Era totalmente previsível a derrubada de um helicóptero da Polícia Militar do Rio de Janeiro pelos traficantes e seus “soldados” com livre acesso a armamento pesado.
Aliás, o equipamento vinha sendo utilizado de forma irresponsável e puramente como ferramenta de marketing pelas autoridades, incentivadas pela mídia, a começar pela Rede Globo, que o apresentava em programas cantando as excelências do uso dos helicópteros para “perseguir e matar” (sic) suspeitos e não para transporte, observação e monitoramento.
Tudo era uma questão de tempo, decisão ou iniciativa própria de algum comando local. A derrubada do helicóptero aconteceu agora, mas poderia ter acontecido antes. Fica a lição, mais uma, da inadequada estratégia ou falta dela para o enfrentamento da questão do narcotráfico e o combate ao crime organizado, no Rio e no resto do país.
As autoridades e o comando militar subestimaram a audácia e a capacidade dos chefes ou dos comandos locais. Partiam do princípio que os traficantes não ousariam, pelo risco do nível de resposta da polícia, derrubar um helicóptero da corporação. O que revela que ainda existe, entre o crime e a polícia, um campo de convivência ou de suposta não beligerância, totalmente equivocado.
Para além das medidas sociais e econômicas necessárias, que estão sendo tomadas e que só terão efeitos em médio prazo, a questão do crime organizado e do narcotráfico não pode ficar na esfera do município, ainda que ele possa ter uma polícia própria e deva ter.
Nem na esfera do Estado, responsável, segundo a Constituição de 1988, pela segurança pública, prevenção e repressão (funções da Polícia Militar) e pela investigação, inquérito e por ser polícia judiciária (obrigações da Polícia Civil).
É evidente que, mais de vinte anos depois, essa engenharia constitucional e esse desenho da organização policial não têm como enfrentar o crime e o narcotráfico.
Apesar do apoio político, financeiro, em inteligência e equipamentos, e mesmo militar, com a Força Nacional ou mesmo com as Forças Armadas, o governo federal ainda não se convenceu plenamente de sua responsabilidade e, portanto, não tomou as medidas adequadas para cumprir com sua obrigação constitucional e administrativa de combater o narcotráfico.
Mais do que isso, não houve um convencimento da União de que, sem sua participação, não haverá um avanço nessa área.
Isso apesar do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) , dos programas sociais, do aumento do emprego e da renda, dos avanços na educação. São ações e medidas que têm efeito em comunidades, cidades e bairros onde o crime organizado ainda de fato não substituiu o Estado.
O crime organizado envolve o contrabando de armas, o trafico de drogas, sua produção e refino, além da venda e do transporte em maior escala, sua importação e exportação, a lavagem do dinheiro, a corrupção e o tráfico de influências, a captura e a cooptação, quando não mesmo a indicação e eleição de juízes, delegados, parlamentares e chefes de Executivo, bem como a montagem de empresas e o recrutamento de membros para as organizações criminosas.
É evidente que, sem um organismo nacional de direção e comando para a luta contra o crime organizado, não iremos a nenhum lugar. Ou pior, vamos sacrificar vidas e recursos em vão. Lembrando ainda que falta também uma maior articulação e colaboração em nível internacional.
Precisamos nos convencer de que o crime organizado e o narcotráfico são nacionais e que, portanto, só uma estratégia e um comando nacional podem combatê-los. É necessário um organismo de inteligência e direção direta na luta contra o narcotráfico e o crime, ainda que tenhamos que mudar a Constituição.
É preciso uma autoridade nacional que coordene e supervisione esse enfrentamento. Devemos assumir que a questão é nacional e de responsabilidade do governo federal, em articulação com os Estados e Municípios, mas também no comando. Caso contrário, não vamos, apesar de todo o apoio que o governo tem dado ao Rio de Janeiro e a outros Estados, avançar nesta luta, difícil e de longo prazo, contra o crime organizado.
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