quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Qualquer miserável tem preconceito

Em um vídeo que corre na internet, um miserável apresentador da RBS/TV Globo em Santa Catarina (foto) expressa miseráveis ideias, se assim podemos chamá-las sem faltar ao respeito ao adjetivo miserável e ao substantivo idéia. Suas pragas correm em um vídeo no YouTube, onde um animal raivoso vocifera, zurra, ao afirmar que a culpa do caos no trânsito se deve ao fato de que “hoje qualquer miserável tem um carro”.


E mais orneja, como se falasse: “o sujeito mora apertado numa gaiola,que hoje chamam de apartamento, não tem nenhuma qualidade de vida, mas tem um carro na garagem. E esse camarada casado, como não suporta a mulher dele, nem a mulher suporta ele, sai. Vão pra estrada. Vão se distrair, vão se divertir. E aí, inconscientemente, o cara quer compensar suas frustrações, com excesso de velocidade. Tem cabimento o camarada não vencer a curva? Como se curva fosse feita para vencer... Então é isso, estultícia, falta de respeito, frustração, casais que não se toleram, popularização do automóvel, resultado desse governo espúrio, que popularizou pelo crédito fácil o carro para quem nunca tinha lido um livro. É isso”.

É claro que nesse gênero de expressão ele não está só, como vimos nas últimas manifestações de preconceito contra nordestinos em São Paulo. A unificar tais coices avulta sempre um poderoso preconceito de classe. Salta aos olhos nos últimos tempos a raiva, a indignação da classe média frente aos novos consumidores de bens que ela julgava ser sua exclusividade. Pois os pobres, de repente, ao fim do governo Lula, danaram-se e começaram a entrar e sair dos aeroportos – “qualquer miserável hoje anda de avião”. De repente, acharam de jantar com a família nos restaurantes aos domingos – qualquer miserável hoje paga um jantar em restaurante bacana. Ousaram – suprema ousadia - comprar imóveis. Qualquer miserável hoje pode largar o pagamento do aluguel.

Com o resultado das últimas eleições, o Brasil que vem surgindo apenas atualiza o preconceito antigo contra as pessoas que os jornalistas teimam em chamar de “classes humildes”. Não faz muito, um desembargador paulista, aposentado, tentou ser humorista à custa dos excluídos da nossa harmoniosa sociedade de classes. Ele publicou um artigo que mais se devia chamar um termômetro moral da nossa elite, em que pôs o excelso título de “Pequeno dicionário da empregada doméstica”. Não viesse de quem veio, de um indivíduo que ocupou altos cargos na Justiça do país, de um, digamos, escritor, filiado à União Brasileira de Escritores, para maior vergonha da instituição, o artigo seria deitado ao limbo para o justo repouso no esquecimento.

Mas não. O elevado ex-homem público deu início ao, como dizê-lo?, ao ao ao, enfim, dizia-o:

“Foi por causa do Alfredo. Ele ligou para sua própria casa. A empregada era nova. Ele não a conhecia. Sua mulher, a Esther, digo (ou ele diz), dona Esther, tinha acabado de contratar. A moça era do norte. De Garanhuns. Nada contra, mas....sabe como é. Nós, brasileiros, sabemos! O Alfredo morava num sobrado. O telefone da residência ficava num nicho, embaixo da escada. No décimo segundo toque a Adamacena, a tal da empregada, atendeu: ‘Alonso!’ Na dúvida, o Alfredo perguntou: ‘De onde falam?’ Ao que a Adamacena respondeu: ‘Debaixo da escada!’ Foi aí que o Alfredo começou a catalogar as expressões da serviçal...”

E assim ele criou um “dicionário” das empregadas domésticas, para ser lido e gozado pelas classes cultas, do gênero e classe de juízes como ele. Naquela ocasião, esqueceu o desembargador de escrever um dicionário que traduzisse, por exemplo, expressões como “cártula chéquica, ergástulo público, peça increpatória” por algo mais simples como “folha de talão de cheques, cadeia e acusação’, respectivamente e nessa ordem, para ser mais pleonástico e preciso.

Manifestações, zombarias, ocorriam antes de 2010. Agora, após a eleição de Dilma, o riso virou zurro e fúria.

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