo paraense já sente na mesa da refeição o tratamento desigual dado à agricultura camponesa, comparado ao agronegócio e à monocultura das grandes fazendas. “O segundo maior estado da federação, em extensão de terras, não assegurou ainda sua soberania alimentar. Hoje compra arroz e feijão de Tocantins, Goiás e até São Paulo”, afirma Raimundo Oliveira, líder do PT no sudeste do Pará.

Embora a agricultura camponesa esteja em segundo plano, é responsável por 70% de alimentos consumidos no país, segundo dados do Ministério de Desenvolvimento Agrário (MDA).

Dados da prefeitura de Eldorado dos Carajás confirmam a importância do assentamento 17 de abril para a cidade, pois possui o maior número de agricultores da região, abastecendo cerca de 20% total do mercado local. O frango, o milho e a mandioca são os produtos mais escoados para a cidade.

A produção de leite também é expressiva. Segundo a prefeitura, de 15 a 20 mil litros de leite são ordenhados por dia, o que representa a média da produção nacional. Além da apicultura, que manda à cidade mais de 200 quilos de mel anualmente. Há também um criadouro com 25 mil peixes.



Diversidade orgânica

Para Altamiro Simplicio da Silva, tudo que se planta “nas terras do assentamento, se colhe”. Em seus 25 hectares, planta milho, cupuaçu, jiló, berinjela, coco, repolho, abóbora, cenoura, alface, beterraba, pimentão, mamão, arroz e caju. “Seu” Altamiro é o maior produtor de cacau na região. Em 2010, colheu 2,5 mil quilos da fruta.


Com uma renda mensal em torno de R$ 6 mil e R$ 7 mil , o agricultor afirma não utilizar nenhum fertilizante, herbicida ou veneno. “Eu mesmo faço tudo, com o esterco de galinha, de boi e com as folhas secas. Além da produção diversificada, que ajuda a proteger contra pragas, economizo dinheiro e não enveneno meus alimentos”, relata.

O agrônomo e assentado Alessandro dos Santos Silva diz que é uma prática dos agricultores não utilizar venenos em suas plantações e diversificar ao máximo, assim como ele que planta milho, melancia, mandioca, tem um criadouro de peixe, e ainda possui gados leiteiros.



Subsistência

Hoje, cerca das 700 famílias que vivem nos 37 mil hectares do assentamento, têm seus ganhos de diferentes maneiras. Jeová Cavalcanti, o segundo cadastrado para conseguir um lote na então fazenda Macaxeira, por exemplo, vive da venda do leite para a cidade, porém toda a alimentação de sua família é retirada do lote, onde planta arroz, maracujá, milho, feijão, abacate, goiaba, manga e limão, além de criar porco e galinha.”Dificilmente vou ao mercado na cidade comprar algo, pois daqui eu tiro tudo”.

Outro exemplo é Raimundo Silva. “Criei meus 13 filhos com o que plantei nesta terra”. Para o agrônomo Silva, essa é uma característica dos assentamentos. “As pessoas decidem o modo como querem viver e participam da vida política do local. Temos acesso às terras e ao seu meio de produção”. Criado no assentamento17 de abril, Silva reconhece que mesmo formado, não poderia discutir os rumos da produção agrônoma em uma fazenda “convencional”. “Viveria escravo de macroeconomia, decidida pelos que dominam a produção e a terra”, define.

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