“Acontece agora uma radicalização aberta, um embate em que a mídia dominante não tem mais espaço para esconder os interesses que representa, nem vergonha em se desfazer duma neutralidade que nunca existiu”
A convivência do governo Lula com a grande mídia não tem sido nada fácil. Desde 2002 já se vão sete anos, e os ataques são tão constantes, tão previsíveis e sempre absurdamente os mesmos que já nos acostumamos a pular cotidianamente tais partes, botando sob suspeita simplesmente TUDO o que ela declara – tantos foram os exageros e desmentidos e besteiras e alucinações – enfim, o delírio que a direita elevou à categoria política. Previsivelmente, o governo democrata de Barak Obama recentemente foi atacado massivamente pelos ultra-radicais da direita norte-americana, contrária à reforma de saúde proposta por ele, tendo à frente o grupo Fox. Aliás, a nossa mídia saturou-se desse assunto esta semana, inclusive capa de Carta Capital: “A vida de Obama não tem sido nada fácil etc.” Lula que o diga, veterano dessa merda há sete anos.
Mas a defesa do livre mercado na saúde nos EUA é só a ponta do iceberg do ataque midiático. Embaixo se entrelaçam o fanatismo e o dinheiro da direita republicana, dentro e fora da mídia. Sua meta é desconstruir e imobilizar o sucessor de Bush. Não há muita diferença entre o que se passa nos EUA e a divisão de trabalho observada no Brasil, onde as rádios chutam o governo Lula abaixo da linha da cintura, os jornalões desgastam e “denunciam”, enquanto a Globo faz o seu habitual antijornalismo destinado a um público pretensamente e inteiramente constituído de idiotas.
Conforme observou Saul Leblon em Carta Maior, a repetição dos mesmos métodos e argumentos duma histérica mídia neoconservadora no mundo todo parece indicar um fenômeno de recorte histórico global. O fato é que o conservadorismo está encurralado após o fracasso econômico e político neoliberal. A falência dos mercados financeiros desregulados na maior crise do capitalismo desde 1930 já é reconhecida como um novo divisor histórico. Corroído na base de sua legitimidade pela falência de empresas, famílias e bancos, sem contar o recrudescimento do desemprego e da insegurança alimentar – inclusive nos países centrais –, o conservadorismo vê sua base social derreter. A radicalização do seu ‘braço midiático’ soa como uma tentativa derradeira de reverter o processo ainda nos marcos da democracia, desqualificando o adversário formado por partidos e governos progressistas. A radicalização é proporcional à ausência de um projeto conservador, uma vez que os neocon não têm, nem nunca tiveram, nada a oferecer à sociedade.
O fato é que acontece agora uma radicalização aberta, um embate em que a mídia dominante não tem mais espaço para esconder os interesses que representa, nem vergonha em se desfazer duma neutralidade que nunca existiu, mas da qual sempre se considerou guardiã para descartar a democratização efetiva dos meios de comunicação. A isenção já não pode sequer ser simulada.
Então vale assinalar as declarações à imprensa de Anita Dunn, diretora de Comunicações do presidente norte-americano, em resposta aos ataques recentes ao governo Obama: "A rede Fox está em guerra contra Barack Obama. Não precisamos fingir que o modo como essa organização trabalha é jornalístico. Quando o presidente fala à Fox, já sabe que não falará à imprensa propriamente dita. O presidente já sabe que estará debatendo com um partido da oposição. Rupert Murdoch tem talento para fazer dinheiro, e eu entendo que sua programação é voltada a fazer dinheiro. Só o que argumentamos é que seus veículos não são um canal de notícias de verdade. Não só os âncoras, mas a programação toda. Não é notícia de verdade, mas é a pregação de um ponto de vista. E nós vamos tratá-los assim".
No caso dos EUA, um país essencialmente conservador e racista, pode-se argumentar que não há grande surpresa nos ataques da Fox & cia. a um presidente negro e democrata. O que surpreende é Obama estar reagindo e com munição pesada. Mas nem tanto, afinal não foi exatamente devido a esta estratégia que ele ganhou as eleições, degradação global dos neocon à parte, funcionando como “colaboradores involuntários e a despeito de si próprios”?
É verdade que mediante a divulgação de coisas como “temos um presidente ilegítimo. Um presidente que vai acabar com a América e os americanos. Chegou o momento de agir, abaixo o governo” (panfletos distribuídos por manifestantes) ; “cada dia ganha mais peso a possibilidade de que os militares tenham que intervir como último recurso para solucionar o problema Obama”, escreveu o colunista do site Newsmax, fórum de encontro de extremistas na internet (na rebelião contra a reforma da saúde confluíram dezenas de organizações conservadoras, desde o Clube para o Crescimento, o Instituto para a Empresa Competitiva, até o obscuro Centro para os Direitos Individuais Ayn Rand), os serviços secretos dos EUA começaram a levar o assunto muito a sério e iniciaram uma investigação sobre uma pesquisa criada na rede social Facebook, na qual se perguntava se Obama deveria ser assassinado! (sic)
Como presidente dos Estados Unidos, Obama é o homem mais poderoso do mundo, sua reação foi até amena, razoável e diplomática, mediante o que já fizeram e disseram seus antecessores. E por muito menos.
sexta-feira, 23 de outubro de 2009
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