O episódio da “interferência” de Lula na gestão da Vale foi exemplar e deixou os privatistas de cabelo em pé. Sem referências à controversa, para dizer o mínimo, privatização da empresa no governo anterior, o presidente usou a condição de sócio que o governo ostenta na mineradora para cobrar dela melhores resultados e maior participação no desenvolvimento do país.
Isso é um direito de qualquer acionista, inclusive os minoritários, e principalmente de quem participa ativamente do controle da empresa, através da Previ, fundo de pensão do Banco do Brasil, e do BNDESpar. Dentro das regras do jogo de mercado, Lula cobrou que a Vale investisse mais em siderurgia, agregando valor ao minério bruto que exporta. E retomou a queixa sobre os critérios que levaram a empresa a comprar navios no exterior e a demitir funcionários assim que a crise se anunciou.
Vamos imaginar que essa cobrança tivesse sido feita pelo Bradesco, um dos acionistas da Vale, com apenas 9%, mas que indicou Roger Agnelli para a presidência da mineradora. No máximo, repercutiria como conflito interno da empresa vindo à tona, mas o direito de o banco dizer tal coisa jamais seria contestado, como foram, por certos setores, as declarações de Lula.
A extração e exportação de minério têm trazido grandes lucros à Vale e a seus acionistas, mas a exportação de produtos mais acabados renderia muito mais. A China exportou 60 milhões de toneladas de aço em 2008, o que revela um mercado bem aquecido. Mesmo com a queda de demanda provocada pela crise, agregar valor a qualquer produto sempre beneficia as exportações.
O governo brasileiro não só é sócio da Vale, mas também financiador da empresa. Ano passado, a Vale recebeu 7,3 bilhões de reais do BNDES, a maior linha de crédito já oferecida pelo banco estatal. O financiamento seria para 18 projetos a serem realizados no país em cinco anos. O governo tem todo o direito de saber onde foram alocados estes créditos. Como consta em seu nome, o BNDES é um banco nacional de desenvolvimento econômico e social. Não faria sentido emprestar dinheiro a uma empresa que compra equipamentos no exterior, quando existem similares nacionais capazes de gerar emprego e renda no país.
É exatamente aí que entra uma outra lógica, difícil de ser absorvida pelos mercadistas. Por ser uma empresa com forte participação estatal, ela deve contribuir para o desenvolvimento do país, não apenas com os empregos diretos que gera e os impostos que paga. Mas com atuação decisiva em projetos desenvolvimentistas que reforcem a indústria nacional.
O governo fez isso com a Petrobras. No governo passado, a lógica da petroleira era exclusivamente o lucro. Encomendava navios e plataformas lá fora, o que elevava suas margens, mesmo que às custas de deixar à míngua uma cadeia de indústrias e fornecedores nacionais. Ao tomar posse, Lula modificou tal política, e com isso contribuiu para o renascimento da indústria naval brasileira, que gera atualmente 40 mil postos de trabalho. E sem que a Petrobras deixasse de retornar dividendos consideráveis aos seus acionistas.
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