sexta-feira, 30 de outubro de 2009

O DILEMA DE MARINA

A senadora Marina Silva, tradicional quadro do PT, que mudou-se recentemente para o PV e cogita ser candidata à Presidência da República em 2010, tem um enorme desafio pela frente. Como conciliar sua visão política e ecológica do desenvolvimento do Brasil à aliança dos verdes com as forças neoliberais do país?
Essa dicotomia entre Marina e o partido a que se filiou, e, sobretudo, a seus aliados nacionais, ficou evidente na opinião da senadora sobre a CPI do MST, estimulada por DEM e PSDB, parceiros do PV no projeto nacional. Profunda conhecedora das questões da terra, Marina defendeu que a CPI não se limitasse a repasses do governo a entidades que lutam pela reforma agrária, mas que tratasse da questão fundiária no país em todos os seus aspectos.
Essa visão mais profunda incluiria, naturalmente, grilagem de terras, índices de produtividade, assassinatos no campo e o próprio modelo agrícola do país, o que não interessa aos ruralistas, abrigados principalmente nos partidos aliados ao PV.
Seringueira e defensora de um modelo de desenvolvimento sustentável, condição que a levou a romper com o partido de toda a vida por temer um desenvolvimentismo predatório, Marina não teria como compactuar com ruralistas, responsáveis pelo desmatamento que corresponde a mais da metade das emissões de carbono do país. Tampouco poderia estar ao lado da agropecuária, segunda atividade que mais contribui para o aquecimento global no Brasil.
Marina Silva talvez fosse a pessoa política com mais capacidade de fazer avançar a agenda de desenvolvimento do país, que recuperou para o Estado o planejamento das atividades econômicas e sociais, mas isso parece incompatível na legenda em que se abrigou. O Brasil cresce, reduz as desigualdades, pressiona as empresas a se comprometerem com o país e na ânsia de retomar o tempo perdido pelos anos de neoliberalismo deixa de lado algumas alternativas de desenvolvimento que Marina poderia apontar.
A senadora teria na próxima eleição um importante papel de denunciar certas incongruências e forçar compromissos dos candidatos com maior cacife eleitoral. Mas a incongruência maior seria usar como palanque justamente a tribuna onde estão os maiores adversários de sua visão política.
A cada vez que se manifesta, Marina explicita as contradições das alianças dos verdes, e sua mudança para o partido torna-se um mistério. O único cenário imaginável seria o da sua candidatura isolada à Presidência pelo PV, enquanto PSDB e DEM apoiariam José Serra ou Aécio Neves. Restaria a pergunta sobre quem ela apoiaria se não passasse ao segundo turno e a disputa ficasse entre estes tradicionais aliados e o PT? A Marina Silva que conhecemos certamente votaria no seu ex-partido, enquanto os verdes, por sua recente trajetória, ficariam com os neoliberais.
Sérgio Porto, se vivo fosse, comporia um segundo samba do crioulo doido.

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