O último censo agropecuário trouxe verdades incômodas, que atiçaram a
ira do agronegócio brasileiro. Afinal, a pobre agricultura familiar, com
apenas 24,3% (ou 80,25 milhões de hectares) da área agrícola, é
responsável ?por 87% da produção nacional de mandioca, 70% da produção
de feijão, 46% do milho, 38% do café , 34% do arroz, 58% do leite, 59%
do plantel de suínos, 50% das aves, 30% dos bovinos e, ainda, 21% do
trigo. A cultura com menor participação da agricultura familiar foi a
soja (16%). O valor médio da produção anual da agricultura familiar foi
de R$ 13,99 mil?, segundo o IBGE. Quando se fala em agricultura
orgânica, chega a 80%. Além do mais, provou que tem peso econômico,
sendo responsável por 10% do PIB Nacional.
Acontece que a agricultura familiar, além de ter menos terras, tem menos
recurso público como suporte de suas atividades. Recebeu cerca de 13
bilhões de reais em 2008 contra cerca de 100 bilhões do agronegócio.
Portanto, essa pobre, marginal e odiada agricultura tem peso econômico,
social e uma sustentabilidade muito maior que os grandes
empreendimentos. Retire os 100 bilhões de suporte público do agronegócio
e veremos qual é realmente sua sustentabilidade, inclusive econômica.
Retire as unidades familiares produtivas dos frangos e suínos e vamos
ver o que sobra das grandes empresas que se alicerçam em sua produção.
Mas, a agricultura familiar continua perdendo espaço. A concentração da
terra aumentou e diminuiu o espaço dos pequenos. A tendência, como dizem
os cientistas, parece apontar para o desaparecimento dessas atividades
agrícolas.
Porém, saber produzir comida é uma arte. Exige presença contínua,
proximidade com as culturas, cuidado de artesão. O grande negócio não
tem o ?saber fazer? dessa agricultura de pequenos. E, bom que se diga,
não se constrói uma cultura de agricultura de um dia para o outro. A
Venezuela, dominada secularmente por latifúndios, não é auto suficiente
em nenhum produto da cesta básica. Exporta petróleo para comprar comida.
Chávez, ao chegar ao poder, insiste em criar um campesinato. Mas está
difícil, já que a tradição é fundamental para haver uma geração de
agricultores produtores de alimentos.
O Brasil ainda tem cada vez menos agricultores que tem a arte de
plantar e produzir comida. No Norte e Nordeste mais a tradição negra e
indígena. No sul e sudeste mais a tradição européia de italianos,
alemães, polacos, etc. É preciso ainda considerar a presença japonesa na
produção de hortifrutigranjeiro s nos cinturões das grandes cidades.
Preservar esses agricultores é preservar o ?saber fazer? de produtos
alimentares. Se um dia eles desaparecerem, o povo brasileiro na sua
totalidade sofrerá com essa ausência. Para que eles se mantenham no
campo são necessárias políticas que os apóiem ostensivamente, inclusive
com subsídio, como faz a Europa.
Do contrário, se dependermos do agronegócio, vamos comer soja, chupar
cana e beber etanol.
De Roberto Malvezzi
quarta-feira, 3 de março de 2010
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