À medida que se consolida a percepção de que a crise global não foi tão destruidora como parecia e que, afinal, a virada está a caminho, é preciso perguntar quais as consequências de tudo isso para o Brasil. Sortudo ou o que for, o presidente Lula ficou com a razão. Comparada com as projeções feitas pelo Morgan Stanley e seu economista-chefe, Marcelo Carvalho, de que o PIB do Brasil mergulharia 4,5% neste ano, a afirmação de Lula de que isso não passaria de "marolinha" estava bem mais correta. Estado de S. Paulo - Terça-feira, o presidente executivo do Itaú Unibanco, Roberto Setubal, avisava que o PIB brasileiro no segundo semestre avança ao ritmo de 4% ou 5%. Assim, ainda que o resultado líquido do ano fique perto de zero por cento, para 2010 já se pode esperar números próximos dos 4%.
Como esta coluna já fez em outras oportunidades, não dá para fechar os olhos para a atual deterioração das contas públicas. Em apenas nove meses, o déficit do setor público saltou de 1,8% do PIB para 3,2%. E o enorme despejo de recursos na economia, que o governo alardeia como sendo política anticíclica, baseou-se em despesas de má qualidade, na medida em que se concentraram não em investimentos, que trariam retorno, mas em despesas correntes, com o funcionalismo público e aposentadorias, que ficam nisso.
Não é bem assim. Parte desse comentário vem da velha ladainha contra os chamados gastos de custeio. Aumentar gastos com a máquina pública pode significar mais gastos com educação, saúde, controle ambiental etc, ou seja, com as funções típicas de estado. Aumentos do funcionalismo também se devem a busca de um novo patamar para o serviço público tão criticado pela população mais necessitada. Por outro lado, os investimentos do Orçamento Geral da União também estão se expandido nas obras do PAC e parte desse déficit deve entrar na conta das desonerações que o governo fez para aquecer a economia. Boa parte da perda de arrecadação do governo se deve a queda nos impostos dos bens de consumo duráveis. Não há dúvida que as contas experimentaram algum grau de deterioração, mas comparado aos déficts das principais economias do mundo, o Brasil está muito bem.
Mas não se pode negar a qualidade do resto. Fato inédito, a economia brasileira sai dessa crise com reservas internacionais superiores às que tinha no seu início. Os juros básicos (Selic) estão em seu nível mais baixo desde 1999. A inflação ficou enquadrada na meta (e em queda). O desemprego está mais baixo do que nos países ricos. E o crédito segue em expansão e já permite o esticamento dos financiamentos habitacionais para além de 20 anos. São condições que, por si sós, constituem credenciais de grande validade para novas decolagens.
Como assim desde 1999? A taxa Selic atual é a menor da série histórica. Podem conferir no site do Banco Central.
A crise e as circunstâncias trouxeram outros benefícios de longo prazo. Acabou, por exemplo, o risco de apagão no sistema de energia elétrica, um pouco porque a derrubada da atividade industrial reduziu o consumo e outro pouco porque o extraordinário período de chuvas encheu os reservatórios e ficou afastada a ameaça de insuficiência de energia elétrica por pelo menos mais três anos.
É provável que o crescimento do PIB deste ano seja alguma coisa acima de zero por cento, como novas projeções estão indicando. Mas, mesmo que seja zero, será o quinto ou o sexto melhor desempenho do planeta, atrás apenas da China, Índia, Indonésia, África do Sul e, talvez, Colômbia.
Assim como o governo americano terá de enfrentar a estratégia de saída da crise, o governo brasileiro terá de normalizar o regime tributário dos setores que foram beneficiados com isenção de IPI. A queda das vendas da indústria automobilística em julho, de 4,9% em relação a junho, parece comprovar que os benefícios se limitaram a antecipar as compras; não criaram mercado novo. E, se foi assim, a indústria voltará a ter dificuldades nos próximos meses. Em todo o caso, se o governo Lula não fizer nenhuma grande besteira, a economia brasileira tem tudo para mostrar bom resultado no ano que vem.
Nós tivemos em março e em junho um forte aumento nas vendas de automóveis, em função do temor do fim da desoneração do IPI. Ocorre que enquanto em abril as vendas caíram 17% na comparação mensal, em julho caíra apenas 4,9%, uma queda bem menor. Isso mostra que já há sim um novo mercado, só não podemos comparar com os números de 2008. A volta do IPI no último trimestre de 2009, como anunciado, encontrará o país já em outro patamar de produção e confiança, o crédito já estará totalmente regularizado e com uma taxa Selic historicamente baixa, pelo menos cinco pontos percentuais mais baixo que no Natal do ano passado. Além disso, a base de comparação será muito baixa, pois as vendas despencaram nos últimos dois meses de 2008.
Devemos sempre ter em mente que se a alta base de comparação dos três primeiros trimestres de 2008 ajuda a baixar as estatísticas de 2009, no último trimestre o jogo se inverte. Se o Natal de 2009 foi mesmo o que muitos já estão prevendo, certamente, do ponto de vista estatístico, será um fenômeno.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Seu comentário será avaliado pelo moderador, para que se possa ser divulgada. Palavras torpes, agressão moral e verbal, entre outras atitudes não serão aceitas.