sexta-feira, 2 de outubro de 2009
“A missão do Brasil é transformar o mundo”. Lula na Newsweek – Tradução exclusiva!
O político mais popular da Terra
Por quase sete anos, ele tem feito um trabalho espetacular como presidente do Brasil. Mas será que Lula pode resistir à tentação de continuar nisso?
Ele nasceu pobre e somente soube o que era comer pão aos sete anos. Foi quando Lula subiu num caminhão aberto, com sua família de lavradores e todas as suas posses, e fez uma longa viagem da seca do nordeste do país para uma nova vida nas favelas de São Paulo. Ele largou a escola no 5º ano, engraxou sapato nas ruas, e foi trabalhar numa fábrica de peças automobilísticas aos quatorze anos. Em acidente de trabalho, perdeu um dedo. Com tudo isso, ele conseguiu subir de posição e se gabaritar a tornar-se um líder sindical respeitado internacionalmente. Na época, o Brasil era governado por militares, e greves eram ilegais, mas ele desafiou seus chefes e os generais, e praticamente fechou uma usina elétrica industrial em nome dos operários.
Ele está esta semana em Nova York para dar início a 64ª Assembléia Geral das Nações Unidas. As câmeras de TV poderão focar na personificação do americano simpático, Barack Obama, ou em autocratas pomposos e posudos, como o iraniano Mahmoud Almadinejad, ou o venezuelano Hugo Chávez, mas a maior estrela por perto será um homem simples, barbado, ex-metalúrgico: o presidente do Brasil, Luís Inácio Lula da Silva. Depois de sete anos tumultuados na presidência, o homem que todo mundo chama Lula continua desfrutando de uma popularidade acima de 70%. Isso seria um feito notável em qualquer lugar, ainda mais num continente onde os presidentes são empregados do povo.
“Aquele é o cara!”, Obama o saudou na Conferência do G20, em Londres, em Abril. “O político mais popular no Planeta”.
Como Da Silva ganhou tal aclamação se deve muito a como a riqueza e o poder estão mudando nesta era pós-crise. Com sua liderança, o Brasil superou a crise global de uma forma melhor do que qualquer outra nação: nenhum banco faliu, a inflação é baixa e a economia está crescendo de novo. “As pessoas duvidaram quando eu disse que seríamos os últimos a ter recessão e os primeiros a sair dela”. Lula nos disse em entrevista exclusiva. “Mas só espere e veja, neste Dezembro: nós vamos criar milhões de empregos este ano.”
Não é tão bom quanto parece: um milhão de empregos seria apenas o número que substituiria os empregos que o Brasil perdeu desde Outubro de 2008. Mas o Brasil parece estar bem, se comparado com a maioria dos outros lugares. Está superando a Rússia e se equiparando à Índia e à China – as outras grandes potências que juntas formam os BRICs, e que lideram a corrida para o crescimento econômico global. Lá se vai o tempo quando, como economista chefe da “Goldman Sachs”, Jim O’Neil relembra de forma jocosa: “As pessoas me disseram que eu coloquei o “B” em BRICs para que a sigla soasse melhor”.
O homem do momento do Brasil diz que não poderia dar crédito para as pesquisas. “Se você tem políticas ruins e tenta vendê-las com falsa publicidade, seus índices não durarão.”, diz. Mas a questão agora é se ele pode continuar apostando no poder de sua própria estrela em ganhos para o Brasil – e, mais indicativo, se ele está pronto para abrir mão do muito que conseguiu como presidente. Ele tem apenas quinze meses a serviço, e aponta como sua favorita para a sucessão a ministra chefe da Casa Civil, Dilma Roussef, que tem pouco reconhecimento nacional e nenhum carisma, como tem seu chefe. Apesar da grande popularidade do presidente, as recentes pesquisas dizem que ela está concorrendo a uma segunda posição e perdendo para a escolha da oposição, o governador de São Paulo, José Serra.
“A áurea de Lula não é transferível”, comenta Dona Hrinak, antiga embaixadora dos EUA no Brasil. Para compensar, o ex-líder sindical começou a fazer o que seus críticos temiam quando ele assumiu o poder em 2003, apertando o controle do governo na economia e fazendo vista grossa quando seus principais aliados são pegos usando o dinheiro público para fins próprios e de forma irresponsável.
Em nome de ajudar os pobres e as classes operárias brasileiras – mas com um foco nas eleições do ano que vem – Da Silva tem repetidamente aumentado o salário mínimo (até 67% desde 2003, quase 40% acima do andamento da inflação) e contribuído para o aumento do salário do governo e o aumento de pensões, uma mudança que só acrescentará problemas para a próxima administração. “Nós temos que dar um pouco mais para aqueles que ganham menos”, diz Lula. Ainda assim, este é o tipo de discurso populista que causa furor. “O risco é o legado de gastos fixos e compromissos no orçamento que Lula deixará para o futuro”, adverte o ex-ministro das finanças Mailson da Nóbrega. A folha de pagamento está crescendo mais do que dez vezes na ordem de investimento público em estradas, pontes e portos. Enquanto isso, Da Silva não tem feito nada para facilitar a carga total tributária, a mais alta nos mercados emergentes, a 36% do PIB. E, quando o líder do senado e ex-presidente, José Sarney, que controla um importante bloco de votos no partido aliado, PMDB, ficou na mira do fogo por dar emprego a amigos e parentes, Lula apressou-se em defendê-lo, dizendo que “Sarney não poderia ser tratado como uma pessoa comum” – uma estranha escolha de palavras, vinda de uma pessoa do povo.
Mesmo assim, se tem alguma verdade certa sobre Lula é que as coisas estão sujeitas a mudança: “Eu sou uma metamorfose ambulante”, ele gosta de dizer, citando o cantor brasileiro cult dos anos 70, Raul Seixas. Seus cabelos têm apenas uma vaga semelhança com o corte irregular do sindicalista de 30 anos atrás. Ele em si nos traz apenas uma vaga lembrança do político que ele se tornou nos anos 80 e 90, fazendo discursos para os pobres e abandonados até ficar rouco. Os caracóis pretos de outrora e a barba descuidada estão bem aparados agora e grisalhos. Em lugar de seu jaleco manchado e de seu jeans boca-de-sino, ele veste ternos elegantes talhados para favorecer sua silhueta arredondada. Seu ceceio (modo de falar) diminuiu e ele teve longas horas de prática para refinar sua gramática (vulgar) e aumentar seu vocabulário. O homem que assumiu o governo dizendo que ficaria satisfeito em melhorar a vida de muitos brasileiros pobres, está agora convencido de que a missão do Brasil do Brasil é transformar o mundo. “O Brasil é um país com instituições sólidas e democráticas”, ele diz. “Nós temos mostrado às nações algumas lições de como enfrentar a crise econômica.”
E, no fundo, ele é o mesmo de sempre. E fala com o tom rouco/baixo profundo que eletrizou seus metalúrgicos. E, com todos os seus modos polidos e roupas finas, nada irrita mais Lula do que ficar preso em seu gabinete. “Ele fica nervoso quando passa muito tempo em sua mesa”, diz seu chefe de gabinete, Gilberto Carvalho. “Ele diz – ‘Eu preciso sair, viajar, encontrar pessoas’ – sua conexão é com as pessoas humildes”. Não há nada do que o presidente goste mais do que quebrar protocolos, sair do script, e (para desespero dos seus seguranças) se misturar à multidão que o adora. Contudo, para seu crédito, ele tem resistido aos pedidos de seus seguidores de alterar a Constituição para que ele se candidate pela 3ª vez, e adverte quanto à falsa impressão de grande celebridade: “Popularidade é como pressão sangüínea”, ele diz. Às vezes está alta e às vezes está baixa. O que é necessário é mantê-la sob controle.”
Esta é uma habilidade que ele adquiriu com esforço. Desde 1989, ele concorreu à presidência três vezes sendo derrotado.
No final dos anos 90, ele estava à beira de abandonar a política. Em vez disso, fez algo mais audacioso: ele se repaginou. Parou com o velho discurso de queda-de-braço, colocou um terno, contratou um treinador de oratória e um genial marqueteiro. Mais importante do que isso: ele moderou sua política de esquerda. A virada foi em Junho de 2002. Ele estava na frente nas pesquisas, mas a economia do Brasil estava parada em grande escala; parecia que o motivo era o fato de os investidores estarem assustados com as perspectivas do presidente Lula. Ele respondeu com a “Carta para o povo brasileiro”, jurando honrar contratos e pagar a dívida do país com o FMI, uma dívida guiada pelas regras do mercado. Foi a maior negociação de risco de sua carreira, equivalente a uma investida contra um furacão. Os extremistas do PT o acusaram de traição, de ter tirado proveito dos banqueiros e do capitalismo. Os executivos também ficaram cautelosos: será que poderiam confiar no “novo” Lula? Os investidores se retraíram, ficaram de mão atadas.
Ele teve uma vitória esmagadora, mas o trabalho duro havia acabado de começar. O alvoroço financeiro da sua pré-eleição havia destruído o crescimento econômico e forçou um pique de desvalorização da moeda brasileira. “Isso não foi fácil.”, recorda-se Lula. “Nós não tínhamos nenhum crédito no exterior. Nossas reservas monetárias estavam muito baixas. A economia estava estagnada”.
Mas um desafio ainda maior era redimir a imagem de extremista de esquerda, que ele e a liderança do PT mantiveram por muitos anos. “Nós assumimos o governo no meio de uma crise de desconfiança.”, diz Carvalho, seu chefe de gabinete e amigo de muitos anos. Nós éramos uma minoria no Congresso. A imprensa estava cética.” Depois de tudo, Carvalho já se permite lembrar: “Até então tudo o que queríamos era não pagar a dívida externa, aumentando os salários. Teria sido um desastre”.
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