segunda-feira, 28 de setembro de 2009

Na sala de aula, notas quase iguais

Os alunos cotistas da Universidade de Brasília têm aproveitamento acadêmico semelhante ao de seus colegas não cotistas. Em alguns critérios sobre o desempenho discente, a diferença é até mesmo favorável aos cotistas. Os dados fazem parte de pesquisa da decana de Ensino de Graduação da UnB, Márcia Abrahão Moura. De acordo com os dados apresentados pela professora, o Índice de Rendimento Acadêmico dos alunos cotistas é de 3,58 contra 3,63 obtidos pelos não cotistas (a nota máxima é 5).
– É praticamente irrisória a diferença – observa Márcia. A decana destaca ainda outro dado positivo para os beneficiados pela ação afirmativa da UnB: há proporcionalmente menos cotistas desistentes dos cursos universitários do que os não cotistas. Os cotistas têm menos processos na comissão de acompanhamento e orientação acadêmica. Eles representam apenas 6,6% dos processos, menor que a proporção deles na universidade (em torno de 10%, 2.990 alunos).
– O percentual é muito menor do que imaginavam os contrários às cotas – aponta a decana, que também assegura que “não existe retenção (reprovação) maior de cotistas do que dos não cotistas. – O rendimento é o mesmo. Nós estamos conseguindo formar bem os alunos independentemente da origem.
A política de cotas foi implantada na UnB no segundo semestre de 2004. Mais de 280 estudantes cotistas já se formaram na universidade. Para Márcia, a implantação do mecanismo transformou a instituição.
– A universidade mudou para melhor. Tem uma diversidade maior de alunos e uma convivência de pessoas diferentes que vem de camadas sociais e escolas diferentes – destaca a decana.
Na avaliação de Aline Costa, vice-coordenadora do Projeto AfroAtitude da UnB e estudante já formada em pedagogia pela instituição, “a universidade mudou bastante porque teve que se repensar para poder incluir os negros”.
– Existia um único padrão, padrão de pensamento, padrão de comportamento, um padrão acadêmico – critica Aline, integrante da primeira turma de alunos cotistas a entrar na instituição. Segundo Aline, hoje a presença dos estudantes negros na universidade é emblemática. – Dentro de uma sala, onde todo mundo faz parte de uma elite, onde todo mundo tem um único projeto de vida, a gente, com as nossas trajetórias, muda a realidade, a gente muda o discurso. Visualmente é fato que a gente já conseguiu colorir a universidade.
Para a formanda em antropologia Natália Maria Alves Machado, a política de cotas conseguiu unir pessoas de realidades completamente distintas que passaram a ter um convívio cosmopolita na universidade.
– A gente tem quilombola, tem gente que mora na cidade. Tem gente que tem a cultura hip hop de periferia, tem gente ultra evangélica. Tem uma heterogeneidade interna muito grande – diz. – Você é morador de periferia, mas você não é como seus vizinhos nem está nos espaços que as pessoas da sua comunidade estão. Ao mesmo tempo, você está na universidade com outras pessoas de outro status cultural e você também não é igual a eles.
Segundo alguns dos estudantes cotistas, a inclusão na universidade e o convívio com estudantes de diferentes contextos sociais também contribuiu para que os alunos negros conhecessem um pouco mais sobre suas próprias identidades.
– Eu passei por um processo muito bacana de identificação. Não que eu não soubesse que era negra, mas foi um processo de análise, reflexão e entendimento de tudo que acontecia na sociedade – garante Luiana Maia, do quinto semestre de História.
– A minha mãe é branca. A gente não foi criada com essa identificação. Eu não tinha consciência do tamanho que isso era – acrescenta a estudante Jade Dantas, do quarto semestre de biblioteconomia. Segundo Jade, frequentar a UnB não estava nos planos dela mesmo nem da família. A entrada na instituição, contudo, diz a estudante, abriu perspectivas inclusive para os familiares. – Quando eu era criança ninguém falava em universidade ou fazer ensino superior. Nunca tive visão de futuro nesse sentido, nem na escola nem no ensino médio. Hoje eu já sou uma referência. Minha irmã já fala: "minha filha vai fazer faculdade como a minha irmã". Mudou muito a perspectiva. A minha escolha como cotista alcançou a minha família.
Humberto Borges, terceiro semestre de letras, tem uma história semelhante. Foi o segundo da família a entrar no curso superior e o primeiro em uma universidade pública.
- Minha sobrinha hoje diz: acho que eu vou ser que nem a tia Isadora e o tio Humberto, eu vou ser professora também – conta.

STF quer ouvir opinião da sociedade sobre cotas raciais

O Supremo Tribunal Federal (STF) abriu o debate sobre as cotas raciais nas universidades públicas. O ministro do STF Ricardo Lewandowski anunciou que as audiências públicas com pessoas interessadas no tema, grupos e autoridades vão ocorrer entre 3 e 5 de março de 2010. A ideia é ouvir o depoimento de quem tem experiência em políticas de ação afirmativa no ensino superior antes de julgar as ações sobre o assunto que tramitam no tribunal, como no caso do DEM que quer acabar com o ProUni. As inscrições para a seleção de participantes começam na próxima quinta-feira, 1º de outubro, e vão até o fim do mês. Devem ser feitas pelo email: acaoafirmativa@stf.jus.br .

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