quinta-feira, 17 de setembro de 2009

MP, Judiciário e governo gaúcho: empenho pelo fim do MST

O assassinato do sem terra Elton Brum da Silva foi o ápice do processo de criminalização dos movimentos sociais no Rio Grande do Sul, um dos mais graves do país. As ações repressivas levadas a cabo pelo governo Yeda Crusius (PSDB) não são um fato isolado, mas fazem parte de uma escalada repressiva com conexões no Ministério Público do RS e no Judiciário. Em outubro de 2008, Conselho Superior do MP decidiu "dissolver" o MST, classificando o movimento como uma "organização criminosa".
As ações repressivas do governo gaúcho contra o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) fazem parte de uma escalada repressiva em que setores do aparelho estatal conjugam-se em torno de um objetivo comum: acabar com o movimento política e, até, fisicamente.
Essa afirmação pode ser comprovada ao analisar o comportamento do judiciário gaúcho e do Ministério Público (MP). Este orgão, em termos nacionais, é conhecido por uma postura independente e zelosa pelos direitos humanos. No entanto, a atuação da seção gaúcha do MP tem manchado a imagem desta instituição.
Em outubro do ano passado, os nove componentes do Conselho Superior do MP, instância máxima da instituição, votaram por unanimidade pela dissolução do movimento, por ter comprovado que este era uma “organização criminosa” com viés socialista. Entre as “provas” reunidas, estavam livros encontrados em assentamentos, como os de Florestan Fernandes e Paulo Freire, usados nas escolas dos acampamentos.
O parecer do MP pediu ao governo que proibisse as marchas do MST e que retirasse sem-terras de áreas cedidas para fins de reforma agrária. A medida, à época, foi criticada por juristas e promotores, por ferir dois artigos da Constituição. No artigo 5 da Carta Magna, há dois incisos violados pela decisão: o 16, que assegura o direito de reuniões, sem armas, em locais abertos ao público e o 18, que rechaça a interferência estatal em associações e cooperativas.

Contra a lei, se preciso

Parte das motivações do MP contra o MST estaria ligada à própria origem dos promotores, segundo Frei Sérgio Görgen, ex-deputado estadual (PT-RS) e membro do Movimento de Pequenos Agricultores (MPA). “A justiça aqui do Rio Grande do Sul tem uma composição igual à brasileira. Cerca de 70% têm um comportamento conservador. E, se for preciso, julgam contra a própria lei para defender o interesse dos poderosos. Boa parte deles tem origem no latifúndio, e faz uma defesa dele. Isso se reflete no preconceito contra pobre e sem-terra”, analisa.
Para Frei Sérgio, um exemplo de como a Justiça julga contra a lei é o fato de o MP ter pedido a saída de sem-terra de áreas cedidas. “Foram contra o seu próprio direito sagrado, o da propriedade privada”, explica.
Há, no entanto, um setor com uma visão mais democrática no MP e na Justiça em geral, salienta Frei Sérgio. O próprio Ministério Público Federal já demonstrou discordância em relação às ações tomadas no Rio Grande do Sul.
“Tem um setor do judiciário muito importante que é o Movimento Juízes pela Democracia, que desempenham um excelente papel, mas eles são minoria. Mas há esse outro setor muito beligerante em favor do latifúndio, que age em conjunto com a polícia e diz que as ações são profissionais, quando está comprovada que [o sem-terra Elton Brum] foi assassinado pelas costas. O MP tinha fama de democrático, mas deixou de ter essa imagem ao pedir a extinção do movimento”, pontua.

Inquérito secreto

As recentes ações do governo gaúcho contra o MST são resultado de um processo desencadeado em abril de 2007, que, por fim, deu origem ao parecer do MP gaúcho pela extinção do MST. O advogado do MST-RS e ex-procurador da justiça estadual, Jacques Távora Alfonsin, afirma que um inquérito secreto do MP em parceria com a Brigada Militar deu início à intenção de acabar com o movimento. “Esse inquérito secreto, que é um dispositivo da época da ditadura, redundou em diversas ações em várias comarcas do estado, todas com acolhimento muito rápido da Justiça. Desde então, liquidaram quatro acampamentos do MST, destruindo escolas e farmácias. Tanto que a Anistia Internacional já denunciou a situação do Rio Grande do Sul”, revela Alfonsin.
Criticados por especialistas, os promotores gaúchos negam que defendam o inconstitucional fim do MST, apesar de na prática e no parecer do Conselho Superior do MP-RS terem demonstrado essa intenção. “Eles querem extinguir o movimento. Eles notaram a besteira que fizeram [ao dar um parecer pela extinção do MST] e tentam dourar a pílula, dizendo que não pediram o fim do MST. Mas está lá, não tem como negar. O que eles não conseguiram realizar no atacado [o fim do MST], eles tentam concretizar no varejo, matando sem-terras, como fizeram agora no caso do Elton”, explica. Para Jacques Távora Alfonsin, há indícios de promiscuidade entre latifundiários, governo, MP e judiciário.

Providências

Nesse contexto, é no mínimo estranho que as torturas e mortes de membros do MST sejam investigados por instâncias estaduais, já que estas têm posicionamento claro contra a existência do movimento.
Nesse sentido, o Comitê Estadual Contra a Tortura do Estado de São Paulo solicitou que sejam tomadas providências junto à Procuradoria Geral da República para que o inquérito civil que investiga a tortura de trabalhadores sem-terra em Coqueiro do Sul seja transferido para o Ministério Público Federal do Rio Grande do Sul. (Colaborou Eduardo Sales de Lima)

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