
Legenda: Centro de Detenção Provisória de Pinheiros: Exemplo da superlotação do sistema prisional paulista. Foto de Apu Gomes / Folhapress.
O aparecimento, a expansão e o fortalecimento do PCC não são uma coincidência ou um efeito adverso passageiro, mas sim o resultado mais objetivo da política de encarceramento levada a cabo no estado de São Paulo e, ao mesmo tempo, a condição necessária para sua continuidade.
O tema da segurança pública tem gerado as mais diversas reflexões no campo das ciências humanas e muitas preocupações no cotidiano da população. Também no momento das disputas para cargos eletivos ganha cada vez mais destaque. Nesse sentido, Adorno (2003) traz estudos que apontam o crescimento das taxas de quase todas as modalidades de crimes – patrimoniais e contra a vida – ao longo dos últimos quarenta anos. Esse aumento da criminalidade veio acompanhado de um aumento na circulação da riqueza e da renda. Tais mudanças provocaram não apenas alterações no fenômeno do crime e da violência, mas acabaram por inserir tais elementos como parte do dia a dia dos brasileiros.
Ao lado da expansão das taxas de crimes, a atuação de organizações criminosas, sobretudo daquelas envolvidas com o tráfico de drogas e de armas, tem sido outro elemento muito presente nesse debate. No caso do estado de São Paulo, o Primeiro Comando da Capital (PCC) possui ampla hegemonia no “mundo do crime” e o controle sobre diversos territórios, especialmente bairros pobres da periferia das grandes e médias cidades e o sistema prisional (DIAS, 2013). Em linhas gerais, o PCC é fruto de uma articulação de presos em resposta à atuação historicamente violenta e arbitrária do estado dentro das prisões, que teve seu auge no episódio conhecido como Massacre do Carandiru, em 1992.
O foco deste texto é a política de encarceramento levada a cabo no estado de São Paulo nas últimas duas décadas. O argumento central desenvolvido é de que o aparecimento, a expansão e o fortalecimento do PCC não são uma coincidência ou um efeito adverso passageiro, mas sim o resultado mais objetivo dessa política de encarceramento e, ao mesmo tempo, a condição necessária para sua continuidade.
O crescimento das taxas de crimes violentosA fim de delinear os contornos de um contexto em que as demandas por maior rigor nas penas e na punição ao crime comum emergem, apresentamos um panorama geral do crescimento das taxas de alguns crimes a partir dos anos 1990 no estado de São Paulo.
Conforme pode ser visto no gráfico a seguir, em todo o período considerado há um aumento nas taxas de roubos1 – com ligeiras quedas em alguns anos –, sobretudo os delitos contra o patrimônio, em especial roubo e furto, que configuram o maior número de ocorrências policiais. Vale salientar que esses delitos estão também entre aqueles que mais afetam a sensação de segurança da população das grandes e médias cidades.
Os dados sobre tipos de roubo que requerem maior sofisticação e organização, como de carga e a instituição financeira (DIAS, 2013), começaram a ser disponibilizados de forma desagregada a partir de 2005, pela Secretaria de Segurança Pública, e o que se observa é um crescimento de ocorrências dessa natureza. Naquele ano foram registrados 133 roubos a instituições financeiras, número que subiu para 243 em 2013 – quase o dobro. Já quanto a roubo de carga, as ocorrências passaram de 4.266 para 7.959, no mesmo período. Em ambos os casos, percebe-se um incremento bastante superior ao dos demais crimes analisados, inclusive quanto ao total de roubos exposto no gráfico acima.
O delito de tráfico de drogas expressa de forma mais direta o resultado de alterações legislativas ocorridas recentemente. Conforme fica claro no gráfico a seguir, após a promulgação da nova Lei de Drogas (11.343/2006) as mudanças ocasionaram um aumento da criminalização e do aprisionamento, provocando um impacto enorme nas taxas de encarceramento. Importante ressaltar que essa lei descriminaliza o usuário de drogas, vetando a aplicação da pena de prisão por esse motivo. Ao invés de produzir o efeito de redução do aprisionamento de jovens em decorrência do uso e da dependência de substâncias ilícitas, o que vimos foi um crescimento exponencial das ocorrências de tráfico de drogas, sinalizando para um efeito perverso das mudanças legislativas sobre a discricionariedade e o arbítrio policial no que diz respeito à definição e à classificação do usuário e do traficante2.
No que concerne ao número de ocorrência de homicídios dolosos, observamos no estado de São Paulo um fenômeno que tem provocado uma série de estudos e de análises com vistas a explicá-lo: uma queda vertiginosa na última década, em comparação com a anterior, que apresentou as maiores taxas da história, com o auge alcançado no ano de 1999. A par da tentativa do governo estadual de capitalizar esse recuo, atribuindo-o às políticas de segurança adotadas, não há nenhuma mudança nas ações implementadas nessa área capaz de explicar uma redução de 70% nos homicídios num período de aproximadamente dez anos.
Notas
1 De acordo com as estatísticas criminais disponibilizadas pela Secretaria de Segurança Pública do Estado (SSP) o crime de roubo engloba quase todas as ocorrências, sendo discriminados estatisticamente apenas roubo de veículo e roubo a banco.
2 Nesse sentido, a pesquisa sobre prisão provisória e tráfico de drogas do NEV (2011) revela que na maioria dos casos de flagrante a única “prova” que pesa contra o acusado é o depoimento do policial.
1 De acordo com as estatísticas criminais disponibilizadas pela Secretaria de Segurança Pública do Estado (SSP) o crime de roubo engloba quase todas as ocorrências, sendo discriminados estatisticamente apenas roubo de veículo e roubo a banco.
2 Nesse sentido, a pesquisa sobre prisão provisória e tráfico de drogas do NEV (2011) revela que na maioria dos casos de flagrante a única “prova” que pesa contra o acusado é o depoimento do policial.
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