O Jornal Nacional esteve em Las Vegas, mas não encontrou a Vaincre LLC, uma das donas da Paraty House. Ao investigar a empresa, a PF pode chegar aos donos da mansão. Eles ocultaram patrimônio, crime do qual é acusado o ex-presidente Lula?
Documentos apreendidos pela Polícia Federal no “evento 26” da Operação Lava-Jato, a Triplo X, identificam quem está por trás de uma offshore que é dona da Paraty House e envolvem uma certa Paula Marinho Azevedo, que investigadores terão de determinar se se trata da filha de João Roberto Marinho, um dos controladores do Grupo Globo.
A apreensão foi feita na sede da empresa Mossack & Fonseca, na avenida Paulista, em São Paulo. A Mossack, do Panamá, é um dos maiores laranjais do mundo.
Oficialmente, faz o que define como “proteção patrimonial”: um empresário que queira guardar patrimônio para se proteger da eventual falência de seu negócio monta uma empresa de fachada, por exemplo.
Na prática, não é assim: as fachadas podem servir para sonegar impostos, transferir dinheiro de origem indeterminada ou lavar dinheiro de origem ilegal.
Segundo Ken Silverstein, que escreveu um longo artigo sobre a Mossack, ela serve a ditadores, terroristas e criminosos.
No âmbito da Lava-Jato, a Mossack abriu empresas para que o ex-diretor da Petrobras Renato Duque, o ex-gerente Pedro Barusco e o operador Renato Góes recebessem propina.
Além disso, a empresa Murray, criada pela Mossack, tem em seu nome 14 unidades do edifício Solaris, que se tornou conhecido por conta do tríplex que teria sido reformado para o ex-presidente Lula – ele nega ser dono do imóvel.
Segundo o jornal O Globo de 28/1/2016, a Mossack é acusada de financiar ações de terrorismo. O jornal da família Marinho reproduziu declaração do Ministério Público Federal segundo a qual “há indícios suficientes de que a Mossack pode ser utilizada na estruturação de operações por meio de offshores, visando à ocultação e à dissimulação da natureza, origem, localização, disposição e propriedade”.
A Paraty House, construída de forma irregular na praia de Santa Rita, em Paraty, litoral do Rio de Janeiro, é hoje uma mansão sem dono.
Oficialmente ela está registrada em nome da Agropecuária Veine Patrimonial, que por sua vez tem como sócia a Vaincre LLC, baseada em Nevada.
Nosso investigador descobriu registros oficiais segundo os quais a Vaincre LLC era gerenciada em Las Vegas por outra empresa, a Camille Services, também criada pela Mossack.
É uma forma de blindagem permitida pela lei de Nevada, em que os verdadeiros nomes dos donos nunca aparecem.
Como se vê no documento que reproduzimos, a empresa sócia da mansão de Paraty tinha como agente registrado em Las Vegas a empresa MF Corporate Services Limited.
Ironicamente, no dia 28 de janeiro deste ano o Jornal Nacional, da TV Globo, foi à sede da MF, em Las Vegas. Uma sede de fachada, onde funcionam, segundo o telejornal da emissora, 1.046 empresas de papel.
Pois a Polícia Federal, segundo documentos tornados públicos pelo juiz Moro, também encontrou a Vaincre LLC na sede paulistana da Mossack Fonseca.
Numa lista de anuidades a receber aparece o nome da empresa controladora da Vaincre LLC: é a Glem Participações, que pertence ao ex-genro de João Roberto Marinho, Alexandre. Ele se separou de Paula, a herdeira global, no final do ano passado.
Nas anotações, a anuidade para manter a empresa dona da Paraty House custou US$1.535,00.
Ao lado da menção à Glem aparece o nome Rita e o número 120484.
Como informou o Viomundo anteriormente, a Glem Participações é a permissionária do estádio de remo da Lagoa Rodrigo de Freitas, no Rio de Janeiro. Ela é uma das sócias da Lagoon, cujo nome aparece na fachada exterior do estádio.
Segundo o Ministério Público Estadual do Rio de Janeiro, a permissão dada ao genro de João Roberto Marinho, então casado com Paula, foi irregular: faltou concorrência pública.
O contrato inicial foi assinado pelo então governador Marcelo Alencar, em 1997. A Glem se chamava Glen. Três aditivos foram assinados entre a empresa e o governo do Rio desde então. Quase vinte anos depois, o contrato “a título precário” continua valendo.
Várias ações correm na Justiça pela retomada do patrimônio público. O estádio sediará as competições de remo e canoagem das Olimpíadas de 2016.
Em valores atuais, cerca de R$30 milhões em dinheiro público foram investidos em reformas do estádio que beneficiaram, mesmo que indiretamente, a empresa do genro de João Roberto Marinho.
O MP do Rio move uma segunda ação para reaver o dinheiro, argumentando que os investimentos deveriam ter sido feitos pela permissionária – que explora cinemas, restaurantes e um clube noturno num dos endereços mais cobiçados da cidade.
Nos contratos com o governo do Rio, quem assina pela Glen/Glem é Alexandre Chiappetta de Azevedo. A esposa de Alexandre, Paula Marinho Azevedo, assinou o primeiro aditivo como fiadora, ao lado do marido e do então governador Anthony Garotinho.
Na apreensão feita na sede paulistana da Mossack Fonseca pela Polícia Federal, o nome de uma certa Paula Marinho Azevedo aparece numa anotação.
No item número 11 do auto de apreensão, num papel com anotações manuscritas, o nome de Paula aparece ao lado do número 576764-15. Pode ser o número de uma conta bancária.
Há dois valores associados.
O primeiro, de 3.741,00, ligado à data 27 de julho. Pode ser um pagamento feito por Paula.
A outra quantia, ao lado das anotações Total e Paula Marinho Azevedo, é de134.238,33, provavelmente o saldo bancário do próprio escritório da Mossack em São Paulo.
Só a Polícia Federal, que agora está se debruçando sobre os papéis, pode determinar o significado exato das anotações.
Os documentos apreendidos na Mossack foram tornados públicos na última sexta-feira, junto com os grampos telefônicos do ex-presidente Lula.
São uma verdadeira mina de ouro para a Polícia Federal, que abriu inquérito específico para investigar a Mossack. Há dezenas de nomes de empresas e controladores de empresas em paraísos fiscais. O primeiro trabalho será chamar aqueles que são citados nominalmente nos documentos.
Depois, a PF terá de identificar as sociedades mantidas pelas offshore com empresas que atuam no Brasil. Chegando aos verdadeiros donos, será possível apurar se houve casos de ocultação de patrimônio, sonegação fiscal e lavagem de dinheiro, dentre outros.
O fato de nomes de pessoas e empresas aparecerem em documentos da Mossack, em si, não significa atividade ilegal ou criminosa. É assim nos países em que subsiste a presunção de inocência.
Nos documentos apreendidos na Mossack, a Glem, do genro de João Roberto Marinho, do Grupo Globo, aparece associada a uma segunda offshore, a A Plus Holdings.
A empresa, sediada no Panamá, está na cadeia societária do consórcio que controla o estádio de remo da Lagoa.
Ao lado do nome da A Plus Holdings aparece outra vez a anotação Rita.
Os investigadores ainda não determinaram se se trata de Rita de Cássia de ******** *****, moradora de uma casa de fundos no bairro do Grajaú, no Rio de Janeiro.
Rita aparece como procuradora da Agropecuária Veine Patrimonial – uma das donas da Paraty House – na formação de um consórcio.
Do negócio participou empresa ligada à Brasif, do empresário Jonas Barcellos.
Inquérito recém-aberto pela Polícia Federal vai investigar pagamentos feitos através da Brasif à jornalista Mirian Dutra, então funcionária da TV Globo.
Mirian disse que fechou um contrato de fachada com a Brasif a pedido do ex-namorado, Fernando Henrique Cardoso. Quando o contrato foi fechado a Brasif controlava lojas em aeroportos brasileiros e FHC era presidente da República. Ele nega que tenha acionado uma concessionária de serviço público para fazer pagamentos à ex-namorada através de paraíso fiscal.
O consórcio formado entre a Brasif e a Agropecuária dona da Paraty House era para importar um helicóptero.
Procurada através do Facebook, a procuradora Rita de Cássia de ******** ***** negou ter tido participação no negócio. Na rede social, ela se identifica como ex-funcionária do setor administrativo da Lagoon, a empresa do genro de João Roberto Marinho.
Segundo documentos da Junta Comercial de Minas Gerais, Rita recebeu a procuração para importar o helicóptero da empresária Lúcia Cortes Pinto, outra moradora do Grajaú.
Lúcia foi sócia minoritária da Agropecuária Veine, uma das donas da mansão de Paraty.
O nome de Lúcia também aparece em documento apreendido na sede da Mossack Fonseca, em São Paulo.
É na formação de outra offshore, a Juste International, nas ilhas Seychelles. A Juste é outra empresa da Glem, do genro de João Roberto Marinho.
A empresa foi criada no dia 13 de junho de 2014, com um capital de U$5 mil. Os sócios que aparecem no documento são duas outras empresas, a Direhold Ltd. e a Shareton Ltd.
Como se vê, neste e em muitos outros casos os investigadores terão pela frente um árduo trabalho.
Como as investigações se dão no âmbito da Lava-Jato, ficarão sob o guarda-chuva do juiz Sérgio Moro, em Curitiba.
Em tese, a Polícia Federal poderá chamar para depor as moradoras do Grajaú cujos nomes aparecem em documentos de alguma forma associados, direta ou indiretamente, às offshore Vaincre LLC, A Plus Holdings, Juste International, Shareton e Direhold.
Elas poderão dar pistas de quem são os verdadeiros donos das empresas. Como as investigações ainda estão no início, a possibilidade de oferta de delação premiada no inquérito da Mossack Fonseca está longe de ser considerada.
Porém, os documentos e anotações apreendidos pela Polícia Federal demonstram que é apenas uma questão de tempo até que se determine quem se esconde por trás da Agropecuária Veine e da Paraty House – e se de fato é um caso de ocultação de patrimônio.
Por conta do tratamento isonômico garantido pela mídia brasileira no caso da Lava-Jato, as descobertas feitas na Mossack em breve ocuparão as manchetes de jornais e longas reportagens nas emissoras de televisão, permitindo à opinião pública que, no molde desejado pelo juiz Sérgio Moro, exerça pressão para que o caso da Paraty House não fique impune.
Abaixo você encontra todos os documentos relativos ao caso:
1) Autos de apreensão da Lava-Jato na Mossack Fonseca em São Paulo;
2) Importação de helicóptero pela Agropecuária Veine/Paraty House em sociedade com Jonas Barcellos/Brasif;
3) Aditivo de contrato do estádio de remo em que aparece a assinatura de Paula Marinho Azevedo
4) Sentença na primeira instância dando ganha de causa ao MP no caso do estádio de remo.
5) Formação da Agropecuária Veine/Paraty House.
2) Importação de helicóptero pela Agropecuária Veine/Paraty House em sociedade com Jonas Barcellos/Brasif;
3) Aditivo de contrato do estádio de remo em que aparece a assinatura de Paula Marinho Azevedo
4) Sentença na primeira instância dando ganha de causa ao MP no caso do estádio de remo.
5) Formação da Agropecuária Veine/Paraty House.
Para acessar os documentos, clique aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui,aqui e aqui.
Nosso investigador preparou um gráfico para facilitar o entendimento das relações. Será que algum leitor poderia transformar em meme? Clique na foto para ampliá-la.
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