Muito tem sido escrito e falado sobre os grandes eventos que acontecem hoje no mundo árabe. Algumas bobagens, algumas análises criteriosas, mas quero pensar um pouco sobre um tema caro àquela parte do mundo: sua complexidade.
O Oriente Médio é assim, terra de múltiplas culturas, maturadas nos séculos, tempos imemoriais, onde o Egito, depois de milênios de civilização própria, foi helenizado, romanizado, cristianizado, arabizado e islamizado, enquanto a antiquíssima Pérsia se manteve persa, nunca árabe, mas adotou a forma xiita do Islã e é conhecida por nós como República do Irã.
O destaque é a dissonância entre este mundo cultural, religiosa e politicamente complexo e a vida cotidiana, marcada pelo peso de regimes autoritários, resultado dos escombros da exaurida da Guerra Fria, que fragmentou ainda mais o Oriente Médio.
A desilusão política é grande na região desde o fracasso do nacionalista e esquerdista Egito de Nasser e das monarquias e regimes autoritários apoiados pelos EUA no Irã, Iraque e Turquia, além do belicismo expansionista israelense e da corrupção na Autoridade Palestina.
Cada parte do imenso mundo árabe, da costa atlântica do Marrocos às margens do Tigre e Eufrates no Iraque, construiu caminhos distintos em sua história particular, tão diferentes e distantes quanto a cultura turca e persa o são da árabe, apesar de todos, na maioria, serem muçulmanos, sendo improvável uma solução única para todos.
A revolução islâmica no Irã introduziu, desde 1979, um exótico regime teocrático e de retoques democráticos, com eleições periódicas, um parlamento separado do Judiciário e do Executivo, mas cuja última palavra é dada pelos aiatolás, líderes religiosos da nação.
A Turquia moderna nasceu de uma mistura de nacionalismo à européia, em 1922, com forte ocidentalização, mas pouca democracia, passando por períodos abertamente ditatoriais, até um processo de abertura política que conduziu ao atual governo eleito democraticamente, com maioria parlamentar, mas com tendências tradicionalistas islâmicas, cuja oposição vem dos setores médios de caráter laico e dos militares, autoritários e ocidentalizantes.
O Ocidente, infelizmente, apoiou todos os regimes autoritários que estão sendo derrubados, até o líbio Khadafi, redimido pelos mesmos que o condenavam, não podendo esperar dos que se libertam muita simpatia.
Não há sinais que o regime iraniano, que celebrou a queda dos regimes rivais, tampouco seja vitorioso, pois seu modelo teocrático não parece empolgar as ruas do Egito, país mais populoso e de grande valor estratégico da região.
O povo tomou a praça, ato de caráter simbólico extremo desde a ágora ateniense à Praça Tahir cairota, e a transformou na quebra da aparente estabilidade do silêncio dos ditadores.
Não é hora de regredir ao fracasso da política belicista de Bush, fundada no choque de civilização, pois o esforço deve ser pela integração entre os povos, respeitadas suas diferenças culturais.
Que o Brasil, país BRIC construído pela experiência democrática das últimas décadas, possa usar sua influência diplomática recentemente ampliada para lutar por mais democracia e proteção aos direitos dos cidadãos nesta parte sofrida do mundo que responde por Oriente Médio. E as Pirâmides continuam lá.
Rodrigo Falcão
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