O motivo dado pela advogada Beatriz Catta Preta ao juiz Sérgio Moro para deixar a defesa de três investigados na Lava-Jato esta semana – Júlio Camargo, Pedro Barusco e Augusto Ribeiro de Mendonça – foi sua mudança para Miami, nos Estados Unidos. É onde a criminalista, especialista em delação premiada, já está com o marido, condenado em 2003 por falsificação de dinheiro.
Carlos Eduardo Catta Preta foi flagrado e preso em 2001 em Alphaville, Grande São Paulo, com US$50 mil em notas falsas presas na cintura, segundo reportagem das jornalistas Mariana Barros e Laryssa Borges, de Veja. Agentes do Denarc – departamento de combate ao tráfico de drogas – encontraram em sua casa ainda US$350 mil falsos escondidos no banheiro.
O falsificador de dólares foi atrás de um advogado e, por indicação de um amigo, chegou ao escritório de Pedro Rotta, onde trabalhava Beatriz Lessa da Fonseca, então seu nome de solteira. Foi quando os dois se conheceram. Ela trabalhou em sua defesa e conseguiu que ele respondesse em liberdade. Carlos Eduardo foi condenado a três anos de prestação de serviços comunitários e começou a namorar Beatriz.
Os dois se casaram e tiveram dois filhos. Hoje, o marido é quem cuida das cobranças dos honorários dos clientes de Beatriz, chegando até a estabelecer os valores. A estratégia seria uma forma de evitar o desgaste da relação advogada-delator. Outra nota no site da revista, assinada por Ana Clara Costa, dá conta de que “doutor Carlos”, como é chamado, usa métodos indelicados para fazer as cobranças, mesmo de famílias fragilizadas por conta das prisões dos acusados.
De acordo com relatos, não é incomum presenciar socos na mesa, gritos e xingamentos por parte do marido de Beatriz, que é ex-policial, sem distinção entre clientes. A cobrança conta com a mesma rispidez no caso de casos grandes, que rende quantias vultosas para o escritório, a exemplo da Lava-Jato, ou de casos menores. Segundo amigos, ele exerce grande influência sobre a mulher.
Especula-se, no meio jurídico, que os honorários de Beatriz Catta Preta estejam entre R$2,5 milhões e R$5 milhões por causa. Tendo sido responsável por nove das 17 delações premiadas da Lava-Jato – entre elas a do ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa, que revelou todo o esquema de corrupção – ela deve ter partido para Miami com no mínimo R$22,5 milhões e pode ter amealhado, em toda a investigação da estatal, até R$45 milhões.
Atacada por críticos da delação premiada, a advogada decidiu deixar a defesa de Júlio Camargo duas semanas depois de ele ter revelado o repasse de US$5 milhões em propina ao presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB/RJ), que nunca havia sido citado por ele antes. Segundo o lobista, o motivo foi medo de perseguição por parte do deputado. Cunha usa o fato para se defender: considera “estranha” a nova informação no depoimento.
Desde então, Beatriz Catta Preta vem sendo questionada por parlamentares da CPI da Petrobras, na Câmara, sobre a origem de seus honorários. O deputado Celso Pansera (PMDB/RJ) apresentou um requerimento exigindo a convocação da criminalista para que explique se os pagamentos que recebe de seus clientes não são do esquema de corrupção e outro requerimento, para uma juíza do Paraná, solicitando a lista dos clientes da advogada.
A advogada Beatriz Catta Preta está de mudança para Miami, nos EUA, com pelo menos R$22,5 milhões no bolso. Com honorários entre R$2,5 milhões e R$5 milhões por causa, ela pode chegar a R$45 milhões na Lava-Jato, uma vez que fez 9 das 17 delações.
Ela comunicou ao juiz Sérgio Moro que largou as defesas do ex-gerente da Petrobras Pedro Barusco e do ex-executivo da Toyo Setal Augusto de Mendonça.
A magistrada deixou a operação após o lobista Julio Camargo mudar sua versão e dizer ter pago US$5 milhões em propina ao presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB/RJ).
Desde então, ela começou a ser questionada, em requerimento do integrante da CPI da Petrobras, o deputado Celso Pansera (PMDB/RJ), sobre a origem do dinheiro que recebeu como pagamento dos réus da Lava-Jato. Em outro pedido, dirigido a uma juíza do Paraná, exigiu a lista de todos os clientes de criminalista.
O dinheiro sinaliza que delatores não devolveram tudo que obtiveram no esquema.
Segundo o presidente da CPI, Hugo Motta, ela ainda será convocada para depor: “A renúncia mostra que a CPI da Petrobras não errou em fazer a convocação. Qual o motivo para ela deixar os clientes? Ela continua convocada”.
Leia aqui reportagem de Bela Megale e Graciliano Rocha sobre o assunto.
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O mistério da Rainha da Delação não será decifrado pela mídia tradicional. Isto é batata, como dizia Nelson Rodrigues.
Duas manifestações de dois jornalistas de visões diferentes ilustram bem o caso.
Primeiro, Xico Sá, ex-Folha, um livre pensador que é hoje um dos críticos mais lúcidos da miséria moral da imprensa brasileira. Se houvesse imprensa “independente” – a palavra mais correta, para mim, é decente – você veria grandes reportagens sobre esse extraordinário caso. Foi o que disse Xico.
Do outro lado, num comentário na CBN, Merval Pereira, símbolo da imprensa estabelecida, produziu uma sentença a seu modo também reveladora.
Merval disse que o caso é “muito” grave. Nos melhores manuais de estilo, recomenda-se evitar o adjetivo “muito” por ser desnecessário e feio.
Era uma coisa que eu sempre falava aos jovens jornalistas que se iniciavam nas redações sob meu comando. Mas em todo texto de Merval nada é “grave”, como se fosse pouco. Tudo é “muito grave”. Depois de definir daquela forma a súbita desistência da Rainha da Delação, Merval diz que é urgente investigar.
Mas.
Mas ele terceiriza a investigação. A imprensa não tem que apurar a história. É a Polícia Federal que tem.
Não discuto que a PF deve ir atrás do caso. Mas e a imprensa, deve ficar de bunda sentada à espera de que policiais vazem informações?
Quantos repórteres as Organizações Globo, já que falamos de Merval, não possuem? Que eles estão fazendo para trazer luz às sombras do episódio?
Nada.
É o que tem acontecido, na verdade.
A mídia, indolente, se contenta em pegar o telefone para tentar arrancar vazamentos – suspeitíssimos, aliás – da PF.
A falta de ação concreta é bisonhamente compensada por um estardalhaço ridículo.
No Twitter, o editor da Época, Diego Escosteguy, o Kim Karaguiri das redações, fica postando alucinadamente “bombas” que destruirão a República como a conhecemos.
É um comportamento semelhante ao de outro bombeiro serial, Cláudio Tognolli, ghost writer de Lobão. Ele já anunciou uma centena de bombas, ou mais, e nenhuma delas teve o menor efeito.
Mas isso não o impede de continuar a anunciar bombas.
Diego Kataguiri faz o mesmo, como tantos outros jornalistas da mídia em extinção.
Se parte da energia despendida na pirotecnia verbal fosse gasta em investigação real, teríamos uma imprensa bem melhor.
O caso de Beatriz Catta Preta – e o fascínio da história já começa no sobrenome invulgar – é “muito grave”, para emprestar o clichê de Merval.
O que leva uma especialista em delações do calibre dela a abandonar seus clientes, a esta altura, e se bandear para Miami?
Pressões? Que pressões? De quem?
Não há nada, aí, que repórteres competentes não pudessem investigar.
Mas não. As redações estão viciadas em pegar vazamentos selecionados e transmiti-los, bovinamente, para seus leitores.
Quem não se lembra do “eles sabiam” com que a Veja tentou manipular as eleições às vésperas do segundo turno?
Passados seis meses, o que a revista avançou, de fato, sobre aquela declaração bombástica?
Yousseff, o alegado autor da declaração, já apareceu em depoimentos falando muita coisa – mas nada daquilo que a Veja disse que ele disse.
Definitivamente, o mistério de Beatriz Catta Preta não será decifrado pela mídia.
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