O Datafolha de sexta-feira, dia 4/12, veio a calhar. Não adiantava a pressão das ruas para que Alckmin percebesse que seu projeto de reorganização das escolas estaduais, além de controverso, não levou em conta um detalhe fundamental: o diálogo com a sociedade. Parece que teve que vir um alerta de alguém do campo conservador, no caso a referida empresa, para que o governador mudasse de estratégia e recuasse, ainda que taticamente, como acaba de fazer.
Como diz o velho ditado, de tanto uso o cachimbo entorta a boca. Os tucanos governam SP desde 1994. Ou, se quisermos recuar no tempo, desde 1982, quando ainda militavam no PMDB e chegaram ao Palácio dos Bandeirantes com Franco Montoro.
Nesses anos todos quase sempre tiveram maioria no Legislativo, aprovaram os projetos que quiseram e não tiveram o dissabor de lidar com CPIs incômodas. Foram pouco questionados pelo Judiciário e pela imprensa, com quem mantiveram ótimas relações nesse tempo todo. Nadaram de braçada em eleições recentes, onde passaram com tranquilidade pelos adversários, seja no 1º ou no 2º turnos.
Mas o que os tucanos parecem não ter entendido, e isso não é uma exclusividade deles, pois é visível em políticos de vários outros partidos, é que o Brasil está passando por uma sucessão geracional tremenda. Sim, é verdade que estamos nos tornando um país com maior expectativa de vida e que a cada década o número de idosos cresce na nossa sociedade.
Mas também é verdade que a garotada que está chegando agora na vida pública é bastante diferente daquela que lutou pela Anistia no fim dos anos 1970, pelas Diretas Já nos anos 1980, pelo impeachment de Collor no início dos anos 1990 ou que ajudou a levar Lula ao poder no início dos anos 2000.
Claro que não dá para generalizar o que seja a “juventude brasileira”. Nos protestos anti-Dilma se viu muita gente jovem empunhando bandeiras bastante conservadoras. Mas há uma parcela da garotada na qual vale prestar mais atenção. É gente que começa a ler o mundo e o espaço público de um jeito menos esquemático que as gerações anteriores, que não se pauta pelo ódio, que desconfia da imprensa e também dos partidos políticos tradicionais. É gente acostumada à horizontalidade dos grupos de discussão das redes sociais e que estranha a verticalidade bruta e tecnocrática do poder estatal.
É uma garotada, e isso é inédito, que tem acesso a uma gama muito maior de informações que seus pais e avós. E que por isso tem legitimidade dentro de casa para opinar sobre assuntos cuja decisão antes era restrita aos adultos. Uma geração, portanto, que clama por diálogo, respeito e democracia dentro de casa, no âmbito privado, e que obviamente vai demandar por tudo isso e muito mais na esfera pública.
Claro que as ocupações têm como motivo primeiro e fundamental o projeto de reorganização promovido pela Secretaria de Educação. Mas a questão de fundo, e isso será mortal para qualquer político ou gestor público que não entendê-la ou desprezá-la daqui pra frente é a demanda por diálogo.
Vivemos a democracia há 30 anos, e a essa altura do campeonato não dá mais para um gestor público achar que pode montar ou desmontar uma política pública a quatro paredes, isolado em seu gabinete, sem conversar com as ruas.
Por isso esse Datafolha foi fundamental para Alckmin: a continuar a repressão em cima de crianças e adolescentes que querem uma escola pública de qualidade e que querem sobretudo diálogo, Alckmin corre o risco de ver sua popularidade derreter, como derreteu a de seu colega de PSDB, Beto Richa. O governador do Paraná é hoje um político extremamente desgastado após ter mandado sua polícia baixar o pau em professores e demais servidores públicos.
Se não abrisse diálogo e continuasse com a mesma estratégia, Alckmin correria o risco de ver suas pretensões políticas virarem pó e ele passar para a História no mesmo patamar de popularidade que outros governadores paulistas, como Paulo Maluf, Orestes Quércia e Luís Antônio Fleury Filho. A sociedade brasileira está mudando. Até São Paulo, por muita gente tido como a fortaleza conservadora deste país, está. Como diria a velha canção de Elis, não adianta amar o passado. O novo sempre vem.
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