O deputado Aldo Rebelo (PC do B-SP) encontrou um nicho a ser explorado, a do
 nacionalismo cego que passa por cima de direitos humanos para alimentar a
 paranóia do risco do inimigo externo. Que pode vir travestido de
 inescrupulosos indígenas aliados dos yankees, que tramam a independência de
 suas terras nas regiões de fronteira, ou de perversos militantes do
 desenvolvimento sustentável, que impedem o Brasil de atingir seu ideal de
 nação previsto por Pero Vaz de Caminha e reafirmado por Celso Furtado.
 
 E, ontem, seguindo a toada, afirmou, em audiência pública realizada em
 Ribeirão Preto para debater o Código Florestal, que membros do Ministério
 Público agem como "braços jurídicos das ONGs" ambientalistas - o que
 certamente provocou orgasmos em ruralistas presentes. Aldo é o relator da
 comissão especial da Câmara dos Deputados que dará parecer ao projeto de lei
 nº 1.876, de 1999, propondo alterações na lei de proteção às florestas.
 Defende mudanças para beneficiar o agronegócio, a economia e o país que vai
 pra frente.
 
 Com isso, os instrumentos para criação de unidades de conservação e a
 manutenção de reservas florestais legais (aquele tanto de mata que deve ser
 mantido em cada fazenda) e de áreas de preservação permanente estão em
 risco. O Congresso também projeta o afrouxamento do licenciamento ambiental
 e o enfraquecimento do Conselho Nacional de Meio Ambiente, o que seria a
 farra de quem quer por tudo abaixo sem se preocupar com processos e
 embargos.
 
 Relembrar é preciso. Quando o Supremo Tribunal Federal decidiu manter a
 demarcação contínua da reserva indígena Raposa Serra do Sol, Aldo Rebelo
 divulgou uma nota repudiando a decisão, dizendo que ela agridia o interesse
 nacional e projetava incertezas quanto à unidade da nação.
 
 É notória a boa relação do ex-presidente da Câmara com os militares. E
 sabe-se que há muita gente nas forças armadas cuja mentalidade não avançou
 desde a Guerra Fria, mantendo-se enclausurados em um bunker de paranóia.
 Como se a experiência da reserva Ianomâmi, bem maior e fronteiriça, não
 tivesse mostrado o contrário. E como se as forças armadas não tivessem livre
 acesso a qualquer parte do território nacional.
 
 Para entender como pensa o deputado, seguem alguns trechos daquela nota: "O
 Supremo abre um precedente para que sejam implantados no Brasil um Estado
 multinacional e uma nação balcanizada, pois confere a tribos indígenas que
 fazem parte do povo brasileiro o esdrúxulo status de minorias apartadas do
 todo nacional, com prerrogativas negadas a outros estratos que há cinco
 séculos amalgamam a formação social do país."
 
 "O respeito aos direitos dos indígenas não pode implicar o esbulho dos não
 índios que há muito tempo fincaram a bandeira do Brasil naquela região". "Os
 índios beneficiados foram isolados da nação. Os índios e não índios
 prejudicados podem recorrer à resistência não violenta na defesa de seus
 direitos históricos. E o Congresso Nacional, última instância da soberania
 popular, tem o dever de reparar este erro calamitoso do Executivo e do
 Judiciário."
 
 Claro! É notório por todos que a espécie dos Homo Arrozeirus já habitavam
 Roraima antes da chegada das tribos!
 
 Garantir mínimos direitos aos povos indígenas, que amargaram séculos de
 genocídio, não os isola do resto da nação. Pelo contrário, decisões como
 essa, por mais que não sejam perfeitas, ajudam a torná-los, de fato,
 brasileiros. O que mais entristece não é exatamente a posição do deputado,
 uma vez que ele tem o direito de falar o que quiser. Mas os argumentos que
 usa, para justificar o corte seco nos direitos desses povos ou para liberar
 a pilhagem ambiental, são de lascar.
 
 Aldo fala de interesses externos de olho no solo e no subsolo da Amazônia,
 culpa as ONGs estrangeiras que atuam aqui por isso. É claro que existem ONGs
 canalhas, mas da mesma forma que empresas e governos. Contudo, ele não fala
 sobre a verdadeira degradação ambiental, social, trabalhista causada por
 multinacionais estrangeiras que têm interesse no tipo de "progresso" pregado
 pelo deputado. A agenda de Aldo o consagra como um dos grandes aliados dos
 ruralistas e seu modelo de desenvolvimento. E não dos movimentos sociais,
 entidades progressistas e dos trabalhadores brasileiros - que seriam
 próximos de seu partido, de acordo com seu próprio partido.
 
 A Amazônia já está internacionalizada, deputado. E não é de agora. Parece
 que o senhor não se lembra o que aconteceu durante o último período
 ditatorial e após a redemocratizaçã o, em que a pilhagem do capital
 internacional correu solta pela Amazônia, Cerrado e Pantanal, passando por
 cima de populações tradicionais, camponeses e trabalhadores rurais.
 
 Não acredito que Aldo Rebelo, caso resolva tentar mais um mandato neste ano,
 perca sua base em São Paulo. O PC do B vota com o partido e, por aqui, ele é
 o partido. Contudo, conheço gente na estrutura partidária que não está feliz
 com esse movimento tático que resultou em noivado com o agronegócio. Hoje, o
 deputado já poderia ser considerado um membro da bancada ruralista - o que
 deve lhe trazer algum dividendo eleitoral com grandes produtores rurais. Mas
 me pergunto qual será o comportamento de quem sempre votou nele, mas se
 sentiu traído, no momento em que chegar a solidão da urna.
De Leonardo Sakamoto 
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